Os mistérios da natalidade
Saiu o estudo sobre os problemas da natalidade em Portugal, encomendado pelo PSD ao PSD (Instituto Sá Carneiro). O «mistério» sobre as causas do enorme problema demográfico que Portugal atravessa está parcialmente resolvido – os portugueses em idade fértil desejam, em média, ter 2,32 filhos (e têm apenas 1,21 filhos) e consideram – em relatório do INE citado neste estudo – que a maior medida de incentivo à natalidade seria aumentar os rendimentos das famílias com filhos. Esta conclusão deve ter sido totalmente surpreendente e inesperada para o Governo. Partindo da premissa de que o Governo PSD/CDS está verdadeiramente preocupado com a situação das famílias e a diminuição da natalidade em Portugal, a lógica levar-nos-ia a inferir que irão alterar as suas políticas. Sim, aquelas políticas que em três anos destruíram 536,4 mil empregos, que aumentarem o número de trabalhadores a receber o Salário Mínimo Nacional; que em apenas um mês (Dezembro de 2013 para Janeiro de 2014) retiraram o direito ao abono de família a mais de 50 mil crianças. O que é ilógico é que, dependendo do Governo, estas políticas são para continuar.
Vejamos os dados citados no referido estudo. Há quatro anos nasciam em Portugal cerca de 100 mil crianças por ano. Hoje nascem menos de 80 mil. Estima-se que em 2060, se a situação não se alterar, Portugal terá uma população de sete ou oito milhões. Para esta situação muito contribuiu a massiva vaga de emigração de jovens e adultos, a mesma emigração que em tempos foi aconselhada aos jovens portugueses pelo nosso Governo, agora tão diligentemente preocupado. Mas para problemas também existem soluções. O grupo de trabalho que elaborou este documento não defende, por exemplo, o aumento dos salários em Portugal. Mas brinda-nos com outras propostas. Sugere que as mães, após a licença de maternidade terminar, trabalhem em part-time, recebendo o salário por inteiro, sendo substituídas por alguém que esteja a receber o subsídio de desemprego. O substituto deixará de receber o subsídio de desemprego e desconhece-se que condições de trabalho terá que aceitar. Por outro lado, defende a isenção da Taxa Social Única (TSU) para empresas que contratem grávidas e trabalhadores com filhos até aos três anos. Resumindo: em vez de defender os direitos de parentalidade e punir as empresas que discriminam mães e pais trabalhadores, beneficia as empresas que apenas cumprem a lei (aproveitando para aumentar os seus lucros e desvalorizar a Segurança Social Pública).
Digno de uma sonante «eureka» é a conclusão a que os senhores do Instituto Sá Carneiro chegam – os países com melhores taxas de natalidade são aqueles em que mais se investe no apoio à função social da maternidade e da paternidade (como a Suécia ou a Noruega). Talvez seja por isso que a Comissão Europeia anunciou a retirada de processo legislativo do projecto de directiva da licença de maternidade, aprovado em 2010 pelo PE e ao qual o Conselho Europeu nunca deu seguimento. A resolução do PE previa, entre outros, a garantia de 20 semanas de licença de maternidade e duas semanas de paternidade integralmente pagas, e a protecção das recentes mães trabalhadoras no regresso ao trabalho. O nosso Governo, que se diz tão patriótico e preocupado com a natalidade, podia colocar na agenda do Conselho Europeu este tema – a elevação dos direitos de maternidade. Mas não o fará porque, como sabemos, faz sempre o contrário daquilo que afirma.