Volta cegonha!
No recato das Jornadas Parlamentares do PSD, o presidente do Grupo Parlamentar veio defender um pacto em defesa da natalidade.
Em pequeno, nas férias na terra da minha avó, um dia perguntei-lhe, «oh avó, de onde é que vêm os bebés?» Ela, sem se desconcertar, ajeitou o lenço preto que marcava o luto permanente pelas agruras da vida e disse-me, «vêm das cegonhas que os trazem de Paris. Por isso é que têm as asas grandes e os bicos compridos».
Talvez animado pela notícia que, na passada semana, informava que em Portugal há três mil ninhos de cegonhas, só em postes eléctricos, Luís Montenegro (assim se chama a criatura) deu seguimento a uma converseta iniciada uns dias antes pelo primeiro-ministro que afiançava que agora é que iam nascer meninos e meninas com fartura, pois o Governo estava já primorosamente a tratar disso.
Acontece que a um e outro terão escapado dois pormenores que fazem toda a diferença.
O primeiro, o de que as cegonhas, talvez porque encontrem comida abundante nos terrenos de pousio, talvez porque se tenham habituado ao clima, deixaram de fazer a viagem de ida e volta, não tendo a oportunidade de continuar a fazer tal transporte.
O segundo, e não o menos importante, é o de que, como a última estatística do INE bem demonstra, não há política sustentável de natalidade quando, apesar de diminuir o número de crianças, escandalosamente são cada vez mais as que se encontram no limiar da pobreza, o que já atinge uma em cada quatro, e quando, expressão do objectivo que definiram para a política de agressão conduzida ao longo de anos, há já mais de dois milhões de portugueses a viver nessa situação, o nível mais elevado desde 2005, sendo esse risco mais elevado nas famílias com filhos.
Dizia a minha avó, já não para me responder, mas a remoer a sua visão do problema, que «vêm de Paris, pois são a melhor coisa do mundo, para depois a gente não ter um pedacinho de conduto para lhes dar».
Passos, Portas e Montenegro, apostados em ver de novo pelas ruas do País fedelhos de barriga ao sol, ranhosos e descalços, bem podem pedir às cegonhas que voltem, não para trazer mais bebés, que isso é coisa em que já ninguém acredita, mas para lhes dar boleia no momento da sua derrota que, mais cedo ou mais tarde, o povo português há-de conseguir.