Da bolha ao referendo
A «bolha» de investigadores referenciada esta semana pela secretária de Estado da Ciência Leonor Parreira e o referendo da co-adopção tirado a semana passada da cartola do deputado do PSD Hugo Soares, que é também líder da JSD e vice-presidente da bancada social-democrata, são um exemplo elucidativo – mais um – dos princípios antidemocráticos por que se pauta o Governo.
No primeiro caso, temos uma secretária de Estado a socorrer-se do facto de Portugal estar em «quarto lugar, na Europa a 28, em número de investigadores por permilagem da população activa [à frente da França e Alemanha] (…) e em 18.º lugar no indicador de excelência em Ciência e Tecnologia» – o que em qualquer do mundo seria considerado altamente positivo – para declarar com despudor que há «excesso de investigadores para o financiamento que o País atribuiu à Ciência nos últimos anos», pelo que a «solução» é esvaziar a «bolha», como lhe chamou, de investigadores remetendo de novo o País para a cauda do subdesenvolvimento nesta área, ao invés de aumentar o financiamento num sector em que os resultados têm sido de excelência. Seria estranho, sem dúvida, se entretanto a senhora, secundando o ministro Crato, não tivesse feito saber que o objectivo do Governo é «ser mais selectivo» para que só os «melhores sejam premiados». É a lógica do funil de quem prega a democracia e pratica a discriminação.
No segundo caso, temos a versão jota do PSD do mesmo quadro de valores que assiste à jota do CDS quanto à escolaridade obrigatória e o «direito» à ignorância. Deixando de lado as implicações processuais – e não são poucas – deste golpe parlamentar, temos o principal partido do Governo a pretender referendar o direito das crianças a serem protegidas. É para o PSD os filhos dos homossexuais não são exactamente iguais aos filhos dos casais heterossexuais, pelo que os seus direitos são vistos como «uma questão de consciência» da sociedade. A barbaridade da posição vai ao ponto de Hugo Soares – o testa de ferro do PSD nesta matéria – afirmar que se a sociedade estiver preparada para não discriminar essas crianças até ele é capaz de estar a favor. Caso contrário, discrimine-se! Está tudo dito.