Um recuo de 20 anos
O governo espanhol aprovou, dia 20, um anteprojecto que pretende proibir a interrupção voluntária da gravidez e revogar os direitos reconhecidos à mulher pela legislação de 2010.
Lei retrógrada promove o aborto clandestino
O projecto já denominado de «lei Gallardón», em referência ao nome do seu mentor, o titular da Justiça, Alberto Ruiz-Gallardón, prevê a interrupção voluntária da gravidez unicamente em dois casos: quando a mulher tenha sido violada e quando esteja em risco a sua saúde física ou psicológica.
As situações de malformação do feto ficam incluídas nas anomalias incompatíveis com a vida e apenas se «essa pressão insuportável» não for tolerável psiquicamente pela mãe. Esta situação deverá ser confirmada por um especialista que diagnostique a malformação e por outro que avalie psicologicamente os danos que poderão ser causados à mulher grávida.
O diploma, apresentado com o pomposo nome de Lei Orgânica para a protecção da vida do feto e dos direitos da mulher grávida, não só revoga a legislação de 2010 como é mais restritiva do que a lei de 1985.
Se até aqui a mulher tinha o direito de abortar nas primeiras 14 semanas, agora, em caso de violação, só dispõe de 12 semanas para o fazer e apenas se antes tiver apresentado queixa da agressão.
O prazo é alargado para as 22 semanas nas situações de anomalia fetal, mas se esta for descoberta posteriormente a mulher terá de se sujeitar a parto induzido.
Hoje, a lei permite a interrupção da gravidez em casos de malformação, mesmo que o feto pudesse sobreviver. Porém, o autor da lei considera que «nenhuma anomalia é em si mesma desmerecedora dos direitos de protecção», salientando que «não há embriões de primeira e de segunda».
Gallardón também se congratulou por o seu projecto não penalizar a mulher que aborte. Em caso de transgressão, a lei prevê sanções apenas para os profissionais envolvidos.
Num comunicado, a União dos Jovens Comunistas de Espanha (UJCE) salienta ainda que esta contra-reforma visa proibir as menores de idade, com 16 ou 17 anos, de interromper a gravidez sem autorização dos pais.
Considerando este projecto retrógrado como um atentado aos direitos da mulher, os jovens comunistas notam que a complexidade e morosidade dos futuros procedimentos visam claramente afastar as mulheres dos hospitais públicos e levá-las a procurar clínicas privadas.
As novas regras, afirma a UJCE, irão obrigar muitas mulheres, nomeadamente imigrantes em situação administrativa irregular, a recorrer à prática do aborto em estabelecimentos privados, em muitos casos de forma clandestina, pondo em risco a sua saúde física e psicológica.