Duetos e trios
Comentando o acórdão do TC que chumbou, por unanimidade, o corte de 10% das pensões da CGA, o chanceler Coelho achou que a decisão «revela que não é inconstitucional reduzir o valor das pensões em pagamento, embora num contexto de reforma mais geral», pelo que se propõe insistir no caso.
Ignora, deliberadamente, que o acórdão do TC também diz que uma reforma de convergência de pensões tem de incluir todas, as do público e as do privado e deve ser gradual.
A resposta de Passos Coelho nem se detém na argumentação central do acórdão, a do «princípio da confiança» no Estado violado grosseiramente por este novo corte (princípio constitucional básico, em todo o Mundo), procurando, de imediato, uma «fresta» no acórdão que lhe permita a revanche de nova investida.
Aliás, Coelho é isto – um voluntarista inculto e reaccionário, que se propôs destruir de alto a baixo o regime democrático e as suas conquistas sociais construídas com a Revolução de Abril (fazer um «novo paradigma», como anunciou à chegada), rodeando-se de pessoal à sua medida: gente de cursos enjorcados à Relvas ou saindo deles engordados no neoliberalismo tacanho. Daí que esta trupe não tenha o mínimo respeito pela Constituição da República e pelo decorrente regime democrático, que nela se instituiu e com ela se consagrou.
Como no filme «O ovo da serpente», de Bergman, esta gente ascendeu ao poder democrático para o destruir por dentro e, qual serpente da alegoria, não tem escrúpulos nem consciência de qualquer espécie, a sua ideologia é clara: querem restabelecer o domínio dos «fortes» sobre toda a sociedade, impor a esta última o acatamento humilde e ancestral desta divisão dos homens e tornar em novo império a «lei natural» do mais forte.
À outrance, é disto que trata este Governo.
O PS – como bem assinalou o insuspeito Pacheco Pereira no Público –, ao assinar com o Governo a descida do IRC fez «um acordo político de fundo que amarra o PS a sistemáticas pressões governamentais e outras, para que passe a ser parte do “consenso” que legitime a actual política». Assim sendo, «o PS de Seguro mostrou que não é confiável como partido da oposição» e mostra que «Seguro e os seus criaditos diligentes estão ali para servirem refeições aos que mandam, convencidos que as librés que vestem são fardas de gala»...
A esta nova «troika» de Governo e PS/Seguro falta a «perna» do Presidente da República. Após ignorar os nove «chumbos» de três OE, após de nem por uma vez abrir a boca contra a inacreditável campanha do Governo e da troika contra o Tribunal Constitucional português, que fará agora Cavaco Silva, tendo em mãos um chumbo do TC, por unanimidade e decorrente demissão de três secretários de Estado, incluindo o Rosalino menestrel do diploma chumbado?
Limitar-se-á a repetir o espectáculo – que lembrava o dueto dos «seniores» dos Marretas – dado pela sua mulher e ele próprio a transmitir a mensagem de Natal deste ano?