Um Estado nascido na luta

Carlos Lopes Pereira

Os patriotas da Guiné-Bissau vão comemorar o 40.º aniversário do nascimento da sua República com orgulho e empenhados em libertar-se da ditadura militar e retomar os caminhos do progresso.

Há quatro décadas, o surgimento do novo estado ocorreu em plena luta armada de libertação nacional conduzida pelo Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) contra o colonialismo português.

Para a ditadura salazarista-marcelista, em especial para o seu representante na Guiné, general António Spínola, tratou-se de uma colossal derrota política e militar que contribuiu decisivamente para o eclodir, meses depois, do 25 de Abril, a que se seguiu a revolução, o derrubamento do fascismo e a derrocada do sistema colonial português.

A 24 de Setembro de 1973, às 8 horas e 55 minutos (TMG), reunida nas áreas libertadas do Boé, no Leste, a primeira Assembleia Nacional Popular guineense proclamou o nascimento do Estado da Guiné-Bissau – com uma parte do território ainda ocupada por forças estrangeiras – e elegeu Luís Cabral como presidente.

A jovem República foi imediatamente reconhecida pelos países africanos, pela União Soviética e outros estados socialistas, pelos Não-Alinhados, agravando o isolamento diplomático do Portugal fascista.

Os colonialistas procuraram a todo o custo evitar a emergência do novo país africano, resultado do avanço das lutas emancipadoras dos povos da Guiné e Cabo Verde, de Angola e de Moçambique.

Já em finais de 1970 tinham invadido militarmente e agredido a República da Guiné (Conakry) com o objectivo de liquidar a direcção do PAIGC e derrubar o regime do presidente Sekou Touré, que apoiava os combatentes da liberdade. Essa operação, «Mar Verde», foi organizada por Spínola, chefiada por um dos seus oficiais de confiança, Alpoim Calvão, e autorizada por Marcelo Caetano.

Mais tarde, a 20 de Janeiro de 1973, agentes dos colonialistas portugueses assassinaram Amílcar Cabral, o líder da luta emancipadora na Guiné e em Cabo Verde, e tentaram dividir e destruir o PAIGC.

Em vão. Como o próprio Cabral previra dias antes da sua morte, numa mensagem aos combatentes: «(...) Nenhum crime, nenhuma força, nenhuma manobra ou demagogia dos criminosos agressores colonialistas portugueses será capaz de parar a marcha da História, a marcha irreversível do nosso povo africano da Guiné e Cabo Verde para a independência, a paz e o progresso verdadeiro a que tem direito».

Os nacionalistas intensificaram a luta armada, introduziram novas armas – incluindo o míssil terra-ar soviético «Strella», que pôs fim à impunidade da aviação colonialista –, infligiram pesadas derrotas militares às tropas portuguesas, retomaram os planos para o lançamento de acções armadas em Cabo Verde.

Spínola, derrotado política e militarmente, abandonou o cargo de governador da Guiné e retirou-se para a metrópole com os seus projectos neocoloniais.

Rumo à vitória

Sabe-se, hoje, que nos primeiros meses de 1974, o governo fascista ainda promoveu o envio de emissários a Inglaterra para conversar com representantes do PAIGC. Ao mesmo tempo que pedia aos seus aliados da OTAN e à África do Sul racista o fornecimento de novas e poderosas armas para tentar salvar o exército colonial da derrota anunciada...

Mas já era tarde para travar a roda da História. Pouco tempo depois, a longa e heróica resistência antifascista portuguesa e o descontentamento provocado pelas guerras coloniais conduzem ao golpe militar de Abril, seguido pela Revolução dos Cravos.

Os novos governantes portugueses estabeleceram negociações com o PAIGC – primeiro em Londres, depois em Argel – e, a 10 de Setembro de 1974, a antiga potência colonial reconheceu «de jure» a independência da República da Guiné-Bissau, nascida menos de um ano antes em plena luta armada.

Quarenta anos volvidos, os guineenses atravessam tempos também difíceis. Passada a euforia da conquista da independência e, depois, da paz, o seu país vive hoje sob uma ditadura de generais narcotraficantes, a economia regride, a corrupção alastra, as divisões inter-étnicas são acirradas, a soberania nacional enfraquece. Inserida numa sub-região de forte influência neocolonial francesa, a Guiné-Bissau independente está em perigo.

Mas os patriotas guineenses, inspirados na vitoriosa e exemplar luta armada de libertação nacional liderada por Amílcar Cabral e seus companheiros, saberão construir de novo a liberdade. E retomar nas mãos os caminhos da sua História, da independência, de um futuro de desenvolvimento e progresso social.




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