O rei vai nu

Henrique Custódio

As cerimónias do 10 de Junho, ocorridas esta semana em Elvas, mostraram duas coisas: o Presidente Cavaco Silva a explicar ao País como entende a função presidencial (o que é estranho, para quem já vai a meio do segundo mandato) e o primeiro-ministro Passos Coelho a ser vibrantemente apupado pela multidão presente (aliás, aplausos só os militares em desfile os tiveram).

Os últimos dias têm mostrado a desorientação em que Passos Coelho anda, seja na sua comitiva de cinco carros de alta gama a correr à desfilada em contramão nas ruas de Chaves, para fugir a uma manifestação de protesto de taxistas, seja a propor aos sindicatos dos professores uma inacreditável «agregação» da sua greve do próximo dia 17 à greve geral de 27 de Junho, seja a dar entrevistas ao Expresso onde mais lhe valia estar calado.

A desfilada em contramão pelas ruas de Chaves com o chanceler a fugir duma manifestação que o contestava, além de o expor num desrespeito grosseiro das leis de trânsito e a utilizar a GNR e os recursos do Estado para uma fuga, é sobretudo paradigmático do que se tornou este Governo: um rancho que há largos meses não consegue aparecer em público, fugindo escorraçado por surriadas de protestos.

Agora até o primeiro-ministro foge em contramão sob protecção da GNR, o que anda mais próximo de Al Capone pelas ruas de Chicago nos anos 20, do que de um governante português, «europeísta» e em regime democrático.

Quanto à «proposta» de Passos Coelho aos sindicatos dos professores para que transfiram a sua greve de 17 para 27 de Junho, dia de greve geral – para «não prejudicar os alunos», dizia ele –, evidencia três coisas: uma, que Passos Coelho está preocupado que a greve dos professores aos exames no dia 17 prejudique os alunos, mas já não se preocupa que os alunos sejam «prejudicados» 10 dias depois, noutros exames também marcados para o dia que sugere; outra, que neste paleio Passos Coelho só quis fingir-se preocupado «com os alunos», enquanto prossegue a destruição sistemática da Escola democrática – geral e para todos – saída da Revolução de Abril; finalmente, o seu respeito «ao direito à greve» – por si repetidamente enfatizado – é tão genuíno, que procura chantagear toda uma classe profissional (140 mil professores), para que só faça greve quando o patronato quiser – patronato aqui figurado no seu Governo, está bem de ver.

Finalmente, na entrevista ao Expresso anunciou inopinadamente que pretendia recandidatar-se à presidência do PSD no próximo ano, desmentindo o pai (que, há uns tempos, declarou em entrevista que o filho «estava farto de ser primeiro-ministro» e cheio de vontade de se ir embora) e, quiçá, procurando neutralizar a oposição interna que também lhe cresce a olhos vistos.

Como se vê, não há «poses de Estado» que valham a esta gente, pois o País já, largamente, descortinou que «o rei vai nu»...



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