Sem remo nem rumo
A «caça ao palhaço», aberta pelo PR com a averiguação criminal duma frase onde Sousa Tavares lhe aplicava esse epíteto, alastrou pelo País como incêndio em savana. Agora é corriqueiro chamar palhaço aos altos dirigentes do Estado, com relevo para os do Governo, como se viu nas manifestações ocorridas no passado sábado em 17 cidades portuguesas, em sintonia com as organizadas em 100 cidades europeias sob a palavra de ordem «Povos Unidos Contra a Troika».
Aliás, a questão do «palhaço» desencadeou uma inundação comunicacional, da blogosfera aos comentadores, casquinando da presidencial susceptilidade e confluindo em três deduções: 1 – que Cavaco Silva confirmou o seu conhecido egocentrismo; 2 – que fez desabar sobre o alto cargo que desempenha um descrédito muito mais devastador do que o presumido insulto que lhe inspirou a queixa à PGR; 3 – que se expôs ao ridículo nacional e internacional ao invocar uma lei advogando a sacralização da figura do chefe de Estado.
Mas este desconchavo à volta do termo «palhaço» teve a vantagem de confirmar que a governança em curso é uma palhaçada sem remo nem rumo.
Os exemplos são diários e já afunilados em «casos» onde o Governo se auto-encurrala.
Um deles é o da «TSU para reformados», que começou pelo anúncio assassino de uma «aplicação imediata e com efeitos retroactivos» para, lentamente, vir escorregando pelo lombo das contestações que, nas ruas, vão oleando a saída do Governo.
Daí que em apenas dois meses (desde inícios de Abril até agora, inícios de Junho), Passos Coelho tenha resvalado da TSU «já e com retroactivos» para «TSU dos reformados só em último recurso», enquanto Portas, sobre o mesmo assunto, foi traçando «linhas vermelhas» que jurava «não ultrapassar», apenas não especificando quantas vezes iria violar «o juramento».
Quanto ao resto do Governo resume-se ao Ministério da Saúde, que continua pondo em andamento «poupanças» que já vão na reutilização de materiais esterilizados e (até aqui) de utilização única, ao Ministério da Educação, que prossegue o objectivo de despedir professores em massa e ao Ministério das Finanças, que supervisiona a catástrofe com cortes orçamentais sucessivos e intermináveis, inventando delirantes «ajustamentos», «rectificações», «flexibilizações», «racionalizações», «optimizações» e todos os «ões» que os carreguem.
Quanto ao País e aos portugueses, já todos perceberam que se desliza em plano inclinado para o desastre, com notícias diárias a comprová-lo: num dia é o escândalo das swaps, noutro a expulsão em massa de gestores públicos que se envolveram no escândalo, no seguinte vêm as subidas no desemprego ou no défice e por aí fora.
Repita-se: o Governo de Passos Coelho tornou-se numa palhaçada, sem remo que o mova nem rumo que o guie.