Golpe de Estado
Nas eleições de 2011 o PSD obteve 38,65% dos votos e necessitou dos 11% do CDS para subir ao poder, coisa que lambuzou de alegria ambos os partidos, com relevo para os dois protagonistas: Passos Coelho, o que ansiava tanto «meter a mão no pote» que se denunciou ao esclarecer antecipadamente que «não tinha pressa» em fazê-lo, e Paulo Portas, o que na sua anterior e breve passagem pela pasta da Defesa deixou um rasto fosforescente de negócios escuros (a antítese até lhe desagua no estilo florido) na compra de submarinos e de carros «Pandur», e ainda uma invenção náutica de envergadura – a vigilância marítima «por avistamento».
Todavia, o «meter a mão no pote» de Passos Coelho (semelhante ao de todos os governos PS e PSD que o antecederam) não se limitou ao costumeiro banquete de amigos e correligionários à mesa do Orçamento, como soe dizer-se. O homem tinha uma ambição e disse-a – «mudar o paradigma do País».
E a «mudança de paradigma» de Passos avança o mais depressa que a continuação no poder lhe consente. Em apenas 2012 – segundo o Eurostat – os desempregados aumentaram 217 mil (para o total de mais de um milhão e meio), e nestes quase dois anos de Governo encerraram ou faliram muitos milhares de empresas de micro, média e também de maior dimensão e a capacidade produtiva do País vai arrefecendo devagar e inexoravelmente, a caminho duma inanidade de custosíssimo regresso. Aliás, neste momento os únicos sectores pujantes em resultados e lucros são o financeiro e bancário, os monopólios instalados como o das grandes superfícies comerciais, as empresas estratégicas de lucro garantido e, entretanto, entregues (ou a caminho disso) à gula capitalista (electricidade, comunicações, transportes, águas) e etc., tudo alimentando um universo parasitário de accionistas e investidores especulativos, rolando na Bolsa ou à volta dela lucros obscenos que correspondem (como sempre...) à devastação socioeconómica entretanto catalizada pelo «paradigma» de Passos.
Paradigma que tem um percurso paralelo na destruição do Estado social trazido pela Revolução de Abril e garantido constitucionalmente (Ensino universal e gratuito, Serviço Nacional de Saúde tendencialmente gratuito, Segurança Social para garantir pensões e a subvenção de situações de fragilidade social, como o desemprego e a velhice). Tudo isto está a ser cirurgicamente desmantelado, agora já abertamente, quase todos os dias, e falácias cada vez mais raras a fingir que estão apenas a «cortar nas gorduras».
Ora o PSD conquistou uma maioria bastante relativa e coxa (por isso precisou do penduricalho CDS para chegar ao governo), com um programa onde garantia
não aumentar impostos, «proteger os mais fracos», e etc., etc., não estando de modo nenhum mandatado para esta destruição sócio-económica, respaldado nos seus amigos da troika.
E esta destruição contínua – se ainda não deram por isso – é um autêntico golpe de Estado, a decorrer à vista de todos.