Leis de finanças das autarquias e regiões autónomas

Asfixia e ingerência

O esmagar da autonomia financeira das autarquias locais e das regiões autónomas, com imposição do «centralismo como política de Estado», assim é encarado pelo PCP o conteúdo dos diplomas do Governo sobre finanças locais e finanças regionais.

Governo despreza necessidades das populações

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As duas propostas de lei foram aprovadas sexta-feira passada, na generalidade, com os votos favoráveis da maioria PSD/CDS-PP, depois de na antevéspera terem sido sujeitas a debate onde mereceram a mais firme e frontal oposição da bancada comunista, compartilhada por PEV e BE, enquanto o PS, pela voz dos deputados Ricardo Rodrigues e Mota Andrade, manifestou a vontade de trabalhar conjuntamente com o Governo na especialidade para «encontrar as melhores soluções», tudo, claro está, em nome do «sentido de responsabilidade».

Disponibilidade e empenho para intervir no debate na especialidade expressou também em nome do PCP o deputado António Filipe mas para alterar os «aspectos mais negativos» dos diplomas.

E a verdade é que são vários e de especial gravidade esses pontos negros que neles estão presentes e que cavam ainda mais fundo o antagonismo entre, de um lado, o Governo e a troika, e, do outro lado, as regiões, as autarquias, as populações. Dito de outro modo, pegando nas palavras de António Filipe, «de um lado está a recessão forçada e o objectivo de redução do défice custe o que custar, do outro lado estão os objectivos de desenvolvimento equilibrado do País e as preocupações com o bem-estar social». Este é que é o ponto, por mais artifícios que o Governo use para mascarar os seus objectivos, como fez no debate o ministro Miguel Relvas ao chegar a afirmar, referindo-se ao regime proposto para as autarquias locais, que «a lei é um perfeito instrumento para o autarca que quer gerir com eficiência, seriedade e qualidade o seu município».

Reduzir serviços

Perspectiva oposta sustentou no debate o PCP, com António Filipe a sublinhar que a proposta governamental visa o duplo objectivo de «impor a asfixia financeira e de institucionalizar uma ilegítima ingerência na autonomia local por via de uma efectiva tutela de mérito e integrativa». Nesse sentido vão as medidas relativas à arquitectura financeira (o imobiliário como principal fonte de receita, embora o Governo diga cinicamente pretender acabar com a «dependência» do sector) e, noutro plano, «o prolongar no plano local do saque fiscal (e tarifário)», a par da «redução da prestação de serviços e funções públicas». A isto soma-se a brutalidade do corte de um quarto (1/4) do montante de transferências – mais de 500 milhões de euros –, fixando-o num valor inferior ao de 2007.

Verberada foi também a criação do Fundo de Apoio de resgate dos municípios em insolvência, suportado com o acréscimo da cobrança do IMI resultante da reavaliação predial. Para António Filipe, «o Governo não só atira os municípios para a falência como põe os que ainda não estão falidos a pagar o seu resgate».

 

Em prejuízo das pessoas

A nova lei de finanças locais, a manter-se inalterada, vai mexer profundamente com a vida das pessoas. Repercutir-se-á desde logo no agravamento do saque fiscal dos tarifários, alertou o deputado comunista Paulo Sá. Os seus efeitos não deixarão ainda de ser sentidos na redução drástica da capacidade de prestação do serviço público por parte das autarquias locais, bem como no «abandono de vastos territórios, condenando-os ao atraso e subdesenvolvimento».

Sublinhou ainda que a proposta do Governo não aparece isolada, inserindo-se, pelo contrário, na política da troika que visa reduzir o papel do Estado e as suas funções sociais, alienar serviços públicos (entregando-os aos grandes interesses privados), onerar as populações e espoliá-las dos seus direitos e rendimentos.

Desmentindo o ministro Miguel Relvas, que justificou a lei com a necessidade de «consolidar as contas públicas», Paulo Sá afirmou ser essa «uma completa falsidade». Explicando porquê, lembrou que a percentagem da dívida dos municípios na dívida pública é de seis por cento e que o peso da administração local no défice orçamental é residual. Concluiu por isso que as autarquias locais «não são responsáveis pela situação financeira em que se encontra o País» e que o Governo embora saiba isso aposta deliberadamente em «intoxicar a opinião pública» para melhor abrir caminho a um novo ataque contra as autarquias.


Plágios e incoerências

«Um novo e mais acentuado passo na redução do volume de transferências para as regiões autónomas, nos mecanismos de ingerência e na limitação da autonomia regional», assim resumiu António Filipe o diploma agora aprovado na generalidade sobre as finanças regionais.

Para o deputado Honório Novo, o que o Governo apresentou é um «verdadeiro plágio» em termos financeiros da lei de 2007 do governo de José Sócrates e Teixeira dos Santos, na altura contra a vontade do PCP, PEV, BE, PSD e CDS-PP. A diferença, assinalou, está apenas nuns «pozinhos» que o ministro Miguel Relvas entretanto acrescentou em função do novo Tratado Orçamental e da aprovação do memorando da troika.

Este é pois um processo legislativo em que se assistiu ao PSD e ao CDS-PP a propor uma lei igual à que antes haviam criticado e o PS a criticar o regresso a uma lei que em 2007 propôs e fez aprovar. Exemplos de «coerência», está bem de ver. E que talvez explique a razão pela qual nenhum deputado dos partidos da maioria PSD/CDS-PP eleito pelas regiões autónomas tenha usado da palavra, silêncio ainda mais estranho conhecidos que eram os rumores de que poderiam votar contra a lei das finanças regionais.

 

 



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