Liberdade... mas pouca

Anabela Fino

«Não ha­verá re­gistos de imagem e som senão nesta sessão de aber­tura e na de en­cer­ra­mento. A per­ma­nência de jor­na­listas na sala pode manter-se mas não ha­verá ci­ta­ções de nada que aqui seja dito sem ex­pressa au­to­ri­zação dos ci­tados». As pa­la­vras são de Sofia Galvão, ex-di­ri­gente do PSD e res­pon­sável pela or­ga­ni­zação da con­fe­rência «Pensar o fu­turo: um Es­tado para a so­ci­e­dade», pro­mo­vida por Passos Co­elho, que teve lugar ontem e an­te­ontem no Pa­lácio Foz, em Lisboa.

A ini­ci­a­tiva, em que par­ti­ci­param per­so­na­li­dades ale­ga­da­mente re­pre­sen­ta­tivas da «so­ci­e­dade civil», marca sem dú­vida um novo es­tádio na forma de co­mu­ni­cação do Go­verno. Para «pensar como deve ser o fu­turo dos nossos fi­lhos» e para es­ti­mular o «con­fronto de ideias» – no dizer do se­cre­tário de Es­tado Carlos Mo­edas – o Exe­cu­tivo não en­con­trou me­lhor ca­minho do que o de cer­cear a li­ber­dade de im­prensa. Os jor­na­listas até po­diam as­sistir, que é como quem diz ver e ouvir, mas nada de tornar pú­blico o que viam e ou­viam, ou seja de cum­prir a sua função de sub­meter ao es­cru­tínio dos ci­da­dãos o que num acto pú­blico os seus ale­gados re­pre­sen­tantes achassem por bem dis­cutir, sem au­to­ri­zação ex­pressa dos in­ter­ve­ni­entes. A mai­oria dos jor­na­listas pre­sentes no evento – de­sig­na­da­mente a Agência Lusa, a An­tena 1 e a TSF, e o jornal Pú­blico, se­gundo re­portou a agência de no­tí­cias – op­taram por sair da sala, re­pu­di­ando as res­tri­ções que põem em causa o es­ta­tuto dos jor­na­listas e o prin­cípio da li­ber­dade de im­prensa.

Esta si­tu­ação re­mete ine­vi­ta­vel­mente para um pas­sado que se cria morto e en­ter­rado, quando o Pa­lácio Foz aco­lhia o SNI de triste me­mória. Fa­lamos do Se­cre­ta­riado Na­ci­onal de In­for­mação, o ser­viço res­pon­sável pela pro­pa­ganda po­lí­tica e in­for­mação da di­ta­dura fas­cista, que fun­ci­o­nava sob a tu­tela da pre­si­dência do Con­selho de Mi­nis­tros e que foi di­ri­gido até 1949 por An­tónio Ferro, um con­fesso ad­mi­rador de di­ta­dores como Sa­lazar, Mus­so­lini, Hi­tler ou Primo de Ri­vera. Mas nem é pre­ciso re­cuar tanto para es­ta­be­lecer pa­ra­lelos: em 1968, com a «Pri­ma­vera mar­ce­lista», o SNI mudou de nome sob a ba­tuta de Mar­celo Ca­e­tano, o tal que dizia que éramos livre de pensar... ca­lados. Pelos vistos, também nesta ma­téria, há quem sonhe hoje com o re­gresso ao pas­sado.



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