Recorrente, inconsequente e perversa
Assim se pode caracterizar a mensagem do PR de 1 de Janeiro, porque a sua crítica à situação do País, a distância relativamente à «espiral recessiva» e aos seus resultados e a dúvida sobre a constitucionalidade do OE, ou algo parecido, são recorrentes na gestão de imagem de Cavaco, foram expressas de diversas maneiras, inclusive há um ano em idêntica ocasião, e é velha de mais de vinte anos (do antes do «tabu») a farsa de que «não tem culpa nenhuma», que ele é que sabe e até avisou a tempo, e também a ladainha de que, para além de retoques, não se pode fazer coisa alguma de realmente diferente, porque – culpa de outros – as desgraças são «inevitáveis».
A opção de enviar três artigos do OE para apreciação sucessiva de (in)constitucionalidade releva a inconsequência. A desconformidade radical do OE com a Constituição obrigaria ao veto dum PR digno do seu juramento. Sendo Cavaco, tinha ao menos a possibilidade de pedir a apreciação preventiva, mas optou pela farsa, escolheu artigos mais fáceis de isolar e esconder em «tecnicismos jurídicos» e não suscitou urgência na apreciação, para abrir caminho a que – num climax de perversidade – uma possível decisão de inconstitucionalidade, com o argumento do «mal menor», possa não ser cumprida pelo próprio Tribunal que a decrete, como aconteceu em 2012. Com o aplauso do PS e do CDS-PP, Cavaco «fez-se do contra» para que o OE e esta política possam prosseguir a toda a velocidade.
São importantes as questões que esta situação veio colocar. Desde logo a urgência de serem considerados inconstitucionais diversos artigos gravíssimos do OE, o que já foi suscitado pelos deputados do PCP, entre outros. Depois a de reafirmar que, quaisquer que sejam as decisões do Tribunal, o OE é inconstitucional, ilegítimo e inaceitável (além de incumprível) e como tal deve ser denunciado e combatido com determinação até ser revertido. E finalmente a de denunciar, combater e seguramente derrotar os que, confrontados com as crescentes dificuldades e o isolamento social e político do Governo e do pacto de agressão, não cumprem a Constituição, como faz o PR, e empurram ou propõem sem peias a sua subversão e a instituição formal da ditadura dos grandes interesses.