Recorrente, inconsequente e perversa

Carlos Gonçalves

Assim se pode ca­rac­te­rizar a men­sagem do PR de 1 de Ja­neiro, porque a sua crí­tica à si­tu­ação do País, a dis­tância re­la­ti­va­mente à «es­piral re­ces­siva» e aos seus re­sul­tados e a dú­vida sobre a cons­ti­tu­ci­o­na­li­dade do OE, ou algo pa­re­cido, são re­cor­rentes na gestão de imagem de Ca­vaco, foram ex­pressas de di­versas ma­neiras, in­clu­sive há um ano em idên­tica oca­sião, e é velha de mais de vinte anos (do antes do «tabu») a farsa de que «não tem culpa ne­nhuma», que ele é que sabe e até avisou a tempo, e também a la­dainha de que, para além de re­to­ques, não se pode fazer coisa al­guma de re­al­mente di­fe­rente, porque – culpa de ou­tros – as des­graças são «ine­vi­tá­veis».

A opção de en­viar três ar­tigos do OE para apre­ci­ação su­ces­siva de (in)cons­ti­tu­ci­o­na­li­dade re­leva a in­con­sequência. A des­con­for­mi­dade ra­dical do OE com a Cons­ti­tuição obri­garia ao veto dum PR digno do seu ju­ra­mento. Sendo Ca­vaco, tinha ao menos a pos­si­bi­li­dade de pedir a apre­ci­ação pre­ven­tiva, mas optou pela farsa, es­co­lheu ar­tigos mais fá­ceis de isolar e es­conder em «tec­ni­cismos ju­rí­dicos» e não sus­citou ur­gência na apre­ci­ação, para abrir ca­minho a que – num climax de per­ver­si­dade – uma pos­sível de­cisão de in­cons­ti­tu­ci­o­na­li­dade, com o ar­gu­mento do «mal menor», possa não ser cum­prida pelo pró­prio Tri­bunal que a de­crete, como acon­teceu em 2012. Com o aplauso do PS e do CDS-PP, Ca­vaco «fez-se do contra» para que o OE e esta po­lí­tica possam pros­se­guir a toda a ve­lo­ci­dade.

São im­por­tantes as ques­tões que esta si­tu­ação veio co­locar. Desde logo a ur­gência de serem con­si­de­rados in­cons­ti­tu­ci­o­nais di­versos ar­tigos gra­vís­simos do OE, o que já foi sus­ci­tado pelos de­pu­tados do PCP, entre ou­tros. De­pois a de re­a­firmar que, quais­quer que sejam as de­ci­sões do Tri­bunal, o OE é in­cons­ti­tu­ci­onal, ile­gí­timo e ina­cei­tável (além de in­cum­prível) e como tal deve ser de­nun­ciado e com­ba­tido com de­ter­mi­nação até ser re­ver­tido. E fi­nal­mente a de de­nun­ciar, com­bater e se­gu­ra­mente der­rotar os que, con­fron­tados com as cres­centes di­fi­cul­dades e o iso­la­mento so­cial e po­lí­tico do Go­verno e do pacto de agressão, não cum­prem a Cons­ti­tuição, como faz o PR, e em­purram ou pro­põem sem peias a sua sub­versão e a ins­ti­tuição formal da di­ta­dura dos grandes in­te­resses.



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