A lei de Ulrich

Vasco Cardoso

A apresentação dos resultados de um banco são sempre um momento que merece registo. Em regra o banqueiro exibe com orgulho os resultados do saque. Naqueles algarismos estão condensados os sacrifícios impostos a todo um povo, as negociatas pagas com recursos públicos, os benefícios e privilégios fiscais que usufruem, os resultados da especulação financeira em que navegam, o desemprego, os baixos salários, a pobreza, a ruína de muitas pequenas empresas que levaram à falência. Simultaneamente, procede-se a uma leitura da realidade económica do país e às perspectivas futuras na óptica do capital, ou dos «mercados» como agora se usa dizer.

As últimas semanas foram pontuadas por vários momentos como este. Foi o caso do BPI, com Fernando Ulrich a servir de cicerone aos 117 milhões de euros de lucro alcançados pelo banco nos primeiros nove meses do ano (mais 15% que no mesmo período do ano anterior) e a ditar sentenças sobre a situação e o rumo do país. Disse o cavalheiro, quando questionado sobre o próximo OE, que há razões para temer «uma ditadura do Tribunal Constitucional».

O problema de Ulrich, e de outros banqueiros, não é, como se sabe, o Tribunal Constitucional mas a própria Constituição. Para o grande capital, a Constituição continua a ser um sério obstáculo aos seus objectivos de domínio e de controlo absoluto do país. Nos seus comandos e orientações estratégicas, nos direitos que consagra e projecta, a Constituição coloca a política de direita, o pacto de agressão, as políticas de austeridade, em confronto com a legalidade democrática. Acabar com a Constituição, substituí-la por uma ditadura dos monopólios, por um país onde a única Lei é a que permite a sua incomensurável acumulação de riqueza, custe o que custar, é um velho objectivo que o grande capital julga ter agora mais próximo.

A «refundação do memorando» – o tal que garantirá, só neste ano, mais de 8 mil milhões de euros de juros pagos pelo povo português à banca – entretanto anunciada pelo Governo, pode ter associada a si esse golpe institucional (que também aqui precisaria do apoio do PS). Um perigo que reclama que se torne mais intensa a luta para para libertar o país do domínio dos monopólios.



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