Urge melhor e mais célere Justiça
O Parlamento aprovou, na generalidade, com os votos favoráveis apenas da maioria PSD/CDS-PP, as propostas do Governo de revisão do Código Penal, do Código da Execução de Penas e do Código de Processo Penal.
Os prazos para suspender a prescrição dos crimes estão desadequados
Todos os partidos da oposição optaram pelas abstenção na proposta de lei que altera o Código Penal, votando contra nos outros dois diplomas.
Dois projectos de lei, um do PCP e outro do PS, foram igualmente viabilizados pela câmara, com a abstenção do PSD e do CDS-PP (e os votos favoráveis de todas as restantes bancadas), baixando também à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para debate na especialidade.
O projecto do PCP que altera o Código de Processo Penal estabelece a obrigatoriedade de assistência do arguido por defensor no inquérito, garantindo maior celeridade no julgamento de crimes de menor gravidade. O diploma do PS, por seu lado, pretende corrigir um dos artigos da legislação sobre crimes de responsabilidade de titulares de cargos públicos ou de altos cargos públicos.
As propostas do Governo de revisão dos códigos penais foram justificadas pela ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, pela necessidade de romper com a «imobilidade», pôr termo a expedientes dilatórios e à «impunidade».
Prescrição dos crimes
Definindo a posição da bancada comunista sobre as alterações do Governo ao Código Penal, o deputado comunista João Oliveira expressou concordância com a perspectiva de fazer depender de acusação particular os crimes de furto nas condições em que estão previstas, sem no entanto prescindir da necessidade de distinguir o bem que é objecto do furto e as circunstâncias concretas em que ocorre esse furto. Trata-se de fazer também alguma distinção no que toca à origem social e até à importância desse bens, uma vez que «o furto de bens alimentares não é a mesma coisa que o furto de um telemóvel», observou.
Em relação à suspensão da prescrição dos crimes, se bem que de acordo com as considerações do Executivo, o PCP entende que os prazos previstos para a suspensão estão desadequados, tendo João Oliveira anunciado a intenção de apresentar em sede de especialidade um mecanismo de proporcionalidade em relação ao próprio prazo de prescrição dos crimes.
Já quanto às falsas declarações, o parlamentar do PCP afirmou ter algumas dúvidas sobre a adequação desta proposta com as próprias intenções que o Governo diz ter nesta matéria, em que vai «muito para lá» do enunciado.
No que respeita ao Código de Processo Penal, afirmou também o acordo da sua bancada às propostas referentes à resposta (hoje obrigatória) do arguido sobre os seus antecedentes criminais, à manutenção do termo de identidade e residência até um momento posterior do ponto de vista processual, ao alargamento das exigências de assistência por defensor do arguido e, por fim, quanto à documentação dos actos, nomeadamente utilizando os meios audiovisuais.
Processo sumário
Outras mexidas há, porém, que suscitam as maiores dúvidas e discordâncias do Grupo Parlamentar do PCP. No Código de Execução de Penas, por exemplo, a execução da sanção acessória de expulsão do País está hoje ligada às condições da liberdade condicional, por haver um equilíbrio que tem de ser mantido em relação às exigências para antecipação dessa pena de expulsão do País. Ora, na opinião do PCP, o Governo propõe a ruptura desse equilíbrio, sem justificar essa opção.
Discordância que o PCP estende também – e esta é uma «discordância frontal», nas palavras de João Oliveira,- relativamente às declarações do arguido e das testemunhas. O que o Governo propõe em relação à valoração das declarações significa a possibilidade da sua utilização para «condenar um arguido em sede de julgamento quando não esteve presente nem o arguido nem as testemunha», constata o parlamentar comunista.
Sem deixar de estar de acordo com a necessidade de rever o regime de valoração, particularmente das testemunhas - «sobretudo para impedir que as testemunhas convenientemente se esqueçam daquilo que disseram na fase de inquérito ou apresentem uma versão contraditória» -, o parlamentar comunista entende no entanto que as propostas do Governo «vão muito para lá daquilo que seria aceitável».
Quanto ao processo sumário, João Oliveira considerou que «não é a opção pelo seu alargamento aos crimes de maior gravidade que vai resolver os problemas de celeridade da Justiça». Pelo contrário, advertiu, «vai colocar sobre os tribunais uma pressão de celeridade na realização da Justiça que não é compatível com o julgamento de crimes de maior gravidade».
Propostas do PCP
O projecto de lei do PCP que altera o Código de Processo Penal incide fundamentalmente sobre duas matérias: por um lado, a assistência do arguido pelo defensor durante o processo, nomeadamente durante a fase de inquérito, em que recupera uma proposta já apresentada anteriormente na revisão de 2007 (que vai aliás no sentido da proposta apresentada pelo Governo), com uma redacção que alarga o âmbito da assistência do defensor; por outro lado, os processos sumário, abreviado e sumaríssimo.
Para o deputado comunista João Oliveira, os mecanismos actualmente previstos nestes processos «não são hoje utilizados com a abrangência que poderiam ter devido à exiguidade dos prazos a que estão sujeitos os processos especiais».
Daí que, para o PCP, ao contrário da perspectiva do Governo, a solução para a utilização do processo sumário não passe pelo seu alargamento a crimes de maior gravidade mas sim por «permitir a utilização generalizada do processo sumário nos crimes de menor gravidade», sendo que isso já é hoje possível embora na prática não se verifiquem as condições que permitam a sua utilização.