Em aberto

Anabela Fino

Caso encerrado. Assim classifica o secretário-geral da UGT, João Proença, a promulgação pelo Presidente da República do Código do Trabalho. Como se se tratasse de uma porta que se fecha deixando para trás um pesadelo. Como se se varresse para debaixo do tapete o lixo incómodo. Como se se apagasse por artes mágicas as provas comprometedoras de um crime hediondo. Como se, uma vez promulgado, o Código do Trabalho – que Proença reconhece ser mau, «nomeadamente por pôr em causa o valor dos salários e do trabalho extraordinário», e por não resolver os «problemas da economia e das empresas» – dali não resultassem quaisquer consequências.

Caso encerrado? Caso encerrado para quem?

Certamente que Proença e a UGT gostariam de pôr uma pedra no assunto, testemunho da sua traição, mais uma, aos trabalhadores portugueses. Gostariam de fazer esquecer que as alterações à legislação laboral resultam do Compromisso para o Crescimento, Competitividade e Emprego, subscrito pela UGT a 18 de Janeiro com o Governo e o patronato, em obediência cega aos ditames do memorando de entendimento assinado por PS, PSD e CDS com a troika estrangeira. Gostariam de apagar da memória dos portugueses o facto dessas alterações terem sido aprovadas na AR por PSD e CDS com a conivência do PS (de que Proença é um dos dirigentes), traduzida na fórmula abstrusa que José Seguro baptizou de «abstenção violenta». Gostariam de poder continuar a convencer os incautos das «boas intenções» da UGT ao integrar a troika, mais uma, da concertação social, como se desconhecesse os resultados não só expectáveis como assumidamente prosseguidos nas alterações que apadrinhou.

Sucede porém que no caso vertente os parceiros de eleição da UGT não poupam elogios a Proença, fazendo questão de sublinhar a quota parte que lhe cabe na paternidade do aborto. No dia da promulgação do Código do Trabalho, o ministro Álvaro Santos Pereira veio de novo lembrá-lo – «a legislação laboral só foi conseguida porque tivemos um acordo de concertação social» – frisando que «todo o articulado da lei laboral foi discutido à vírgula, num trabalho muito intenso de muitos meses e que culminou no acordo de concertação social, mas prosseguiu com a discussão com os parceiros sociais».

Proença, tal como a UGT, tenta ainda fazer crer que a «revisão da legislação laboral evita uma maior desregulação do mercado de trabalho e novas formas de despedimento», mas não consegue avançar um argumento que seja na defesa desta tese quando confrontado com o crescimento galopante do desemprego, prova provada da falácia da apregoada «rigidez» da legislação laboral.

Temos pois que o caso estará tudo o que Proença quiser menos encerrado, pois o acordo que assinou acaba de escancarar as portas à redução dos salários, ao trabalho forçado e gratuito, aos despedimentos sem justa causa, à liquidação da contratação colectiva, à lei da selva no mundo do trabalho, com a inevitável consequência de mais opressão e exploração nas empresas, mais pobreza e mais miséria, o que só tem paralelo com as condições laborais vigentes no tempo do fascismo.

Talvez a UGT de Proença não saiba – sabem-no certamente os trabalhadores nela filiados – mas casos destes não se encerram. As traições de classe podem retardar a luta, não a impedem. É uma questão de tempo e de consciência.



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