EQUÍVOCOS

José Casanova

A decisão da direcção da Associação 25 de Abril (A25A) de não se fazer representar nas comemorações oficiais do 25 de Abril foi, para os media dominantes, a grande notícia da semana que passou. Mais ainda a partir do momento em que Mário Soares anunciou que, em «solidariedade» com a A25A, também não estaria presente nas comemorações.

Diz a direcção da A25A, explicando a sua decisão, que «o poder político que actualmente governa Portugal configura um outro ciclo político que está contra o 25 de Abril, os seus ideais e os seus valores». Trata-se, obviamente, de um equívoco.

Que o Governo Passos/Portas «está contra o 25 de Abril, os seus ideais e os seus valores» é uma verdade incontestável. Mas é igualmente incontestável que o actual Governo cumpre mais uma etapa do longo ciclo político iniciado, no plano institucional, pelo primeiro governo PS/Mário Soares, em 1976, e prosseguido de então para cá por sucessivos governos PS e PSD, ora sozinhos, ora aos pares, ora com o CDS – mas sempre, sempre, com os três de braço dado ao serviço da mesma política de direita e contra Abril, os seus ideais e os seus valores.

Assim sendo, tantas razões há, hoje, com o Governo PSD/CDS, para a direcção da A25A não se fazer representar nas comemorações, como havia com o anterior governo de maioria PS – e com o que o antecedeu, esse de maioria PSD; e com o anterior, esse de maioria PS; e por aí fora...

Por tudo isto, a atitude da direcção da A25A presta-se a leituras que, estou em crer, andam longe das intenções de alguns dos seus promotores, como seja a de que tal atitude configuraria uma acção de branqueamento das responsabilidades do PS na dramática situação hoje existente.

Já a «solidariedade» de Mário Soares com uma atitude anunciada como de protesto contra um governo que está «contra o 25 de Abril, os seus ideais e os seus valores», não se presta a qualquer equívoco: é Soares em acção, movendo-se no seu habitat natural, como se não tivesse aplaudido com entusiasmo o pacto das troikas e como se não fosse o principal actor nacional da contra-revolução e do ataque a Abril, aos seus ideais e aos seus valores.



Mais artigos de: Opinião

Rotunda democrática

Rotunda será, por definição, um espaço onde se circula simulando movimento em dado sentido ainda que sem aparente direcção. Ou, por empírica observação ao alcance do senso comum, aquele espaço privilegiado para se pode andar às voltas sem se...

«Pluralismo»?

O Conselho Regulador da ERC tornou pública uma Deliberação (2/PLU-TV/2012) sobre o pluralismo político nos canais televisivos generalistas. O documento abriga-se sob o amplo guarda-chuva da UE, em cujos 27 países, da Itália de Berlusconi à Inglaterra de Murdoch, esse...

O Passismo

Há dias, para demonstrar que o tratado orçamental na UE «era inegociável», a chanceler alemã A. Merkel invocou que o pacto já foi «assinado por 25 chefes de Governo e já foi ratificado por Portugal e Grécia». Percebe-se a aflição da...

Dois exemplos para a luta que travamos

Assinalam-se por estes dias duas importantes datas da história do movimento operário em Portugal. Foi há 50 anos que tiveram lugar as grandiosas manifestações do 1.º de Maio, precedidas de um amplo movimento grevista, que mobilizou mais de 200 mil trabalhadores em todo o País, com destaque para a manifestação realizada em Lisboa. Um 1.º de Maio marcado pelas reivindicações de melhores salários e pela sua afirmação inequívoca de luta contra a repressão e o fascismo, pela liberdade e pela democracia.

Eleições em crise

Os resultados da primeira volta das eleições presidenciais francesas indicam haver uma real possibilidade de mudanças na política francesa. Se o novo presidente da República francesa se chamar Hollande tal facto dever-se-á mais a uma derrota de Sarkozy do que a uma vitória...