EQUÍVOCOS
A decisão da direcção da Associação 25 de Abril (A25A) de não se fazer representar nas comemorações oficiais do 25 de Abril foi, para os media dominantes, a grande notícia da semana que passou. Mais ainda a partir do momento em que Mário Soares anunciou que, em «solidariedade» com a A25A, também não estaria presente nas comemorações.
Diz a direcção da A25A, explicando a sua decisão, que «o poder político que actualmente governa Portugal configura um outro ciclo político que está contra o 25 de Abril, os seus ideais e os seus valores». Trata-se, obviamente, de um equívoco.
Que o Governo Passos/Portas «está contra o 25 de Abril, os seus ideais e os seus valores» é uma verdade incontestável. Mas é igualmente incontestável que o actual Governo cumpre mais uma etapa do longo ciclo político iniciado, no plano institucional, pelo primeiro governo PS/Mário Soares, em 1976, e prosseguido de então para cá por sucessivos governos PS e PSD, ora sozinhos, ora aos pares, ora com o CDS – mas sempre, sempre, com os três de braço dado ao serviço da mesma política de direita e contra Abril, os seus ideais e os seus valores.
Assim sendo, tantas razões há, hoje, com o Governo PSD/CDS, para a direcção da A25A não se fazer representar nas comemorações, como havia com o anterior governo de maioria PS – e com o que o antecedeu, esse de maioria PSD; e com o anterior, esse de maioria PS; e por aí fora...
Por tudo isto, a atitude da direcção da A25A presta-se a leituras que, estou em crer, andam longe das intenções de alguns dos seus promotores, como seja a de que tal atitude configuraria uma acção de branqueamento das responsabilidades do PS na dramática situação hoje existente.
Já a «solidariedade» de Mário Soares com uma atitude anunciada como de protesto contra um governo que está «contra o 25 de Abril, os seus ideais e os seus valores», não se presta a qualquer equívoco: é Soares em acção, movendo-se no seu habitat natural, como se não tivesse aplaudido com entusiasmo o pacto das troikas e como se não fosse o principal actor nacional da contra-revolução e do ataque a Abril, aos seus ideais e aos seus valores.