80 mil manifestam-se no Chile
Milhares de chilenos exigiram em Santiago, dia 25, reformas profundas no sistema de Ensino e prometeram que o movimento reivindicativo vai estender-se a outras áreas, igualmente subjugadas à acumulação de capital privado e não aos interesses do povo e do País.
Desde 2006, os bancos lucraram 312 milhões de dólares com os créditos no Superior
Na primeira acção de massas realizada este ano, estudantes, pais, professores, funcionários do sector e milhares de populares encheram as ruas da capital chilena numa marcha em defesa do Ensino público, gratuito e de qualidade. De acordo com informações divulgadas pela Inter Press Service, participaram na iniciativa cerca de 80 mil pessoas.
«Esta grande mobibilização não nos alegra apenas pela adesão, mas porque afirma uma mensagem clara: o movimento social pela Educação, longe de estar morto, está mais vivo do que nunca», salientou o presidente da Federação de Estudantes da Universidade Católica, Noam Titelman.
Em declarações à IPS, Titelman acrescentou que «as políticas públicas não podem ser decididas nas costas dos cidadãos», os quais, disse ainda, «têm uma alternativa concreta ao actual modelo [de Ensino]».
A manifestação pacífica ocorreu dois dias depois de o governo liderado por Sebastián Piñera ter proposto que o Estado assuma integralmente o financiamento do Ensino Superior, anúncio que representa um recuo face ao envolvimento da banca privada no financiamento da carreira universitária dos estudantes, projecto que contemplava uma bolsa de créditos avalizados pelo Estado.
Cálculos feitos pelo Centro de Informação Jornalística do Chile, citados pela Prensa Latina, indicam que os sete bancos que participaram no sitema de créditos com o aval do público lucraram mais de 312 milhões de dólares com o negócio nos últimos cinco anos.
A cedência do executivo representa «uma vitória da cidadania», sublinhou também Titelman, mas considerou-a «insuficiente». Primeiro porque «trata-se de um anúncio», e segundo porque «não resultou de um diálogo com os distintos agentes educativos» sobre as suas propostas.
Opinião semelhante manifestou o presidente da Federação de Estudantes da Universidade do Chile, Gabriel Boric, para quem os estudantes estão dispostos a dialogar com o governo se a negociação se centrar «na essência do problema, e não na regulação dos excessos».
Boric frisou igualmente que um dos requisitos mínimos para o início da negociação é a readimissão de dezenas de estudantes do Secundário, cujas matrículas foram canceladas como represália por terem participado nos protestos do ano passado.
As cautelas expressas pelos dirigentes estudantis chilenos são justificadas, já que, após o anúncio, o governo chileno insistiu que a exigência da gratuitidade do sistema de Ensino é «injusta», e o ministro da Educação, Harald Beyer, entre garantias de abertura ao diálogo, voltou mesmo a defender o regime de bolsas ainda não revogado.
Campo aberto à luta
A manifestação realizada no passado dia 25 demonstrou que a dinâmica reivindicativa em defesa de profundas reformas no sector da Educação prossegue, mais forte, e consolida-se como um facto na vida social e política do Chile. Mas para diversos líderes político-sindicais, o movimento de protesto pode alargar-se a outras áreas.
Isso mesmo enfatizou a dirigente juvenil Camila Vallejo, para quem as acções de massas são a principal ferramenta de que dispõem os chilenos face ao poder, por isso deixou o prognóstico de novas mobilizações em torno de outras questões relevantes no país.
«A luta é ampla e dura», concordou Bárbara Figueroa, citada pela Prensa Latina. A dirigente do Sindicato dos Professores do Chile lembrou que a solução para os problemas no sector do Ensino não reside apenas na canalização de mais recursos ou na maquilhagem de um sistema fracassado, mas em reformas substanciais orientadas para um modelo público e gratuito, e que, por outro lado,os problemas do Chile não se resumem à questão da Educação, mas expressam-se no sector da Saúde ou na exploração dos recursos naturais, exemplificou.
«Este é o momento para que o movimento social organizado recupere a sua capacidade de mobilização e afirme com força as mudanças de fundo de que o Chile necessita», destacou, por seu lado, o presidente da Central Unitária dos Trabalhadores, Arturo Martínez, que antevia um 1.º de Maio marcado pela unidade e pela reivindicação ampla em torno de alterações estruturais no país.