Mexidas no pacote laboral são um ataque brutal ao mundo do trabalho

Injustiça e indignidade

Foi aprovada, na generalidade, pela maioria PSD/CDS-PP, com a abstenção do PS, a proposta de lei que altera o Código do Trabalho. Para o PCP, que votou contra (PEV e BE também), este é um ataque soez, vil e brutal aos trabalhadores e seus direitos que só pode merecer repúdio e rejeição total, dando razão a uma luta que prossegue no Parlamento (debate na especialidade), nas empresas e nas ruas.

Este é um ataque brutal contra o mundo do trabalho

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«Trabalhar mais para receber menos, tornar mais fácil e barato o despedimento e atacar os direitos de quem trabalha», assim é, nas suas linhas essenciais, o conteúdo do diploma, segundo a síntese do deputado comunista Jorge Machado.

Numa operação de mistificação e mentira, o ministro Álvaro Santos Pereira catalogou a iniciativa do Governo como «uma das mais profundas reformas estruturais dos últimos anos», dizendo que «aponta para o interesse geral de todos os portugueses».

 

Livre arbítrio ao patrão

 

Não há porém «propaganda e disfarce» que alterem ou apaguem a realidade, como tratou de sublinhar o deputado comunista Francisco Lopes, logo após o discurso inicial do ministro da Economia e do Emprego. Sumariando o que verdadeiramente está gizado no pacote do Governo, o deputado do PCP frisou que é «trabalho esforçado e gratuito, com a eliminação de feriados, redução de dias de férias e corte de dias de descanso obrigatório, diminuição dos salários, designadamente com o corte do pagamento do trabalho em dias de descanso e das horas extraordinárias».

Do extenso rol de medidas gravosas faz ainda parte, prosseguiu, «a generalização do banco de horas que pode significar trabalhar 12 horas por dia e 60 horas por semana, com todos os problemas que isto coloca à vida dos trabalhadores».

Em causa, lembrou Francisco Lopes, está também «a facilitação dos despedimentos», e, por outro lado, «o ataque e liquidação da contratação colectiva».

Desmentindo afirmações do titular da pasta da Economia, que insistiu na tecla de que as medidas preconizadas pelo Executivo dotarão «as empresas de mecanismos que lhes permitam competir em pé de igualdade», o deputado do PCP considerou que este é um pacote laboral que «nada tem a ver com a competitividade, a produtividade ou o combate ao défice ou à dívida mas tem tudo a ver com mais despedimentos e desemprego, precariedade, corte nos salários e pensões, mais horas de trabalho com menos salário, degradação das condições de trabalho, um imenso retrocesso social e civilizacional».

«É a velha e bafienta linha de injustiça e indignidade, de aumento do poder e da arbitrariedade patronal», concluiu Francisco Lopes, definindo a natureza das opções que perpassam todo o conteúdo do diploma.

 

Mais exploração

 

Jorge Machado repegou aliás na questão da competitividade, em particular na afirmação do Governo de que «vamos ser mais competitivos» e, indo mais longe na crítica, afirmou mesmo ser esta «uma fraude».

A este respeito, lembrado foi que os trabalhadores portugueses já trabalham em média mais do que qualquer outro país da Europa. «O único onde se trabalha mais horas do que em Portugal é a Grécia, e veja-se a situação em que se encontra», sublinhou Jorge Machado, dirigindo-se ao ministro Álvaro Santos Pereira, a quem recordou ainda que trabalhamos mais do que os alemães, os ingleses, os espanhóis, os franceses, sendo, ao mesmo tempo, os que recebemos menos salário.

Não faz sentido, pois, falar de aumento da competitividade, como se ouviu da boca do ministro, quando na verdade do que se trata é de aumento da exploração dos trabalhadores. E por isso o Governo foi acusado de hipocrisia, sendo-lhe igualmente dito que não pode falar de «combate às desigualdades e ao mesmo tempo agravar a exploração de quem trabalha».

Do que se trata, sim, é de «dar mais dinheiro a quem explora» e de «empobrecer os trabalhadores», sintetizou Jorge Machado, pondo assim a nu aquele que é afinal o grande desiderato inscrito na proposta de lei governamental.

 

Mentira descarada

 

Posto em evidência no debate pela bancada comunista foi entretanto a ideia de que esta proposta de lei não tem nem poderia ter o propagandeado «visto familiar» (ver caixa), pela simples razão de que, em rigor, como foi demonstrado, é contra os trabalhadores, contra as famílias, contra a sua qualidade de vida.

Desmontada, por outro lado, foi a tese do Governo segundo a qual a legislação laboral vigente constitui um entrave à criação de emprego, tal como foi rejeitada a ideia igualmente propalada de que por via da alteração agora preconizada haverá mais emprego.

«Vai permitir às empresas uma melhor organização do tempo de trabalho e a flexibilização dos seus ciclos produtivos», afirmou o ministro, aludindo ao pacote de medidas, o qual, disse ainda, «combina protecção dos trabalhadores com a flexibilidade necessária para atender às mudanças económicas e tecnológicas dos nossos tempos».

E, cúmulo do cinismo, chegou a afirmar que se trata de uma «proposta que salvaguarda os direitos dos trabalhadores, que mantém intocada a vocação deste Governo de proteger socialmente os trabalhadores e o seu direito ao trabalho».

«É uma mentira descarada, uma fraude», não hesitou em ripostar Jorge Machado, referindo-se às palavras do ministro da Economia e do Emprego, a quem fez notar que «facilitar os despedimentos e aumentar a exploração de quem trabalha não cria um único posto de trabalho».

Recordadas, a este propósito, foram as anteriores alterações à legislação laboral, onde a lengalenga dos governos e do patronato foi exactamente a mesma, com os resultados que se conhecem: o pico do desemprego a aumentar progressivamente.

É isso que voltará a acontecer caso estas medidas não sejam travadas, vaticinou a bancada do PCP, convicta de que o patronato vai aproveitar-se da facilitação dos despedimentos e do seu embaratecimento.

Para os deputados comunistas – e esta foi outra questão chave a que deram relevo – a proposta de lei configura uma grave violação à Constituição, comportando, simultaneamente, uma gravíssima ofensiva contra o movimento sindical.

E por tudo isto só pode merecer a mais firme oposição do PCP. Porque, foi dito, «isto é tudo o que Portugal não precisa», este é o caminho de desastre nacional que não resolve nenhum dos problemas do País, bem pelo contrário, só agravará o empobrecimento, a exploração, a injustiça e o desemprego.


Onde pára o «visto familiar»?

 

Desaparecido do discurso do CDS-PP no debate foi o chamado «visto familiar» (medida de propaganda destinada alegadamente a avaliar previamente o impacto das iniciativas do Governo na vida das famílias), facto que a deputada comunista Rita Rato não deixou de anotar, levando-a a dirigir-se ao deputado do CDS-PP Artur Rego (que interviera momentos antes), a quem perguntou se o banco de horas, o alargamento do horário de trabalho até 12 horas por dia e 60 semanais por acaso «têm visto familiar». O mesmo em relação ao corte nos dias de férias ou à eliminação do dia de descanso compensatório.

«Tem visto familiar, por exemplo, o corte para metade do pagamento das horas extraordinárias?», inquiriu, antes de deixar outra pergunta ao deputado do CDS: «Acha que é vida para alguém sair de casa de madrugada e chegar a casa à noite? Acha que é vida para uma mulher, que tem de acompanhar os filhos, sair de casa às cinco da manhã e chegar às 10 da noite, para ganhar uma miséria ao fim do mês?»

«Não. Isto não tem visto familiar. Isto tem é o visto da exploração e do ataque aos direitos dos trabalhadores e das mulheres», frisou Rita Rato, segura de que esta é «uma medida inaceitável», «um ataque brutal aos direitos dos trabalhadores».


PS cúmplice

 

A posição aparentemente ambígua do PS (mas em rigor comprometida e vinculada com o que de pior o Governo pretende fazer em matéria de legislação laboral) não passou sem uma crítica dura do PCP.

O deputado comunista Jorge Machado, dirigindo-se ao deputado do PS Miguel Laranjeiro, que interviera antes no debate, afirmou que «não há abstenções: ou se é contra – e vota-se contra; ou viabiliza-se este pacote de alteração à legislação laboral».

E lembrou a história do PS neste processo. «Primeiro abriu caminho com a troika; depois contou com a assinatura do PSD e do CDS-PP; depois, diz que dá luz verde ao pacote laboral do Governo; agora, é passar para uma das suas já famosas abstenções violentas», sumariou.

Ora, na opinião do PCP, com esta abstenção, fica provado que «o PS continua de mãos dadas, coligado com o PSD e o CDS-PP na política de direita».

Jorge Machado acusou ainda a bancada do PS de ter falado «de tudo mas muito pouco» das propostas em concreto, ficando assim por conhecer qual a sua opinião sobre as mais gravosas. Nada disse, por exemplo, de propostas como o despedimento por inadaptação, despedimento por extinção do posto de trabalho (objectivo arbitrário e inconstitucional), de redução das indemnizações pagas aos trabalhadores, do horário de trabalho (banco de horas), do trabalho suplementar pago a metade.

«Acha que os trabalhadores portugueses já ganham demais? Está de acordo que se trabalhe mais para receber menos?», indagou junto do deputado do PS que na resposta, à falta argumentos, repetiu a falsa tese da «aliança» entre esquerda e direita que chumbou o PEC IV e assim derrubou o Governo de José Sócrates. Não disse é o que pensa, porém, entre tantas outras questões colocadas por Jorge Machado que ficaram sem resposta, sobre, por exemplo, a concertação social, sempre tão valorizada pelo PS. «Está de acordo com o ataque à contratação colectiva perpetrado por este Código do Trabalho?», perguntara-lhe o deputado do PCP, que já antes observara que o PS se coloca naquela posição habitual em cima do muro em que diz: «Deus é bom mas o diabo também não é mau rapaz».

Daí a reacção final do parlamentar do PCP: «Viabilizar, com a abstenção, é um sinal que o PS está a dar aos portugueses de que afinal faria exactamente a mesma coisa que o PSD e o CDS-PP estão a fazer».



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