A magnífica proposta

Vasco Cardoso

Triste figura aquela a que o conselho de reitores se prestou ao assumir as dores do Governo propondo um novo aumento de propinas de 30 euros por ano. Esta inaceitável proposta não pode deixar de estar ligada a importantes alterações registadas no ensino Superior público nos últimos anos. Basta pensar que não há hoje universidade pública no nosso País que não tenha um banqueiro ou um homem do PSI-20 nos seus principais órgãos consultivos. Basta reparar no quanto ridículo é o facto de hoje muitas das universidade se auto-denominarem em inglês, uma espécie de nome artístico que põem no portão da escola para competir nesse dito mercado global de formações académicas. E basta também ter em conta que, com a aplicação de Bolonha e a fragmentação dos diferentes graus académicos, se assistiu a um aumento exponencial do valor das propinas com os actuais mestrados – que correspondiam há meia dúzia de anos aos 4.º e 5.º anos de qualquer licenciatura – a custarem entre cinco a 10 mil euros por ano.

Mas a proposta dos reitores não veio a seco. Os 30 euros a mais – recorde-se que a esmagadora maioria das instituições cobra o valor máximo legal próximo dos mil euros – destinar-se-iam a «ajudar» os estudantes mais carenciados. Um apelo que tem tanto de demagógico como de perigoso, ou não estivessem, à boleia do mais serôdio populismo, a abrir a porta a uma alteração à actual Lei de Financiamento que venha a impor o nivelamento das propinas das actuais licenciaturas com os restantes graus académicos (mestrados e doutoramentos) e/ou a possibilidade de fixação do valor por cada uma das instituições.

A história da imposição de propinas no nosso País foi sempre embrulhada em tortuosos argumentos. Desde o carácter «simbólico» do valor, passando pela necessidade de aumentar a «qualidade» do ensino, até à tese de que andariam os «pobres a pagar» com os seus impostos os «cursos dos ricos», tudo foi usado por forma a impor a actual realidade: quem quer estudar, PAGA!

Um novo aumento de propinas, longe de ser um delírio dos reitores, é de facto uma séria hipótese que está em cima da mesa no âmbito do pacto de agressão em curso. Ou seja, mais uma luta que teremos de juntar a todas as outras.



Mais artigos de: Opinião

Defender o povo sírio

A passagem de um ano sobre as primeiras manifestações na Síria contra o governo do presidente Bashar Al-Assad está a ser marcada por desenvolvimentos, factos e denúncias que dizem muito do que está realmente em causa naquilo a que erradamente se chama de...

Contrabando

O passado fim-de-semana foi profícuo em declarações que, face ao aprofundamento da crise do capitalismo, demonstram muito do terrorismo ideológico e do contrabando de propaganda e desinformação que por aí anda. Referir-nos-emos apenas a duas delas. A primeira roça...

É preciso avisar toda a gente…

Dar notícia, informar prevenir… que estamos perante a mais ignóbil e descarada operação de rapina de que há memória na história de quase quatro décadas da nossa democracia. Este saque implacável tem-nos sido friamente servido com a...

Memórias

«Eu queria ser médica ou professora, mas o Salazar tirou-me da escola aos sete anos e pôs-me atrás de uma máquina de costura.» É esta a minha primeira memória de Salazar, ouvida e repetida pela voz da minha avó muito antes de ter idade para compreender o seu...

Coragem, determinação e confiança

Daqui a poucas horas, milhares de trabalhadores encontrarão na adesão à greve geral a forma de expressar a sua indignação e protesto face ao rumo de desastre nacional que está em curso e, em particular, às suas consequências concretas na vida de cada um.