O espelho do fascismo

José Casanova

A Uni­ver­si­dade do Min­delo de­cidiu atri­buir a Adriano Mo­reira o grau de Doutor Ho­noris Causa.

As ra­zões de tal honra re­sidem no facto de, se­gundo o Reitor da dita Uni­ver­si­dade, Adriano Mo­reira ser, não apenas «um dos sá­bios de Por­tugal, una­ni­me­mente re­co­nhe­cido por pes­soas de todas as cores po­lí­ticas», mas também –

E quanto a «de­feitos», nem um…

Ora, Adriano Mo­reira foi «mi­nistro do Ul­tramar» de Sa­lazar – facto que, por si só, diz al­guma coisa a quem queira ouvir…

Acresce que, no que res­peita a Cabo Verde, Adriano Mo­reira tem no seu cur­rí­culo o ter le­vado a PIDE para aquela então co­lónia por­tu­guesa – o que, está-se mesmo a ver, é de hu­ma­nista e de de­mo­crata

Para além disso, foi ele que, en­quanto mi­nistro do fas­cismo, deu a ordem para a re­a­ber­tura do Campo do Tar­rafal para nele serem en­cer­rados mi­li­tantes dos mo­vi­mentos de li­ber­tação das co­ló­nias – facto que, por si só, che­gava e so­brava...

Muito jus­ta­mente, a As­so­ci­ação Cabo-Ver­diana de Ex-Presos Po­lí­ticos, pela voz do seu pre­si­dente, Pedro Mar­tins, ma­ni­festou-se contra a de­cisão que con­si­derou «um in­sulto».

A apoiar as ra­zões do Reitor, veio um his­to­ri­ador (há sempre um his­to­ri­ador dis­po­nível…) ale­gando que «Cabo Verde não tem razão para ali­mentar res­sen­ti­mentos contra quem quer que seja».

É claro, o que lá vai, lá vai… e não há nada como apagar a me­mória para fazer com que o que lá vai… volte.

E já agora, para avivar me­mó­rias, re­corde-se que este Campo da Morte Lenta foi criado em Abril de 1936 e inau­gu­rado cinco meses de­pois.

«Quem vem para o Tar­rafal vem para morrer», era o lema dos di­rec­tores do Campo.

«Eu não estou aqui para curar do­entes, mas para passar cer­ti­dões de óbito», era o lema do mé­dico do Campo.

Por lá pas­saram 340 an­ti­fas­cistas por­tu­gueses, so­mando dois mil anos, onze meses e cinco dias de prisão – e lá mor­rerem 32, fri­a­mente as­sas­si­nados.

Fe­chado em 1954, foi de­pois re­a­berto por Adriano Mo­reira em 1961 e para lá foram en­vi­ados pa­tri­otas dos mo­vi­mentos de li­ber­tação.

Do Tar­rafal se diz, jus­ta­mente, que foi o es­pelho do fas­cismo.



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