Nem qualidade nem exigência
O Governo desistiu da Educação, mostrando-se incapaz de qualquer rasgo para «vencer as dificuldades». Disso é exemplo a chamada «reestruturação curricular», que mais não é do que um novo passo no sentido da destruição da Escola Pública, acusa o PCP.
Governo fixado em despedir professores
Em vez de a encarar como factor de «emancipação individual e colectiva, aceita a concepção retrógrada imposta pela troika que vê a Escola Pública como um empecilho, um gasto supérfluo», assim resumiu o deputado comunista Miguel Tiago a política educativa do Executivo PSD/CDS-PP.
Uma política, tal como a dos governos que o antecederam, pautada por critérios «estritamente economicistas», e à qual tem faltado de forma deliberada uma «visão estratégica», denunciou o parlamentar do PCP, dia 15, no plenário da Assembleia da República.
Esta suposta reorganização curricular mais não é, pois, do que um testemunho dessa política assente em «medidas desgarradas, desestruturadas, economicistas, cegas, injustas».
No caso concreto, trata-se de um «ajuste curricular ao orçamento», uma medida avulsa para ir buscar os 102 milhões acordados com o FMI/UE/BCE, ou seja um mero acerto de horários para despedir professores, considerou na sua declaração política o deputado Miguel Tiago, recusando ver na iniciativa do Governo qualquer sinal de verdadeira reforma ou revisão curricular.
Esta, a dar-se, observou, exigiria «ampla e profunda participação», «ponderação» e «tempo», «um debate alargado e sua associação a uma estratégia bem definida». O que não acontece. Mais, todos aqueles pressupostos estão na antípoda do que fez o Governo, que ignorou a Lei de Bases do Sistema Educativo, segundo Miguel Tiago, ao deixar de fora do currículo do primeiro ciclo do Ensino Básico as expressões artísticas e a actividade físico-motora, enquanto nos restantes ciclos de Ensino tudo é feito em nome da poupança, nem que seja à custa do despedimento de professores e da qualidade do ensino.
«Acima de tudo estão as necessidades dos alunos», que a revisão é para «melhorar» os seus resultados, que a aposta é na «autonomia das escolas», argumentou o deputado do PSD, Amadeu Albergaria, em defesa das propostas do Governo.
Nem qualificação nem resposta às exigências do Ensino, ripostou Miguel Tiago, sublinhando que o Ministério da 5 de Outubro, ao invés, o que pretende é despedir docentes, «extinguir disciplinas sem fundamento», pôr fim ao par pedagógico em Educação Visual e Tecnológica (EVT), desdobrar turmas em aulas de Ciências Naturais e Físico-Química.
Tudo isto a somar, lembrou, a outras medidas gravosas vindas de trás como a constituição de mega-agrupamentos, o aumento do número de alunos por turma, a manutenção de contratos de milhares de funcionários sem perspectiva de renovação ou a eliminação na organização lectiva de dezenas de horas em créditos para as actividades circum-escolares.
Problemas sem resposta
Ideia forte expressa por Miguel Tiago é a de que não é possível (ao contrário do que o ministro Nuno Crato tenta fazer crer) resolver os problemas educativos – em sua opinião «os mais graves da Europa» – com «o mais baixo orçamento para a Educação da Europa».
Demonstra-o, exemplificou, o pré-escolar que está «longe da universalidade e que deveria ser obrigatório mas não é», enquanto o primeiro ciclo se desenvolve em «escolas degradadas» nos grandes centros urbanos e em «escolas distantes das pequenas povoações do interior», continuando sem integrar conteúdos como prevê a Lei de Bases do Sistema Educativo.
Uma panorâmica que não melhora no segundo e terceiro ciclos, que Miguel Tiago disse estarem «depauperados, com menos professores, menos funcionários, reduzidos a uma doutrina de saber ler, escrever e contar».
Já o Secundário, esse, verberou, está «assente na triagem entre profissionalização de banda estreita ou prosseguimento de estudos, agora igualmente fragilizado pelo remendo curricular do Governo».
Travar o debate
A maioria parlamentar inviabilizou o alargamento do prazo de discussão pública da chamada «reforma curricular», tal como preconizado em projecto de resolução do PCP, que desta forma pretendia um maior envolvimento de professores, pais e estudantes num processo que do seu ponto de vista deve ser democrático e amadurecido e não imposto de forma unilateral como pretende o Governo.
Bloqueada sexta-feira passada pelos votos negativos dos partidos que suportam o Governo de Passos Coelho e Paulo Portas foi, por outro lado, a audição pública sobre a realização de uma verdadeira reforma curricular igualmente proposta pelos deputados comunistas na Comissão de Educação, Ciência e Cultura.