Defender o serviço público
A irem por diante as intenções do Governo para a RTP, pode estar em causa a própria existência do serviço público de rádio e televisão, alertou anteontem o PCP.
A privatização da RTP é um objectivo antigo e foi sempre derrotado
As orientações explicitadas pelo Governo quanto à RTP, designadamente a sua privatização parcial, espelham com clareza o intuito de aplicar um «golpe devastador contra o serviço público de televisão e rádio». A acusação foi feita anteontem por Vasco Cardoso, da Comissão Política do CC do PCP, numa conferência de imprensa realizada na sede do Partido.
Para o dirigente do PCP, as medidas que se pretende aplicar na empresa, expressas no chamado Plano de Saneamento Económico e Financeiro, apresentado pelo Conselho de Administração a pedido do Governo, podem mesmo levar à destruição da RTP. O executivo PSD/CDS pretende, designadamente, a privatização de um canal de televisão e da produção de conteúdos e sua distribuição; a desresponsabilização sobre a RTP Madeira e RTP Açores; o despedimento, numa primeira fase, de 300 trabalhadores e o ataque aos seus direitos; e um corte de 80 milhões de euros por ano, «sem qualquer fundamentação ou avaliação do impacto na programação e serviço prestado».
Trata-se, garante o PCP, de um «inaceitável» e «injustificável» ataque ao serviço público, à língua e à cultura portuguesas, aos trabalhadores da RTP e do sector da comunicação social e da cultura, bem como ao direito do povo português a disporem de um serviço público de rádio e televisão. Vasco Cardoso chamou ainda a atenção para o «velho truque» a que o Governo recorreu em todo este processo, utilizado anteriormente em empresas outrora públicas: «primeiro arruina-se, desprestigia-se, afunda-se; e depois, cinicamente, vem dizer-se que face à situação alegadamente insustentável a que se chegou, não há outro remédio senão privatizar ou liquidar.»
Na mira do capital
Para o PCP, «não há nem pode haver serviço público sem uma estação pública de televisão com os meios adequados à sua missão». A ir por diante este plano, garantiu o dirigente do PCP, não será possível garantir, com um só canal generalista, uma «forte componente cultural e formativa, a valorização da educação, da língua portuguesa, da ciência, da investigação, das artes, da inovação, do desporto, da produção independente de obras criativas ou do cinema português». A manutenção do serviço público é, ainda, a «única e segura garantia de que o País não acordará um dia com um panorama televisivo nacional dominado por grupos e capitais estrangeiros».
Assim, o PCP defende a manutenção dos dois canais principais de serviço público de televisão, o alargamento do serviço público prestado, «aproveitando também todas as potencialidades abertas, seja no plano das tecnologias de informação e comunicação seja pela introdução da Televisão Digital Terrestre», uma política de saneamento financeiro que envolva uma «rigorosa imputação de custos por canal e serviços prestados», uma «justa definição das indemnizações compensatórias e o seu atempado pagamento pelo Estado», a captação de receitas publicitárias «sem constrangimentos», a valorização dos seus profissionais e um racional aproveitamento das capacidades e património da empresa».
Visão bem diferente tem o Grupo de Trabalho nomeado para definir o conceito de «serviço público» (definido já, aliás, pela Constituição e pela Lei). Indo ao encontro dos interesses dos grandes grupos económicos que operam no sector, este grupo defende a eliminação de seis dos oito canais de televisão e um dos canais de rádio e a eliminação da informação e de tudo quanto seja concorrencial com os canais privados, para além das receitas da publicidade.
O PCP, apelando à intensificação da luta dos trabalhadores da RTP, designadamente através da sua participação massiva na greve geral, lembra que há décadas que o serviço público de rádio e televisão está na mira do grande capital. Mas, apesar das tentativas, a privatização nunca se concretizou: «estamos certos de que, tal como anteriormente esse objectivo foi derrotado, agora também o será.»