Jerónimo de Sousa traça balanço negro do arranque da governação

Esta política inferniza a vida de milhões de portugueses

Num balanço aos primeiros 30 dias da acção governativa, o primeiro-ministro mostrou-se satisfeito, disse que «não perdeu tempo» e fez tudo para «concretizar os calendários» acordados com a troika. Por isso mereceu já o entusiástico aplauso dos banqueiros, na exacta proporção em que se vão somando os sinais de repúdio e protesto popular.

O Governo põe-se ao lado do capital

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Faz amanhã oito dias, na sua estreia em debate quinzenais no Parlamento, Passos Coelho apresentou-se determinado em prosseguir o que apelidou de «uma das maiores transformações de que há memória na sociedade portuguesa».

Mas por trás do ar cândido e sereno com que compõe a imagem, o que as suas medidas de política revelam é o frio propósito de prosseguir sem dó nem piedade, ainda com maior ferocidade, a linha de ataque aos direitos e às condições de vida das classes trabalhadoras, agravando injustiças e desigualdades.

 

Sacrifícios para os mesmos

 

Disso são testemunhos, como fez notar no período de perguntas o Secretário-geral do PCP numa síntese aos principais traços que marcam este período inicial da vida do Governo, após «a jura» que aquele fez de que seria «um fiel executor do programa da troika», a «grande talhada no subsídio de Natal aos trabalhadores e aos reformados e pensionistas», a que se seguiu «o aumento brutal do preço dos transportes», a par da alteração à «legislação laboral para despedir de forma mais fácil e barata», tudo sob a «falaciosa tese da austeridade e dos sacrifícios equitativos».

A somar a este quadro negro, e ao contrário do que o primeiro-ministro disse em campanha eleitoral, houve ainda o aumento de sete para onze administradores na Caixa Geral de Depósitos.

«Depois de tanto anúncio e declaração, de tanta necessidade de moralismo, o Governo vem afinal alargar aquela administração, no preciso momento em que, segundo os objectivos da troika e do Governo, se tende a privatizar uma parte substancial da CGD, designadamente a parte mais rentável que é o sector segurador», sublinhou Jerónimo de Sousa, que inquiriu sobre os fundamentos que levaram o Governo a tomar tal decisão.

Que «não houve aumento do número de administradores executivos» mas sim uma «alteração do modelo de gestão da CGD» foi a justificação mal amanhada do chefe do Governo, que proferiu ainda outra rábula: a de que «não há nenhuma nomeação em razão de cartão partidário».

 

Do lado do capital

 

Sobre as alterações à legislação laboral, aludindo à declaração na véspera do secretário de Estado que disse que a medida era para criar mais emprego, Jerónimo de Sousa perguntou como se acomodava esta afirmação com a do ministro das Finanças que entretanto afirmara que o «desemprego vai aumentar».

«Quem é que está a mentir e quem está a falar verdade?», perguntou, convicto de que a medida visa, isso sim, «embaratecer os despedimentos, chegando ao cúmulo de perspectivar que sejam os trabalhadores através de um fundo a pagar o seu próprio despedimento».

«Isto tem alguma coisa de justiça social, senhor primeiro-ministro?», questionou ainda o dirigente comunista, antes de lembrar que «sempre que há conflito e confronto de interesses entre os trabalhadores e o poder económico a Constituição faz uma opção e põe-se do lado dos trabalhadores». «Ora o Governo põe-se ao lado do capital, do patronato, ao contrário do que está consagrado na Lei Fundamental», acusou.

Passos Coelho, na resposta, confirmou que «há compromissos para reduzir as indemnizações a pagar» por despedimento, como vista à sua «aproximação à média europeia», garantindo porém que o «fundo não vai ser pago pelos trabalhadores».

Jerónimo de Sousa, na réplica, teceu duras críticas ao que disse ser a concepção implícita nas palavras do primeiro-ministro de «tratar de forma igual aquilo que é diferente, de procurar estabelecer uma relação de forças idêntica entre quem tem o poder económico e quem vive do rendimento do seu trabalho».

Ora «tal concepção é a do Governo mas não é o que diz a Constituição», observou, para concluir que as afirmações do chefe do Executivo representam uma «mistificação tremenda», «além da injustiça social» e da «brutalidade que é pensar que o senhor Belmiro está em condições idênticas à de uma trabalhadora da caixa do supermercado».

 

Os ricos mais ricos

Identificado por Jerónimo de Sousa, neste olhar sobre as opções tomadas na fase inicial da governação, foi igualmente o facto de ter havido uma parte da sociedade que pagou, «a quem o Governo cobrou» – os trabalhadores, reformados e pensionistas –, enquanto outros ficaram isentos de qualquer esforço.

A este propósito, depois de questionar por que razão o chefe do Governo manteve um completo silêncio sobre o facto de os lucros e dividendo permanecerem intocáveis, o dirigente do PCP trouxe à colação notícias vindas a público na véspera segundo as quais «os mais ricos em Portugal ficaram mais ricos, apesar desta crise».

E sobre o aumento brutal dos transportes – depois de convidar o governante a ver quem anda nos transportes públicos -, sublinhou que esse aumento vai implicar uma redução dos rendimentos das famílias, particularmente dos trabalhadores, colocando muitos perante a «dificuldade de poderem deslocar-se».

Por isso o alerta deixado pelo Secretário-geral do PCP ao primeiro-ministro: a «ruptura social (...) já está a acontecer, tendo em conta que esta política está a infernizar a vida de milhões de portugueses».



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