Resistência com frutos
As manobras dos patrões das cadeias Pingo Doce e Continente para romperem a tradição e desrespeitarem o simbolismo do 1.º de Maio não tiveram reflexo no funcionamento das lojas.
O 1.º de Maio é feriado nacional desde 1974
A maior parte das empresas da grande distribuição não seguiu a orientação da associação patronal (APED) e encerrou as portas neste Dia Internacional dos Trabalhadores. O Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços (CESP/CGTP-IN) congratulou-se que tenham tomado tal opção o Grupo Auchan (Jumbo e Pão de Açúcar), El Corte Inglés, Lidl, Aldi, Dia-Minipreço, Ikea, Supercoor, Office Center, IZI, Alisuper e Leroy Merlin. «Os habituais incumpridores e relapsos», onde o sindicato inclui «muitas lojas Intermarché, Ecomarché e E-Leclerc, tiveram a companhia dos dois grandes grupos que dominam na Direcção da APED: o Continente (presidente) e o Pingo Doce (vice-presidente).
Estas duas cadeias de super e hipermercados «estão a funcionar com os mínimos», recorrendo a trabalhadores com vínculos precários ou aliciando-os com contrapartidas, cujo efeito assenta nos baixos salários praticados (caso do pagamento, com um acréscimo de 200 por cento e com um dia de descanso, do trabalho realizado no feriado nacional que apenas foi conquistado com a revolução de Abril de 1974). Mesmo assim, o sindicato verificou que havia «muito poucos clientes e poucas vendas».
No próprio dia 1 de Maio, o sindicato denunciou alguns casos graves – ameaças de processos disciplinares, de faltas injustificadas e de não renovação de contratos a prazo, alterações apressadas de horários, substituição ilegal de trabalhadores – em estabelecimentos Pingo Doce no distrito de Aveiro.
Para o feriado, o sindicato apresentou um pré-aviso de greve neste sector. Em várias unidades, foram organizados piquetes e realizadas acções com impacto público. No distrito de Lisboa, tal aconteceu em lojas Continente/Modelo (Vasco da Gama, Alverca, Tires e Alfragide), Pingo Doce (Av. 5 de Outubro, Algés e Venda Nova) e Intermarché (Póvoa de Santa Iria). Em Braga, uma delegação da CDU expressou solidariedade ao piquete de greve no Continente.
À agência Lusa, uma «fonte oficial» do Grupo Jerónimo Martins (Pingo Doce) admitiu «algumas falhas pontuais» em estabelecimentos «por todo o País».
Foi o grupo proprietário da cadeia Pingo Doce que mais se destacou nos esforços para pôr termo ao encerramento no 1.º de Maio. O sindicato divulgou uma «comunicação interna» e uma «informação aos nossos clientes», em que a empresa anunciou e procurou justificar a decisão. Dos documentos ressalta o contraste entre o seu conteúdo e o que se passa no dia-a-dia: «Para tirar o dia 1.º de Maio aos trabalhadores, eles dão um dia adicional de folga, a eterna gratidão pela colaboração e até compreendem e partilham a carga emocional desta data histórica», enquanto «no dia-a-dia esquecem o cumprimento das normas e regras legais quanto a horários e pagamento do trabalho suplementar» e «colocam a chefia a pressionar os trabalhadores para aderirem» ao regime de 12 horas por dia e 60 por semana, acusa o CESP.
Travar a selvajaria
O sindicato revelou que, reagindo aos anúncios da APED e das empresas, os presidentes das câmaras municipais de Braga (a 27 de Abril) e de Setúbal (no dia 29) determinaram o encerramento da grande distribuição no 1.º de Maio. «As câmaras municipais podem contribuir, se quiserem, para regular e disciplinar a selvajaria que o capitalismo está a querer reinstalar em Portugal», comentou o CESP.
«A actual situação é inseparável da legislação aprovada na AR por PS, PSD e CDS», recorda o presidente do Conselho Directivo da Associação de Municípios da Região de Setúbal, numa mensagem de solidariedade divulgada a 29 de Abril. Defendendo que o 1.º de Maio «deve ser respeitado pelo seu significado histórico, resultante da luta de várias gerações de trabalhadores e consagrado legalmente», Alfredo Monteiro refere que «estão em elaboração, em diversos concelhos, os regulamentos decorrentes das competências das autarquias no âmbito do referido quadro legal», os quais «vão no sentido de repor as limitações do regime anterior aos horários de abertura das grandes superfícies comerciais».
«Valeu a pena a interpelação» da CDU, que foi «causa directa da decisão do presidente», congratulou-se a coligação PCP-PEV do concelho de Braga. É que a câmara «nem sequer sabia» que o Pingo Doce e o Continente pretendiam abrir no 1.º de Maio, quando o eleito da CDU interpelou o vice-presidente do executivo, numa reunião realizada na noite de 26 de Abril. Por outro lado, na nota divulgada dia 28 considera-se «lamentável» que o presidente e a maioria PS não determinem também o encerramento das grandes superfícies aos domingos e feriados, a partir das 13 horas – como a CDU tem defendido e como reclamaram cerca de 400 trabalhadores do sector, em abaixo-assinado.