Marcha da vitória
Dois milhões de pessoas voltaram a ocupar, dia 18, a Praça Tahrir, no Cairo, para assinalar a primeira semana do derrube do presidente Mubarak e exigir à Junta Militar a concretização das prometidas reformas democráticas.
O proletariado egípcio prossegue a luta por transformações revolucionárias
Os manifestantes prestaram homenagem aos 365 combatentes caídos nos confrontos com a polícia, ao longo dos 18 dias do levantamento popular contra ao regime opressor, e reafirmaram a sua determinação de lutar por uma efectiva democratização do país.
O fim do estado de emergência, a libertação do presos políticos, a formação de um governo provisório são exigências que unem todas as forças democráticas até agora sem reconhecimento legal.
No poder, os militares protelam a satisfação das reivindicações populares fundamentais, procurando controlar a situação através uma mistura de ameaças e apelos à ordem e promessas de revisão da Constituição, com um referendo dentro de dois meses e eleições legislativas e presidenciais dentro de seis.
Para acalmar a indignação popular, suscitada pelo facto de o governo em funções ser praticamente idêntico ao nomeado por Mubarak, os militares comunicaram a detenção de três ex-governantes odiados pelo povo: o ex-ministro do interior, Habib el Adli, acusado de branqueamento de dinheiro, e os ex-titulares do Turismo e da Habitação, Zoheir Garranah e Ahmad el Maghrabi, presos por desvio de fundos. Também o magnata do aço, Ahmed Ezz, secretário do Partido Nacional Democrático de Mubarak, foi detido pelas autoridades.
Apesar de aparentemente se manter a aliança entre o exército e o movimento popular, estabelecida durante o levantamento quando o primeiro se recusou a disparar sobre os manifestantes, as dúvidas acerca dos reais objectivos e vontade da Junta Militar aumentam a cada dia que passa.
Em entrevista ao El País (20.02), o próprio, Mohamed el Baradei, antigo director da Agência Internacional de Energia Atómica e próximo dos EUA, observou que «as pessoas começam a recear que [os militares] estejam a travar a revolução e a limitem a mudanças cosméticas».
Porém, perguntado sobre se «será uma revolução inacabada», El Baradei responde: «Não. Quando se sente a liberdade, não há marcha-atrás. As pessoas perderam o medo e voltarão a encher as ruas. É preciso dar credibilidade ao que os militares estão a fazer. Isto é o fim de um regime e o início de uma nova etapa, mas têm que libertar-se das velhas atitudes».
Proletariado em luta
Entretanto, os 24 mil operários da fábrica de fiação e tecelagem Misr Spinning and Weaving, uma das maiores unidades produtivas do país situada em Mahalla Al Kubrano, no Delta do Nilo, suspenderam, no domingo, 20, uma greve iniciada há dez dias em apoio às manifestações contra o regime.
Os operários, que estavam concentrados frente ao edifício da administração desde quarta-feira, 16, mantiveram a paralisação por aumentos salariais e a melhoria das condições de trabalho mesmo depois de a Junta Militar ter avisado, dia 18, que as greves não seriam toleradas por «motivos de segurança nacional».
O regresso ao trabalho só se efectuou após terem conseguido um aumento de 25 por cento e o saneamento da administração acusada de corrupção. Neste processo, os operários constituíram um novo sindicato, desvinculando-se da Federação Sindical Egípcia (ETUF), ligada ao governo, e aderindo à nova Federação Egípcia de Sindicatos Independentes, cujo embrião foi constituído em 30 de Janeiro.
Já em Setembro de 2007, os operários da Misr tinham desafiado o regime, realizando uma greve de seis dias que lhes permitiu obter não só o aumento das remunerações mas também a demissão do administrador.
Em Fevereiro do ano seguinte voltaram a manifestar-se nas ruas exigindo o aumento do salário mínimo e contestando o presidente e o seu filho que se preparava para sucedê-lo.
Face à convocação de nova greve na Misr, em 6 de Abril de 2008, as forças policiais intervieram na fábrica e ocuparam a cidade de Mahalla. O movimento é reprimido. A polícia faz centenas prisões, abatendo dois jovens e ferindo dezenas de manifestantes. Foi em solidariedade com a corajosa sublevação dos operários da Misr que surgiu na Internet o Movimento de Juventude 6 de Abril, um dos organizadores das manifestações iniciadas no Cairo em 25 de Janeiro, que forçariam a saída de Mubarak no dia 11.