Degradação e precariedade
O PCP acusou o Governo de difundir a ideia de que tudo vai bem no mundo da Ciência e Tecnologia e de a utilizar como cortina de fumo para esconder uma realidade marcada pela degradação dos laboratórios do Estado e pela precariedade laboral dos investigadores.
Investigadores estão sujeitos à precariedade
O tema foi levado a plenário pelo deputado comunista Miguel Tiago em declaração política proferida faz hoje oito dias. Nela ressaltou sobretudo esse desmentido à propaganda veiculada pelo Governo de que o nosso País está na vanguarda da política de Ciência e Tecnologia.
«Nada mais falso», garantiu o parlamentar do PCP, considerando que o «Sistema Científico e Tecnológico Nacional está sujeito às mesmas consequências de uma política de direita que privilegia a concentração dos lucros e a privatização de funções centrais do Estado, sacrificando o desenvolvimento nacional, justo e equilibrado».
Um dos exemplos apontados desta política desastrosa é a postura de mãos largas do Governo e do ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior para com instituições privadas estrangeiras, a quem dá milhões, privilegiando em simultâneo laboratórios privados e «limitados nichos ditos de excelência», enquanto, em paralelo, deixa à penúria o ensino superior e os laboratórios do Estado, a braços com um financiamento cada vez mais insuficiente.
Que não é bem assim, replicou o deputado do PS Manuel Mota, insistindo em dizer que Portugal tem «mais investigadores, mais investigação em ciência e tecnologia, o dobro das publicações científicas».
O que se esqueceu de dizer - e foi também isso que Miguel Tiago tratou de lembrar – é que os bolseiros de investigação científica, investigadores precários contratados a prazo no âmbito dos Programas Ciência, são em muitos casos forçados – como aliás os próprios investigadores de carreira – a desempenhar todo o tipo de tarefas nas instituições onde trabalham, sobrando-lhes cada vez menos tempo para a Investigação, uns e outros sujeitos à instabilidade e à precariedade.
Ora para o Governo, «todos esses homens e mulheres qualificados, mas sem direitos, sem perspectivas de futuro, sem estabilidade laboral e profissional, contam para engrossar os números da falsificação estatística», sublinhou o deputado do PCP, desmontando assim o artifício estatístico que suporta o discurso apologético da acção governativa.
Em nota final sobre a acção do Governo, pondo a nu a sua falência, Miguel Tiago questionou se o País está hoje mais dinâmico nalgum sector produtivo, se existe alguma política de I&D estruturada e orientada para o desenvolvimento económico ou se o «programa mobilizador e o Livro Branco, anunciado e nunca apresentado», tiveram algum efeito no reforço dos laboratórios do Estado. A resposta foi um rotundo não.
Realidade chocante
A merecer a atenção de Miguel Tiago estiveram as condições de trabalho dos investigadores, «sem acesso a equipas técnicas de apoio», bem como dos laboratórios do Estado, «sem os meios de trabalho adequados».
Dado como exemplo foi o caso do LNEG, onde a administração decidiu «renovar os seus carros de luxo e gastar 100 mil euros em soalho flutuante (para o piso administrativo) enquanto a frota de trabalho jaz abandonada nas traseiras do Laboratório e falta verba para as mais elementares tarefas de investigação».
Citado foi também o Laboratório Nacional de Investigação Veterinária, onde os investigadores são forçados a fazer eles próprios as necropsias a porcos e outros animais porque não existem técnicos que as façam.
No Instituto Tecnológico e Nuclear, depois de privado de água canalizada devido à vetusta idade das tubagens e equipamentos associados, «tem agora cortadas as linhas telefónicas por falta de pagamento desde 6 de Setembro».
Miguel Tiago, sobre este caso, não escondeu a sua inquietação por se tratar de um instituto onde funciona um reactor nuclear, sendo absurdo que possa estar sem água e sem telefone.
Na Faculdade de Ciências da UL, por seu lado, apenas um técnico executa a preparação de lâminas geológicas para todo o departamento de Geologia e mesmo para outras instituições do país.
Estes são exemplos concretos de uma realidade que tem, em pano de fundo, a precariedade a que estão sujeitos os investigadores, muitos deles sem contrato de trabalho, sem direitos laborais, «mesmo quando têm de ser simultaneamente técnicos e investigadores, mesmo quando são obrigados a dar aulas em universidades sem remuneração, mesmo quando têm que adiantar dinheiro do seu bolso e ficar meses à espera do reembolso».