Comentário

Tratado de Lisboa e suas consequências

Ilda Figueiredo
Vai entrar em vigor já na próxima semana, início de Dezembro, o chamado Tratado de Lisboa, culminando todo um percurso de luta política, de pressões e chantagens, designadamente sobre o povo da Irlanda, visando a alteração do voto no segundo referendo ali realizado recentemente.
É um importante e grave aprofundamento da integração capitalista, militarista e federalista da União Europeia, o que significa insistir em políticas que estão na origem da crise que vivemos, tornando ainda mais premente e mais exigente a luta por uma ruptura com estas políticas.
Neste momento, vale a pena recordar que este tratado tem por base a dita «constituição europeia», com alguns ligeiros retoques, a que foram obrigados depois da sua rejeição nos referendos em França e na Holanda, em 2005.
Foi em 2007, durante a presidência portuguesa, que o primeiro-ministro José Sócrates deu seguimento ao guião elaborado pela anterior presidência alemã e fez aprovar, em Lisboa, o projecto de tratado a que deram o nome de Lisboa. Pelo caminho caiu a promessa de um referendo em Portugal sobre o novo tratado.
A sua entrada em vigor chegou a ser anunciada para o início de 2009, mas a derrota no referendo da Irlanda e as dificuldades nalguns países atrasaram todo o processo e obrigaram a algumas novas declarações de intenções relativamente ao futuro por parte do Conselho. Foram, além da Irlanda, os casos conhecidos da Polónia e da República Checa, o que obrigou a vários compromissos do Conselho relativamente à promessa de novas alterações ao Tratado que agora entra em vigor, mas a realizar apenas quando a Croácia ou outro país aderir à União Europeia.
Claro que qualquer nova alteração implica nova ratificação. Assim, o que agora entra em vigor é o Tratado de Lisboa tal como foi aprovado em 2007 e, posteriormente ratificado pelos 27 estados-membros.

Salto da integração capitalista

São muitas e graves as implicações deste novo documento, embora, no imediato, sejam mais visíveis as questões institucionais que implicam novos cargos: Presidente do Conselho e Alto Representante para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, e que, no fundamental, tentam pôr fim às presidências rotativas que ainda significavam o respeito pelo princípio de estados soberanos e iguais em direitos.
Mas há outras alterações muito profundas que resultam, desde logo, da atribuição de personalidade jurídica à União Europeia, o que, no curto prazo, vai levar à criação do serviço europeu para a acção externa, através da criação de mais de 130 embaixadas, com cerca de seis mil funcionários. Será uma nova realidade sob a direcção do Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, que tenderá a beneficiar sobretudo os países mais poderosos, os quais poderão influenciar e aumentar as pressões e ingerências externas por duas vias: as embaixadas da União Europeia e as suas próprias embaixadas.
Embora ainda não se saiba quais os objectivos prioritários deste serviço europeu para a acção externa, conhece-se pressões que visam incluir aqui questões militares, de defesa e segurança, aspectos comerciais e a política de desenvolvimento, o que tenderá a subalternizar ainda mais a política de cooperação e desenvolvimento.
Aliás, o que aparece desenvolvido no Tratado de Lisboa é o reforço claro do militarismo, seja quando afirma que «com vista à execução comum da segurança e defesa, os estados-membros colocam à disposição da União capacidades civis e militares de modo a contribuir para os objectivos definidos pelo Conselho» e que a política da União «respeitará as obrigações decorrentes da NATO», comprometendo-se ainda os Estados-Membros a «melhorar progressivamente as suas capacidades militares», seja quando cria a denominada Agência Europeia de Defesa, a qual terá um papel importante nesse reforço.
Por último, uma referência ao aumento das decisões por maioria em áreas importantes da soberania nacional, a diminuição do peso dos pequenos e médios países no Conselho, o aumento das decisões por co-decisão com o Parlamento Europeu onde os seis maiores países têm mais de metade dos deputados, a comunitarização das políticas na área da justiça, das liberdades e imigração, incluindo o processo de Estocolmo, com sérias implicações na legislação nacional e graves consequências na subalternização do nosso País em todos estes processos, para já não falar, por exemplo, da competência exclusiva da União Europeia na área dos recursos de pesca no âmbito da respectiva política comum.
Assim, impõe-se não só dar a maior atenção à gravidade deste salto na integração capitalista, federalista e militarista da União Europeia, como intensificar a luta por uma ruptura indispensável com estas políticas.


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