«Três segundos»
O episódio envolveu directamente José Sócrates, ocorreu na Freguesia do Coração de Jesus, em Lisboa, onde o primeiro-ministro exerceu o seu voto para as eleições europeias, e foi parcialmente registado pelas televisões no passado domingo, quando todos os canais se afadigaram a dar o melhor ângulo do momentoso acto.
O que ficou registado pelas câmaras - e o País pôde abundantemente ver - foi um José Sócrates, ainda muito sorridente, a entregar o boletim, a cumprimentar os membros das mesas e, já na rua, a explicar prazenteiramente ao jornalista, que o questionara sobre as dificuldades que os eleitores estavam a ter com o Cartão de Cidadão (onde o número de eleitor não está visível, o que obrigava os votantes a recorrer à Junta de Freguesia que, no improviso de um telefonema, ia informando caso a caso):
«É muito simples, as pessoas devem fazer como eu fiz!». E Sócrates explicava como fizera: pelo telemóvel, enviara uma mensagem para o número 3838 com o seu número de BI e a sua data de nascimento e, «passados três segundos», recebera de volta a indicação da assembleia de voto e do número de eleitor.
E sorria largamente, após tão peremptória demonstração da eficácia «simplex» do seu estremecido «Cartão de Cidadão».
O que não ficou registado foi a outra parte da história.
Fique, então, o País a saber que 15564 é o número de eleitor do primeiro-ministro, inscrito na penúltima página do caderno eleitoral da 4.ª secção de voto da Freguesia do Coração de Jesus, onde votou o cidadão José Sócrates Pinto de Sousa – e pela primeira vez, apesar de ser há vários anos morador no Edifício Heron Castilho, na supracitada Freguesia.
Talvez por isto não ter qualquer importância – a não ser, eventualmente, para o eleitor Pinto de Sousa, durante um acto eleitoral – acontece que José Sócrates não fez tudo o que afirmou ter feito: o que efectivamente fez foi apresentar-se na mesa de voto apenas com o Cartão de Cidadão, sem telemóvel e ignorando o seu próprio número de eleitor, valendo-lhe a simpática disponibilidade da mesa e dos escrutinadores que, sabendo de antemão de tão ilustre votante, já tinham averiguado o seu número e lugar nos cadernos eleitorais.
Pelo que as também supracitadas informações eleitorais sobre José Sócrates não as deu o próprio – que nem as conhecia, apesar de possuir o Cartão do Cidadão e o famoso acesso por telemóvel –, mas um dos membros, que a tudo assistiu e tudo isto conta no blogue da CDU da Freguesia do Coração de Jesus.
Este episódio insignificante torna-se grotescamente revelador, ao evidenciar a facilidade com que José Sócrates manipula os factos e as situações e o despudor com que mistura realidade e ficção, quando pretende organizar argumentações políticas.
Neste caso, quis menorizar os evidentes problemas causados no processo de votação pelo seu moderno e simpático Cartão de Cidadão, tentando mostrar que a falha pode ser resolvida «em três segundos». Para isso, não hesitou em contar ao País apenas metade da sua exemplar história.
Esperemos que não lhe dê para também se gabar da facilidade em se obter o tal Cartão de Cidadão. É que está a milhas dos gloriosos «três segundos»: só para o pedir, são necessárias longas horas de espera, e para o levantar, várias tentativas até se chegar ao balcão na ponta de bichas que, interminavelmente, vão passando para o dia seguinte. E olhem que sei do que é que estou a falar – e por experiência própria.
O que ficou registado pelas câmaras - e o País pôde abundantemente ver - foi um José Sócrates, ainda muito sorridente, a entregar o boletim, a cumprimentar os membros das mesas e, já na rua, a explicar prazenteiramente ao jornalista, que o questionara sobre as dificuldades que os eleitores estavam a ter com o Cartão de Cidadão (onde o número de eleitor não está visível, o que obrigava os votantes a recorrer à Junta de Freguesia que, no improviso de um telefonema, ia informando caso a caso):
«É muito simples, as pessoas devem fazer como eu fiz!». E Sócrates explicava como fizera: pelo telemóvel, enviara uma mensagem para o número 3838 com o seu número de BI e a sua data de nascimento e, «passados três segundos», recebera de volta a indicação da assembleia de voto e do número de eleitor.
E sorria largamente, após tão peremptória demonstração da eficácia «simplex» do seu estremecido «Cartão de Cidadão».
O que não ficou registado foi a outra parte da história.
Fique, então, o País a saber que 15564 é o número de eleitor do primeiro-ministro, inscrito na penúltima página do caderno eleitoral da 4.ª secção de voto da Freguesia do Coração de Jesus, onde votou o cidadão José Sócrates Pinto de Sousa – e pela primeira vez, apesar de ser há vários anos morador no Edifício Heron Castilho, na supracitada Freguesia.
Talvez por isto não ter qualquer importância – a não ser, eventualmente, para o eleitor Pinto de Sousa, durante um acto eleitoral – acontece que José Sócrates não fez tudo o que afirmou ter feito: o que efectivamente fez foi apresentar-se na mesa de voto apenas com o Cartão de Cidadão, sem telemóvel e ignorando o seu próprio número de eleitor, valendo-lhe a simpática disponibilidade da mesa e dos escrutinadores que, sabendo de antemão de tão ilustre votante, já tinham averiguado o seu número e lugar nos cadernos eleitorais.
Pelo que as também supracitadas informações eleitorais sobre José Sócrates não as deu o próprio – que nem as conhecia, apesar de possuir o Cartão do Cidadão e o famoso acesso por telemóvel –, mas um dos membros, que a tudo assistiu e tudo isto conta no blogue da CDU da Freguesia do Coração de Jesus.
Este episódio insignificante torna-se grotescamente revelador, ao evidenciar a facilidade com que José Sócrates manipula os factos e as situações e o despudor com que mistura realidade e ficção, quando pretende organizar argumentações políticas.
Neste caso, quis menorizar os evidentes problemas causados no processo de votação pelo seu moderno e simpático Cartão de Cidadão, tentando mostrar que a falha pode ser resolvida «em três segundos». Para isso, não hesitou em contar ao País apenas metade da sua exemplar história.
Esperemos que não lhe dê para também se gabar da facilidade em se obter o tal Cartão de Cidadão. É que está a milhas dos gloriosos «três segundos»: só para o pedir, são necessárias longas horas de espera, e para o levantar, várias tentativas até se chegar ao balcão na ponta de bichas que, interminavelmente, vão passando para o dia seguinte. E olhem que sei do que é que estou a falar – e por experiência própria.