Empresas aproveitam a «crise global»

Os dramas e a «poeira»

Há inúmeros casos em que os despedimentos, as suspensões de laboração e os atrasos no pagamento de salários estão a ser usados para objectivos que nada têm a ver com problemas financeiros.

Só a luta consegue travar o aumento da exploração

Nas notícias que, em catadupa, relatam os efeitos da crise no nosso país, existem casos de dificuldades reais, com causas e responsáveis identificados e com soluções exigidas pelos trabalhadores e as suas organizações de classe, mas negadas por quem tem o poder económico e também o político. Mas, em muitas situações, os argumentos patronais são colocados em dúvida e contestados. A inquietação e instabilidade geradas em milhares de trabalhadores são aproveitadas pelas empresas para agravar as condições de trabalho ou, até, para justificar deslocalizações, na busca de maiores e mais rápidos lucros.
Nesse sentido alertou anteontem Jerónimo de Sousa, quando esteve na Autoeuropa (depois de se congratular pelo «avanço», mas também «contrato a prazo», que significa a garantia, dada pela administração, de que não irá haver despedimentos até 2010 na unidade portuguesa da Volkswagen). «Hoje, o capital internacional não tem nenhum prurido em ganhar lucros fabulosos, conseguir incentivos nacionais e comunitários, e depois alçar a tenda e partir para outro país», acusou o secretário-geral do PCP. Em declarações aos jornalistas, durante uma iniciativa da campanha «Sim, é possível uma vida melhor», defendeu que «devia existir um esforço, por parte dos governos nacionais e da União Europeia, para impedir e cadastrar estas empresas, que acabam por deixar atrás de si um rasto de miséria, com o país a ter de pagar as consequências».
De manhã, numa visita à EMEF, no Barreiro, durante a qual foi instado a comentar a situação na Qimonda, Jerónimo de Sousa tinha já criticado os accionistas que, durante anos, vão arrecadando lucros e que, quando surgem as dificuldades, se escusam a assumir as suas responsabilidades nas empresas.
Um dirigente do Sinorquifa/CGTP-IN, citado pela agência Lusa, lamentou na semana passada que a Diehl Elastómeros, de Vila do Conde, à semelhança do que está a acontecer noutras empresas do sector, «se esteja a aproveitar da crise para emagrecer o quadro de trabalhadores». A fábrica da multinacional alemã iniciou um processo de dispensa, até Março, de meia centena de pessoas, apresentando justificações que «não convencem quem ali continua», como disse um operário, sob anonimato.
O despedimento de 177 dos 300 trabalhadores da Ecco'let, em Santa Maria da Feira, também não pode ser justificado pela crise. Segundo o Sindicato do Calçado de Aveiro e Coimbra, a fábrica da multinacional dinamarquesa (que desde 2003 já despediu centenas de operários) tem trabalho, mas o grupo terá decidido deslocalizar a produção para a Indonésia, Tailândia e China, como uma dirigente sindical disse sexta-feira à Lusa. Nesse mesmo dia, a empresa veio esclarecer que «tem aumentado a diferença de custos entre as grandes fábricas da Ecco além-mar e a pequena unidade produtiva em Portugal»...
No Cartaxo, a Fleximol colocou 73 dos seus 154 trabalhadores em lay-off (suspensão de contratos), desde o início deste mês e por seis meses. Mas um dirigente sindical metalúrgico, que segunda-feira acompanhou o líder parlamentar do PCP num encontro com muitos daqueles operários, manifestou estranheza pelo facto de a empresa estar agora a recorrer a trabalho suplementar.
Na Peugeot-Citroën, em Mangualde, a suspensão da laboração, iniciada sexta-feira para se prolongar até 5 de Fevereiro, deixará sem emprego cerca de 500 trabalhadores, entre temporários, contratados a prazo e efectivos. Um dirigente do Sindicato dos Metalúrgicos disse à Lusa que muitos foram «empurrados» para rescindirem. Não se sente, ali, os efeitos dos anunciados apoios do Governo ao sector automóvel, criticou o representante dos trabalhadores.
A Tyco, em Évora, no início do mês, anunciou que pretendia suspender, por seis meses, o contrato a 536 trabalhadores (um terço do pessoal). O SIESI/CGTP-IN protestou e colocou em causa a justificação da medida e a sua dimensão. A empresa acabou por reduzir o número de pessoas a suspender, para 346, mas o sindicato estranha que estejam abrangidas pelo lay-off pessoas com muitos anos de casa. Esperando que não seja este o caso, um dirigente do sindicato explicou ao Diário Económico (dia 21) que «muitas vezes são tomadas estas decisões para se poderem libertar os trabalhadores com mais antiguidade».


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