Papel de embrulho

Vasco Cardoso
Durante cerca de uma hora, no final de tarde de cada sexta-feira, vai para o ar na Antena1 um programa de debate cujo nome, «Contraditório», dificilmente poderia estar mais distante do espírito de concórdia e compromisso que marca o diálogo entre Luís Delgado, João Barreiros, Ana Sá Lopes e Carlos Magno sobre temas da actualidade e que, em regra, se fica por uma reafirmação mais ou menos criativa de tudo aquilo que se disse e escreveu ao longo da semana por cada um dos «comentadores» de serviço dos principais órgãos de comunicação social. Melhor ainda, pela repetição daquilo que cada um deles disse e escreveu nos últimos dias, uma vez que a sua presença também é assídua noutras paragens que não apenas a rádio pública.
Pode-se dizer no entanto que se aproveita sempre algo do que se ouve em tal programa, mais não seja, para melhor compreensão – mesmo que vá alguma distância entre o que dizem e o que pensam – da grelha de análise em que os centros de decisão políticos e económicos estão concentrados.
Esta referência vem a propósito da pertinente observação aí realizada, sobre a «fixação e o fascínio» que, cada um à sua maneira, Santana Lopes do PSD e Manuel Alegre do PS exercem sobre os órgãos de comunicação social, mesmo que em muitas das suas intervenções, iniciativas ou até omissões aquilo que prevaleça seja a retórica.
Duas personalidades que, parecendo ter vida própria à margem dos partidos a que pertencem, na verdade fazem parte de tudo aquilo que de mais essencial se realizou na vida do PSD e do PS nas últimas décadas, incluindo nas pesadas responsabilidades que sobre cada um cai na condução da política de direita no nosso país. Isto, naturalmente, numa semana em que um foi anunciado como candidato do PSD à Câmara Municipal de Lisboa, o que não deixa de ter qualquer coisa de trágico e cómico tendo em conta o que esta criatura já fez à frente deste município, e o outro se tenha apresentado na Aula Magna ao lado dos não menos mediáticos dirigentes do BE, na tal iniciativa que tem o atrevimento de se apresentar em nome da «esquerda», excluindo o PCP.
O «Contraditório» da semana passada era então uma espécie de balanço do ano que agora termina e de prenúncios para o que se anuncia, pelo que, não andaremos longe da verdade se o tal «fascínio» e «fixação» a que se referiram se prolongasse por 2009 adentro, ou a promoção de Santana e Alegre não obedecesse, cada um à sua maneira, aos mesmos objectivos e interesses que têm dominado o país, com o resultado que se vê.


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