Crise sobre rodas

Martha Grevatt
Na semana de 17 de Novembro, os administradores executivos (CEOs) da General Motors, Ford e Chrysler, juntamente com o presidente da United Auto Wokers [o sindicato, UAW] Ron Gettelfinger, testemunharam perante o Congresso a necessidade de um balão de oxigénio do governo dos EUA para a indústria automóvel. Pediram 25 mil milhões dos 700 mil milhões de dólares do Programa de Recuperação de Fundos Ameaçados (TARP, na sigla inglesa).
Sem ajuda, asseguraram, uma ou mais das suas companhias irão à falência, provavelmente antes do final do ano. Esta situação ameaça 200 000 trabalhadores da indústria automóvel nos EUA e cerca de 700 000 que produzem componentes para veículos. Há quem afirme que 2,5 milhões de postos de trabalho podem desaparecer se um dos «Três Grandes» falir.
O secretário do Tesouro Henry Paulson recusou a proposta. Argumentou que o dinheiro foi disponibilizado para os bancos – que ele representa. Falando em nome do seu partido, o senador republicano Spencer Bachus declarou: «os meus eleitores não compreenderiam que os seus impostos fossem canalizados para apoiar negócios pouco eficientes».
O senador democrata Christopher Dodd, presidente do comité do Senado para acompanhamento das instituições financeiras, propôs que as companhias declarassem primeiro a bancarrota antes de receberem ajuda do TARP.
Por fim, o Congresso instou os CEOs a apresentar um plano até 2 de Dezembro, explicando como seriam usados os milhares de milhões de dólares e demonstrando a viabilidade das empresas a longo prazo e a sua capacidade para pagar o empréstimo.
Rick Wagoner da GM, Alan Mulally da Ford, e Bob Nardelli da Chrysler estão todos bem protegidos pelos seus elevados salários de executivo, jactos privados e outras mordomias, mas o verdadeiro alvo do compromisso bipartidário era o sindicato. A carta assinada pela presidente do Senado, Nancy Pelosi, e pelo líder da maioria, Harry Reid, pedindo «grandes sacrifícios e profundas mudanças na forma de fazer negócio» (Detroit News, 21 de Novembro) exige na verdade mais cedências por parte dos trabalhadores.
Quando interrogada sobre a UAW, Pelosi disse: «penso que toda a gente tem de participar para garantir a viabilidade da indústria automóvel» (Detroit Free Press, 22 de Novembro). Os colunistas da imprensa, de Detroit a Washington, têm como alvo o sindicato. Daniel Howes, ao serviço do Detroit News, atacou o presidente da UAW Ron Gettelfinger por insistir que o sindicato não faria mais concessões na tabela para 2010.
O ideólogo conservador George Will quer que as companhias declarem bancarrota para poderem destruir «os contratos de trabalho imprevidentes» (Washington Post, 18 de Novembro).
O primeiro alvo seria o que é conhecido como «banco de emprego». Desde 1990, o banco de emprego garante em certa medida uma segurança aos trabalhadores da indústria automóvel que de outra forma seriam despedidos. No «banco» realizam trabalho «não convencional», frequentemente para obras sociais, e recebem 40 horas de pagamento. Isto foi originalmente uma concessão por parte do sindicato. Este esquema permitia às empresas eliminar postos de trabalho «tradicionais» através do recurso à alta tecnologia quando os contratos impediam o layoff. Quando um contrato de três ou quatro anos cessa, os trabalhadores no banco de emprego deixam de estar protegidos. Ainda que de uma forma mitigada, o banco de emprego protegia os direitos dos trabalhadores. Agora o banco de emprego é apresentado como «um símbolo do excesso e da ineficácia» (Detroit Free Press, 22 de Novembro).
Actualmente, as três companhias têm em conjunto 3500 trabalhadores no «banco», mas este número pode aumentar. Os trabalhadores contratados vão para o «banco de emprego» após 48 semanas de layoff.
Os meios de comunicação dominantes tentam responsabilizar os trabalhadores da indústria automóvel pela crise, dizendo que são pagos em excesso. A realidade é justamente ao contrário. As pessoas deixaram de comprar carros por duas razões: elevado desemprego e baixos salários. Ambas são o resultado final da política capitalista para aumentar os lucros baixando o preço da mão-de-obra através da redução do número de horas necessárias para a fabricação do produto – o que dá origem ao layoff – ou baixando os custos por via dos salários e benefícios. Estas medidas levam à perda do poder de compra dos trabalhadores. Cada vez mais trabalhadores deixam de poder pagar a hipoteca da casa, o empréstimo do carro e os cartões de crédito.
A destruição deliberada da tabela salarial negociada com o sindicato levou a economia capitalista a um excesso de produtos que apenas alguns podem comprar, mesmo a crédito. A indústria automóvel vive o pico mais baixo de vendas dos últimos 25 anos e os trabalhadores pagam agora o preço com a perda dos seus postos de trabalho.
Está para se ver se as três companhias serão salvas da insolvência. Completamente fora do debate está a noção de que o emprego, a saúde, a segurança na terceira idade não são luxos mas direitos básicos dos trabalhadores. O que é central agora para a UAW é saber como se reestruturar a si própria para se tornar de novo num motor de luta capaz de impor o direito dos seus associados ao trabalho.

(*) Martha Grevatt trabalhou 21 anos na Chrysler e é dirigente sindical da UAW


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