O preço a pagar
Na última sessão plenária do Parlamento Europeu, em Estrasburgo, foi discutido e aprovado um relatório sobre o aumento do preço dos géneros alimentícios na UE e nos países em desenvolvimento. Alguns elementos desta resolução ilustram bem o carácter desta União Europeia, do seu rumo e, acima de tudo, do cinismo do capital perante a miséria e desgraça humanas e a subserviência dos governos aos interesses do lucro.
Sobre os números relativos aos preços dos produtos de base, o texto regista: aumentos dos preços mundiais do trigo na ordem dos 181%, nos últimos 3 anos, 141% para o arroz desde Janeiro deste ano e um aumento generalizado de 83% nos preços mundiais dos alimentos. No dia a dia, constatamos estes aumentos (e outros!) em Portugal: 74% no preço do leite, 71% no arroz, 36% nos óleos, 34% nas massas, 34% nas farinhas, 24% nos ovos, entre outros.
Verdadeiramente intrigante é o facto de a UE manifestar preocupação com estes aumentos e inclusivamente apontar algumas das suas causas (o aumento da especulação com produtos de base agrícolas e alimentares; a utilização de parte da produção para a alimentação animal e a produção de agrocombustíveis; a não realização, por parte dos países em desenvolvimento, do «seu potencial de produção alimentar») e ao mesmo tempo manter as suas políticas efectivas, nomeadamente a PAC, ou as propostas que defende em patamares internacionais determinantes como a Organização Mundial do Comércio, em que a alimentação é tratada como mais uma mera mercadoria.
«Lágrimas de crocodilo»
A resolução reflecte sobre «o direito à alimentação», desfiando o conjunto de compromissos internacionais na área da erradicação da pobreza e da fome – e que sempre ficam na gaveta na hora de tomar medidas concretas e possíveis para uma justa distribuição dos recursos à escala mundial. Debruça-se também sobre a «produção alimentar sustentável», revelando um pouco mais o seu descaramento ao reforçar as questões da regulamentação interna dos mercados agrícolas e a necessidade de manter a PAC.
A famigerada Política Agrícola Comum, a que sucessivos governos portugueses juraram fidelidade sacrificando uma parte fundamental do aparelho produtivo nacional, tem votado à pobreza milhares de agricultores e suas famílias, destruiu muitos milhares de explorações agrícolas, levou ao abandono de terras e desertificação e a uma política de subsídios desligada da produção, que favorece os grandes produtores.
O resultado só poderia ser a dependência alimentar do exterior e o emprobrecimento de largas camadas da população – duas condições que agora fazem verter lágrimas de crocodilo às instâncias europeias.
Primeiro, impõem-se regras demolidoras para um sector e um país, depois, lamenta-se a falta de reservas cerealíferas (as da UE não chegariam para mais de 30 dias, constata a dita resolução). Alvitra-se a possibilidade da especulação dos retalhistas prejudicar produtores e consumidores, admite-se que a subvenção de culturas para agrocombustíveis já não se justifica (sem, no entanto, abdicar dos objectivos traçados anteriormente), regista-se com apreensão a subida do custo da alimentação animal. Mas apesar de se reconhecer todas as dificuldades, insiste-se nas mesmas orientações e no mesmo rumo.
Tragédia humanitária
Outro foco desta resolução é a situação dramática dos países em desenvolvimento, onde o aumento dos preços dos bens alimentares tem tido a dimensão de tragédia humanitária, ainda mais intensa e profunda do que conhecemos.
É interessante que o reconhecimento do direito à soberania e segurança alimentar dos povos por parte da UE seja acompanhado de sugestões de serviços financeiros, créditos, fundos de garantia para apoiar os regimes nacionais de microcrédito, de empréstimo e de cobertura de riscos, em suma, de um conjunto de instrumentos financeiros (altamente rentáveis por parte de quem os oferece!) que nunca contribuíram para resolver os problemas económicos estruturais destes países, muitos dos quais foram criados por séculos de colonialismo, de exploração e dominação exercidos pelos mesmos que agora oferecem esta interesseira «ajuda».
Mais uma vez, a apregoada preocupação com a situação destes países não se coaduna com as políticas comunitárias praticadas, sendo exemplo as negociações dos acordos de parceria económica ou as rondas da OMC.
A UE não rompe com estas políticas e finge chorar sobre o leite derramado. Consubstanciado nas políticas nacionais, é obrigatório um novo rumo de defesa da soberania e segurança alimentares dos povos, de elevação dos rendimentos dos agricultores, defendendo o seu emprego e melhores salários, para contribuir para uma verdadeira coesão económica e social para Portugal e para a Europa, mas também para o mundo.
Sobre os números relativos aos preços dos produtos de base, o texto regista: aumentos dos preços mundiais do trigo na ordem dos 181%, nos últimos 3 anos, 141% para o arroz desde Janeiro deste ano e um aumento generalizado de 83% nos preços mundiais dos alimentos. No dia a dia, constatamos estes aumentos (e outros!) em Portugal: 74% no preço do leite, 71% no arroz, 36% nos óleos, 34% nas massas, 34% nas farinhas, 24% nos ovos, entre outros.
Verdadeiramente intrigante é o facto de a UE manifestar preocupação com estes aumentos e inclusivamente apontar algumas das suas causas (o aumento da especulação com produtos de base agrícolas e alimentares; a utilização de parte da produção para a alimentação animal e a produção de agrocombustíveis; a não realização, por parte dos países em desenvolvimento, do «seu potencial de produção alimentar») e ao mesmo tempo manter as suas políticas efectivas, nomeadamente a PAC, ou as propostas que defende em patamares internacionais determinantes como a Organização Mundial do Comércio, em que a alimentação é tratada como mais uma mera mercadoria.
«Lágrimas de crocodilo»
A resolução reflecte sobre «o direito à alimentação», desfiando o conjunto de compromissos internacionais na área da erradicação da pobreza e da fome – e que sempre ficam na gaveta na hora de tomar medidas concretas e possíveis para uma justa distribuição dos recursos à escala mundial. Debruça-se também sobre a «produção alimentar sustentável», revelando um pouco mais o seu descaramento ao reforçar as questões da regulamentação interna dos mercados agrícolas e a necessidade de manter a PAC.
A famigerada Política Agrícola Comum, a que sucessivos governos portugueses juraram fidelidade sacrificando uma parte fundamental do aparelho produtivo nacional, tem votado à pobreza milhares de agricultores e suas famílias, destruiu muitos milhares de explorações agrícolas, levou ao abandono de terras e desertificação e a uma política de subsídios desligada da produção, que favorece os grandes produtores.
O resultado só poderia ser a dependência alimentar do exterior e o emprobrecimento de largas camadas da população – duas condições que agora fazem verter lágrimas de crocodilo às instâncias europeias.
Primeiro, impõem-se regras demolidoras para um sector e um país, depois, lamenta-se a falta de reservas cerealíferas (as da UE não chegariam para mais de 30 dias, constata a dita resolução). Alvitra-se a possibilidade da especulação dos retalhistas prejudicar produtores e consumidores, admite-se que a subvenção de culturas para agrocombustíveis já não se justifica (sem, no entanto, abdicar dos objectivos traçados anteriormente), regista-se com apreensão a subida do custo da alimentação animal. Mas apesar de se reconhecer todas as dificuldades, insiste-se nas mesmas orientações e no mesmo rumo.
Tragédia humanitária
Outro foco desta resolução é a situação dramática dos países em desenvolvimento, onde o aumento dos preços dos bens alimentares tem tido a dimensão de tragédia humanitária, ainda mais intensa e profunda do que conhecemos.
É interessante que o reconhecimento do direito à soberania e segurança alimentar dos povos por parte da UE seja acompanhado de sugestões de serviços financeiros, créditos, fundos de garantia para apoiar os regimes nacionais de microcrédito, de empréstimo e de cobertura de riscos, em suma, de um conjunto de instrumentos financeiros (altamente rentáveis por parte de quem os oferece!) que nunca contribuíram para resolver os problemas económicos estruturais destes países, muitos dos quais foram criados por séculos de colonialismo, de exploração e dominação exercidos pelos mesmos que agora oferecem esta interesseira «ajuda».
Mais uma vez, a apregoada preocupação com a situação destes países não se coaduna com as políticas comunitárias praticadas, sendo exemplo as negociações dos acordos de parceria económica ou as rondas da OMC.
A UE não rompe com estas políticas e finge chorar sobre o leite derramado. Consubstanciado nas políticas nacionais, é obrigatório um novo rumo de defesa da soberania e segurança alimentares dos povos, de elevação dos rendimentos dos agricultores, defendendo o seu emprego e melhores salários, para contribuir para uma verdadeira coesão económica e social para Portugal e para a Europa, mas também para o mundo.