Ainda os portáteis de Raúl Reyes

Pedro Campos
As «revelações» dos portáteis de Raúl Reyes são petas tão mal amanhadas pelo duo Bush/Uribe que não valeria a pena voltar a elas senão fossem um degrau mais na perigosa escalada da agressão de Washington contra o processo bolivariano. Veiculadas pela Interpol, numa conferência de imprensa feita na Colômbia e lado a lado com a polícia desse país, não têm ponta por onde se lhes pegue, mas não é possível deixar que contribuam impunemente para a formação de uma matriz de opinião que busca demonizar Hugo Chávez e o seu governo e justificar um assalto militar ao estilo do feito contra o Iraque. Nos últimos dias, dois novos balões de ensaio foram lançados: tropas da Colômbia penetram em território venezuelano e um avião militar gringo, com base na ilha de Curaçao, violou o espaço aéreo venezuelano ao sobrevoar uma ilha sobre a qual está absolutamente claro que não pode passar nenhum avião, seja civil ou militar. Os Estados Unidos admitiram o incidente, mas alegaram que tinha sido por «engano». Tanta aparelhagem ultra sofisticada e «enganam-se» no caminho para casa. Só lembra ao diabo!
A embustice é tão grosseira que vale a pena recordar mais dois instantes desta farsa. Veja-se isto: «Ainda que resulte materialmente impossível provar que os computadores que envolvem o presidente Chávez com as FARC são do acampamento onde morreu Raúl Reyes...». Quem escreve assim? Um jornal chavista? Não. O naco de prosa é de um dos oposicionistas mais esganiçados – por certo, irmão de um entreguista ex-responsável pela direcção da petrolífera nacional – e aparece em El Universal [1], diário descaradamente contrarrevolucionário. Como se pode reparar, além de referir que o chefe guerrilheiro «morreu» – omite que foi assassinado – admite a impossibilidade de provar a procedência dos portáteis. Essa condição não o impede de imediatamente afirmar que «a carga de evidências» é «esmagadora» e por aí vai, escadaria abaixo, a fazer coro com uma oposição traidora que implora, com voz mafiosa, por uma invasão norte-americana. Registada esta admissão, passemos a outra declaração incontornável, prévia à que acabamos de referir.

Uma «revelação» de antologia

O seu autor é «só» Ronald K. Noble, secretário-geral da Interpol. De acordo com o que disse na tal conferência de imprensa, ficamos a saber que o comandante guerrilheiro era qualquer coisa menos... guerrilheiro. «Utilizando ferramentas forenses especializadas – esclarece o polícia[2] – os peritos da Interpol determinaram que as oito evidências apreendidas continham mais de 600GB... Este volume de dados corresponderia a 39,5 milhões de páginas Microsoft Word; 39 milhões de páginas que levariam mais de 1000 anos a ler, se uma pessoa lesse 100 páginas cada dia!» Aqui assalta-nos uma pergunta inocente: Se uma pessoa demora 1000 anos a ler esses textos à razão de 100 páginas por dia, quanto milhares de anos demorará a escrevê-los? Certamente que muitos mais porque o processo de escrever é mais demorado que o de ler... Em consequência, do anterior conclui-se facilmente que Raúl Reyes, para além de ter sido «um forçado do teclado», nunca deve ter tido tempo para disparar um só tiro na sua longa – e heróica – vida de guerrilheiro.
Não sabemos quais são as capacidades que exige a Interpol para se ocupar lugar de secretário-geral. Mas podemos apostar que não são as de saber pensar nem as de dominar a lógica da investigação policial. Talvez, sim, as de ser capaz de mentir impudicamente e de fazer o frete aos patrões de Washington.
Para deixar por aqui este tema, um malabarismo mais nestas trafulhices. Padilla León, generalote de Uribe, afirma que «as Forças Militares encontraram os computadores in situ e entregaram-nos à polícia judiciária (...) por isso não tivemos acesso à informação armazenada». A páginas 31 do relatório da Interpol diz que «as autoridades colombianas (...) comunicaram abertamente aos especialistas da Interpol (...) que um funcionário da sua unidade antiterrorista teve acesso directamente às oito provas instrumentais citadas (...) entre 1 de Março de 2008, quando foram apreendidas pelas autoridades colombianas, e 3 de Março de 2008». Em que é que ficamos, trapalhões?

[1] http://opinion.eluniversal.com/2008/05/20/opi_10843_art_chavez,-el-impune_856031.shtml
[2] Ver: http://www.elfrente.com.co/index.php?option=com_content&task=view&id=5777&Itemid=833


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