Os direitos dos outros

Leandro Martins
Na segunda-feira à noite – se fosse no dia seguinte atribuiria o caso às mentiras do 1.º de Abril – o meu espanto foi grande ao ouvir, na televisão, que a União Europeia e os Estados Unidos exigiam – isso mesmo, exigiam – que os resultados das eleições no Zimbabué fossem apurados e anunciados com rapidez.
É claro que os leitores já perceberam que o meu espanto não foi nenhum, habituados como estamos a estes destemperos imperiais. Mas a minha indignação não deixou de ser grande. Acho mesmo que no dia em que deixar de me indignar já não vale a pena viver.
Continua a ser espantoso, digo, continua a causar indignação a arrogância com que os Estados Unidos e os seus lacaios europeus, e outros mais, persistem em ditar ao mundo as suas próprias regras – que, aliás, não cumprem. Poderia imaginar-se alguma vez que um qualquer país «exigisse» aos Estados Unidos que publicasse «com rapidez» os resultados das suas eleições próprias? Que, por exemplo, quando da renhida disputa eleitoral para as presidenciais, em que Bush defrontou aquele senhor com nome de molho de tomate, um Estado qualquer – digamos, Portugal – pudesse «exigir» à Casa Branca e aos tribunais USA que deslindassem «rapidamente» quem tinha ganho? Depois de muitas peripécias, essas, sim, dignas de um país de coronéis e não de um estado democrático, a vitória foi dada novamente a Bush por uma juíza da Florida, onde reside o lobby que mais fortemente apoiou o descabelado e reaccionário Bush...
Mas as coisas ainda funcionam assim, neste Planeta à beira Sol plantado. Com grande apoio mediático que – volto a repetir o que na semana passada escrevi – vem publicado em tudo o que é órgão de comunicação ao serviço dos monopólios e do imperialismo.
Destes direitos humanos, nomeadamente dos direitos democráticos, não querem os comentadores e os locutores-jornalistas saber quando se trata dos Estados Unidos. Preferem defender os separatismos, os colonialismos, as invasões – tudo o que, em nome da liberdade e da democracia, o império decreta. Na imprensa escrita, falada e vista, o que continua a dar é o Tibete com o seu Dalai. Até na blogosfera há quem se irrite com os comentários que aqui publicamos. Uns bem plantados à direita; outros autonomeando-se de esquerda; outros ainda, de cartão envergonhado, assobiam para o lado, dando aos primeiros a razão que não têm.


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