Comentário

Trafulhices

Pedro Guerreiro
Sob a liderança da presidência alemã, prossegue a tentativa de (re)impor o conteúdo da erradamente designada «constituição europeia». Saliente-se que, apesar dos esforços em manter secretos os contornos da marosca, com receio que esta se torne evidente, as contradições e as dificuldades continuam a emergir.
O governo alemão (uma coligação entre a direita e a social-democracia) adoptou como seu objectivo a inaceitável recuperação do máximo do conteúdo da dita «constituição europeia», já rejeitada.
Assim, dirige a negociação partindo da ideia de que a maior parte do conteúdo da «constituição europeia» já está estabelecido no actual Tratado de Nice, tentando centrar a discussão apenas nos novos pontos em que existe desacordo.
Deste modo, pretende avançar a negociação quanto ao conteúdo do novo tratado, dir-se-á, paralelamente à decisão quanto à sua designação e forma de apresentação. Ou seja, a presidência alemã da UE ambiciona garantir o máximo do conteúdo da rejeitada «constituição europeia», independentemente da designação e forma de apresentação da (pretensa e falsa) «nova» proposta de tratado, que, afinal, não seria mais que a anterior versão «travestida». Uma autêntica trafulhice que mais não procura do que a fuga à realização de referendos nos diferentes países da União Europeia.

Porque corre Merkel?

Um dos falsos argumentos utilizados para tentar (re)impor o conteúdo da rejeitada «constituição europeia» é a necessidade de uma pretensa «eficácia» no processo de tomada de decisão. Como anteriormente, a «eficácia» é usada com o intuito de ocultar a questão central do poder e controlo do processo de decisão ao nível da UE. O exemplo da ponderação de votos no Conselho - instituição onde estão representados os diferentes governos - é esclarecedor.
Desde sempre que, na integração capitalista europeia, o poder de intervenção no processo de decisão é distribuído de forma desigual entre os diferentes países, tendo este sido sempre dominado pelas grandes potências.
Aliás, um dos principais objectivos do Tratado de Nice, que antecedeu o anterior alargamento da UE, foi (re)assegurar o domínio das grandes potências no processo de decisão - ou seja, introduzindo ponderações de votos e mecanismos de decisão que permitem salvaguardar as suas soberanias e desrespeitar as demais.
Não satisfeitos com «Nice», a «constituição europeia» vem fortalecer o domínio dos «grandes» países, federalizando ainda mais o Conselho, ao promover a aplicação do critério demográfico nas votações por maioria qualificada (ver gráfico), para gáudio do grande capital na Alemanha, França, Grã-Bretanha e Itália e subserviência dos restantes. Esta é uma das razões que tanto faz correr Merkel e o seu governo.

Por uma Europa
de cooperação


Como temos afirmado, para o PCP, partido patriótico e internacionalista, a salvaguarda da soberania nacional e a promoção dos interesses de Portugal, uma política externa de diversificação das relações internacionais e de cooperação, paz e amizade com todos os povos, constituem orientações fundamentais para a intervenção do País num projecto de cooperação na Europa.
Daí a defesa de um modelo institucional onde o Conselho mantenha um papel determinante, com um país/um voto e a salvaguarda do direito de veto sempre que esteja em causa uma qualquer questão considerada de interesse vital por parte de um país. Daí a consequente rejeição da transferência de competências nacionais e da alienação de instrumentos fundamentais para a concretização de um projecto próprio de desenvolvimento do País. Daí a defesa do reforço da capacidade de intervenção e de decisão dos parlamentos nacionais num projecto de cooperação ao nível europeu.
Uma Europa de cooperação, que salvaguarde a democracia, exige o total respeito pela soberania, pela igualdade de direitos, pelos interesses, valores e especificidades de cada Estado. Logo, a rejeição de imposições supranacionais, do federalismo e do domínio das grandes potências, onde se cimenta o neoliberalismo e o militarismo da UE e a sua transformação num bloco político-militar imperialista, subordinado ou em parceria com os EUA.


Mais artigos de: Europa

Prodi promete gastos sociais

O governo italiano está optimista em relação ao crescimento económico e, apesar do orçamento de «rigor» aprovado para este ano, já anunciou que irá destinar parte do aumento das receitas fiscais para a política social.

Passo em falso

A direita conservadora (PiS) e os seus aliados católicos de extrema-direita (LPR), sofreram uma pesada derrota com a rejeição das cinco propostas que visavam a proibição total do aborto.

Tribunal militar julga jornalistas

O início do julgamento, por um tribunal militar, dos jornalistas Sandro Brotz, Beat Jost e Christoph Grenacher estava marcado para anteontem, dia 17, pelo «crime» de divulgação de um documento dos serviços secretos suíços que testemunhava a existência de prisões secretas da CIA na Europa.A Federação Europeia de...

Os lucros de <em>La Poste</em>

Os correios franceses, La Poste, ultrapassaram largamente os seus objectivos financeiros para 2006, obtendo um lucro líquido de 789 milhões de euros, ou seja, um aumento de 42 por cento face ao ano anterior.Este crescimento é em parte atribuído aos resultados do serviço expresso, das encomendas e dos serviços...

Blair quer tratado «tradicional»

O primeiro-ministro britânico, Tony Blair, apoia a proposta da Holanda de apresentar um tratado «tradicional modificado» como alternativa a um novo projecto de constituição europeia.Os dirigentes europeus «devem regressar à ideia de um tratado tradicional modificado, mais do que a um tratado que tenha as características...

Diferenças de preços atingem o dobro

Um estudo do Eurostat, gabinete de estatísticas europeu, constata a existência de fortes disparidades nos preços dos medicamentos praticados nos diferentes países europeus.Em relação a um valor médio estabelecido para os 25 estados membros da UE, os preços mais elevados foram registados na Suíça (+87%) e na Islândia...