Comentário

Caminhos da União Europeia

Ilda Figueiredo
Na evolução recente da União Europeia assumem particular importância três acontecimentos: a adesão recente de dez Estados em Maio de 2004 e de mais dois países de leste (Bulgária e Roménia), em Janeiro deste ano, o projecto da dita constituição europeia, aprovado em Outubro de 2004 e a sua rejeição nos referendos da França e da Holanda, em Maio e Junho de 2005.
São estes factos, contraditórios entre si, mas resultantes do carácter específico da União Europeia, que estão na base das estratégias em que se empenham actualmente as elites do poder, tentando caminhar o mais aceleradamente possível para a centralização do poder que permita o controle económico, o que exige o controle político interno e externo, incluindo dos aparelhos repressivos na ordem interna e do reforço dos meios militares para a ordem externa. Ou seja, nas suas mentes está presente a questão do imperialismo europeu só poder atingir toda a sua plenitude com uma reforma institucional que permita estes controlos. Daí a obsessão da Chanceler alemã, Angela Merkel, com a dita constituição europeia.
Só que atingir estes objectivos, que são próprios do capitalismo monopolista de Estado, numa União Europeia formada por 27 estados-membros, com as características específicas de cada país e tradições democráticas tão diversas, não é fácil. A recente proclamada «Declaração de Berlim» é disso um exemplo, seja pelos objectivos implícitos ali incluídos, seja pela dificuldade na sua clarificação e aprofundamento, seja também pela forma pouco democrática como foi elaborada e assinada pelos três responsáveis máximos da União Europeia, sem aprovação e sem debate prévio nos órgãos a que presidem (Conselho, Comissão e Parlamento Europeu).
Para que a União Europeia funcione como um «super-estado» é preciso que tenha personalidade jurídica própria, que as decisões possam ser tomadas por maioria, de preferência tendo por base a população e não o número de países que são membros. Em suma, é preciso que desapareça de todo o princípio «estados soberanos e iguais em direitos», inscrito no Tratado de Roma, de que agora se assinalaram os 50 anos, e que, em sua substituição, se institucionalize o tal «directório» de seis ou sete grandes potências que possam decidir sozinhas em nome dos 27 actuais ou de futuros 30 ou mais estados-membros.
É certo que aquele princípio da igualdade de direitos de Estados soberanos já tem muitas excepções na sua aplicação. Foram introduzidas em diferentes alterações ao texto original, conhecidos por diversos tratados entretanto aprovados, e cujos nomes resultam das cidades onde foram assinados, com destaque para Maastricht e Amsterdão nos anos noventa do século XX, depois da queda do muro de Berlim, e Nice, já no século XXI. É esta última versão que se encontra em vigor – o Tratado de Nice.
Em todos estes novos tratados houve aprofundamento da integração europeia. Mas ainda permitem alguma margem de manobra aos estados-membros. Em áreas importantes de decisão ainda é necessário o voto por unanimidade. Depois, nem todos estão na zona euro. Apenas 13 estados-membros são directamente atingidos pelas orientações e regras do Banco Central Europeu, designadamente taxas de câmbios e de juros, por terem aderido à zona euro e, assim, terem perdido a sua soberania na política monetária e cambial. Igualmente, na área militar, nem todos são membros da Nato e, portanto, nem todos participam nas ditas «missões» internacionais que a UE desenvolve em nome da NATO. Também nem todos adoptaram o espaço Schengen e alguns dos Quinze ainda se opõem à livre circulação de trabalhadores dos doze novos estados-membros.
Pode voltar a caber a Portugal um papel importante na estratégia do capitalismo europeu. Mesmo que Portugal, hoje, já não seja considerado um caso exemplar, por não ser possível ignorar que é um dos países com maiores índices de pobreza, incluindo trabalhadores de trabalho precário e baixos salários, idosos com pensões de miséria e crianças em risco, enquanto multinacionais anunciam novas deslocalizações e são conhecidos lucros fabulosos de bancos e grandes empresas, ainda pode servir para tentar dar, aqui, mais um passo no reforço da integração capitalista, federalista e militarista.
O roteiro que a presidência alemã está a preparar para pôr em prática o objectivo anunciado na Declaração de Berlim «até às eleições para o Parlamento Europeu de 2009, dotar a União Europeia de uma base comum e renovada» pode incluir a realização de uma conferência intergovernamental em Lisboa, no segundo semestre deste ano, visando aprovar uma dita constituição europeia, objectivo central do Governo alemão.
Mas a frustração dos povos com as expectativas criadas pela União Europeia e a critica e luta que alastram em diversos estados-membros, incluindo em Portugal, podem travar os objectivos das elites do poder.


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