Comentário

O prólogo da Europa

Pedro Carvalho
As comemorações do 15.º aniversário da assinatura do Tratado de Maastricht que instituiu a União Europeia, em 7 de Fevereiro, passaram quase despercebidas. Este foi um dos maiores saltos qualitativos da integração capitalista europeia, que encetou o processo de unificação monetária e acrescentou uma dimensão política ao pilar do mercado interno, criando como segundo pilar - a Política Exterior e de Segurança Comum (com o objectivo de criação de uma Política Europeia de Defesa Comum), e um terceiro - a política de Justiça e Assuntos Internos.
Aprofundavam-se assim os três eixos interdependentes da integração comunitária – o federalismo, o neoliberalismo e o militarismo, criando-se as condições para se caminhar para a integração política europeia. O Tratado de Maastricht também foi uma peça da contra-ofensiva de classe, encetada no começo da década de oitenta, com os governos de Reagan/Thatcher, que procurou dar resposta à crise estrutural do capitalismo, aproveitando as oportunidades abertas pelas derrotas do socialismo a leste e pela dita «reunificação» alemã.
Por detrás deste processo esteve sempre a mesa redonda industriais europeus – verdadeiro centro de promoção dos interesses das maiores empresas multinacionais europeias. Aliás, foi a partir da sua comunicação «Redesenhar a Europa, de Maio 1991, elaborada em colaboração estreita com a Comissão Europeia do social-democrata Jacques Delors, e com o apoio activo da Comissão de Assuntos Institucionais do Parlamento Europeu (com o contributo do deputado italiano Altiero Spinelli), que o Tratado de Maastricht acabou por «ver a luz do dia».
Este foi o segundo movimento de um «triplo salto» iniciado com a assinatura do Acto Único Europeu, em 28 de Fevereiro de 1986, que estabeleceu o objectivo da criação de um mercado interno até 31 Dezembro de 1992.
Após a sua concretização, passou-se à União Económica e Monetária, preparando-se o terreno para fase derradeira da integração política, com a dita «constituição europeia». Estas duas revisões dos Tratados reforçaram a transferência de competências para as instituições comunitárias e alargaram o âmbito das decisões por maioria qualificada, restringindo o direito de veto.
O epílogo deste processo foi subitamente interrompido pelo NÃO do povo francês e holandês à dita «constituição europeia». Com vista ao seu relançamento, a actual presidência alemã da UE tentará aproveitar as comemorações do 50.º aniversário do Tratado de Roma, que se assinala no próximo dia 25 de Março, para obter um novo compromisso expresso na «declaração de Berlim», cujo texto está em fase de concertação, visando «limar» contradições e superar o actual «impasse» na caminhada integracionista, à semelhança do que aconteceu, em 1983, com a Declaração de Estugarda que abriu as portas para o Tratado da União Europeia.
No «código genético» da integração europeia está, desde a primeira hora, a «mão» norte-americana: o Plano Marshall que correspondeu à necessidade de os EUA, após a segunda guerra mundial, promoverem um mercado europeu para o seus produtos e um «pilar» europeu da NATO, como «tampão» (e na luta contra) o bloco socialista.
Em segundo lugar, destaca-se o compromisso histórico entre o capital alemão e o capital francês – o dito eixo franco-alemão – que dinamizou as várias etapas da integração comunitária, desde a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço até à dita «constituição europeia».
A aliança estratégica (o compromisso) entre a social-democracia e os conservadores foi o terceiro factor que permitiu, logo em 1955, consolidar a necessária unidade política em torno do processo de integração, que resultou no Tratado de Roma.
Por fim, a natureza de classe da integração comunitária é patente no apoio e envolvimento das confederações patronais, representadas desde 1957 pela União das Indústrias da Comunidade Europeia (UNICE) e, desde 1983, também pela mesa redonda dos industriais europeus.
Numa altura em que se prepara um relançamento da integração e, com ela, de uma nova ofensiva do capital, torna-se cada vez mais necessária uma resposta de classe por parte dos trabalhadores e dos povos. Se o Acto Único e Maastricht foram o prólogo da Europa (do capital) que temos, depende de nós, da nossa luta, que a dita «constituição europeia» não se torne no seu epílogo.


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