Os partidos não são iguais

Alexandre Araújo (Membro do Secretariado)
O tratamento dado pela comunicação social e respectivos comentadores aos recentes acórdãos do Tribunal Constitucional sobre as contas da campanha eleitoral das Eleições Legislativas e multas aplicadas aos Partidos, a propósito das contas de 2003, representa mais um passo na campanha contra os Partidos.

O PCP sempre fez depender o seu financiamento das suas próprias forças

De facto, a forma como esses acórdãos são tratados, mais do que contribuir para a divulgação das contas dos Partidos, e correspondentemente da sua actividade e da natureza das suas formas de financiamento, constituiu uma acção concertada para alargar a ideia do «eles são todos iguais» e mais um passo na campanha contra os Partidos, como se neles residissem todos os males. Como se não fossem as políticas concretas que defendem e executam e os compromissos que assumem e não cumprem que contribuem de forma decisiva para desacreditar a política, o sistema político e a democracia.
Assim são abertos novos espaços a ataques à participação das populações e dos trabalhadores na vida política, a novas limitações de direitos e liberdades, a novas degradações e limitações da própria democracia política no nosso País.
Longe da análise de tais comentadores e órgãos de comunicação social fica também o real significado desta Lei de Financiamento dos Partidos e Campanhas Eleitorais, muitas vezes apresentada como a lei do rigor e da transparência mas que, na realidade e em conjunto com a Lei dos Partidos, traduz uma tentativa de criação de um modelo único de partido.
O que sempre caracterizou e distingue o PCP neste aspecto é o facto de apresentar contas consolidadas de todo o universo partidário (o único dos grandes partidos muitas vezes a fazê-lo, como o próprio Tribunal Constitucional salientou) e o carácter distintivo das suas receitas. Isto, sem escamotear as reais dificuldades que, pelo carácter militante do trabalho partidário, muitas organizações encontram para dar resposta a todas as exigências que a Lei coloca sob o ponto de vista administrativo.
Como mostrava a conta de gestão apresentada ao XVII Congresso, entre os anos 2000 e 2003, cerca de 75 % das receitas do Partido foram provenientes de quotizações, contribuições de militantes do PCP e de eleitos em cargos públicos e de iniciativas de angariação de fundos. O peso da subvenção pública era apenas 8%.
Talvez estes dados ajudem a compreender os reais interesses do PS, PSD e CDS-PP na aprovação da Lei de Financiamento dos Partidos e das campanhas eleitorais e no lançamento de suspeições generalizadas sobre as receitas próprias dos Partidos.

Muito significativo

Esta lei preconiza e institui a ideia de que os Partidos devem ser financiados pelo Estado, tendo aumentado para o triplo as subvenções a distribuir pelos partidos, quer as anuais quer para financiamento de campanhas eleitorais, com excepção das eleições autárquicas, em que o aumento foi nove vezes (!) maior, podendo atingir a verba de 50 milhões de euros.
É particularmente significativo que seja esta a posição dos partidos que nos últimos 30 anos têm conduzido a ofensiva contra o regime democrático e os direitos das populações e dos trabalhadores; que têm encerrado serviços públicos, atacando e desinvestindo na educação, na saúde, na segurança social; que a propósito (e a despropósito) de tudo exigem e reivindicam menos Estado, fazendo eco das reivindicações do grande capital mas que, neste caso, abrem para eles uma conveniente excepção.
A verdade é que a criação de dificuldades à obtenção de receitas próprias, que decorram da actividade de cada Partido, da generosidade, abnegação e participação dos seus militantes, atinge particularmente o PCP. Nomeadamente medidas como a limitação das receitas de actividades de angariação de fundos, que procuram empurrar para a ilegalidade as receitas que o PCP obtém nas muitas centenas de grandes e pequenas iniciativas que promove por todo o País não apenas em períodos eleitorais. Ou, ainda, a limitação das receitas em numerário, pelas dificuldades que cria à recolha de pequenas contribuições e ao pagamento de pequenas quotas (tanto mais quando são conhecidas as limitações crescentes que os próprios bancos colocam a muitos trabalhadores e reformados de possuírem conta bancária e livros de cheques, devido aos seus saldos bancários).
O PCP sempre fez depender o seu financiamento das suas próprias forças, assim pretendendo que continue. É que a independência financeira do PCP é mais uma garantia da sua independência orgânica, política e ideológica. Essa é uma das razões por que, na actividade do partido, das suas organizações e militantes, a par da sua intervenção política, deve ser sempre colocada a preocupação com a recolha de fundos e o equilíbrio financeiro.
Pagar quotas, acompanhar e promover o seu pagamento, é um dever fundamental de cada militante do partido. Atenção deve ser dada também constantemente ao aumento do valor da quota, à recolha de contribuições extraordinárias, ao cumprimento dos compromissos dos eleitos, à promoção de iniciativas, políticas, culturais e de convívio, visando sempre o aumento da capacidade financeira do PCP. O apelo feito pelo Partido à contribuição com um dia de salário do 13.º mês de todos os militantes pode constituir um importante contributo nesse sentido.


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