Índia, o gigante move-se

Ângelo Alves

Uma visita que nos confirmou o importante papel dos comunistas

Uma semana, dezenas de milhar de quilómetros percorridos, 4 cidades visitadas, diversos encontros com estruturas várias, dois comícios, uma conferência de imprensa, conversações com as direcções do Partido Comunista da Índia e Partido Comunista da Índia (Marxista) e respectivos Secretários Gerais, recepções e encontros oficiais com autoridades indianas e com a Embaixada de Portugal na Índia ilustram bem a intensidade do programa político da recente visita de uma delegação do PCP à Índia.
Uma visita que nos confirmou o importante papel dos comunistas e das suas gigantescas organizações de massas de trabalhadores, camponeses, juventude e mulheres e que nos permitiu constatar o bom momento que estes dois Partidos atravessam com um crescimento muito rápido e consistente, que abre aos comunistas perspectivas de reforçarem a sua organização e influência política a toda a Índia, tradicionalmente concentrada nos Estados de Bengala Ocidental, Kerala e Tripura, estados por si dirigidos no plano dos governos estaduais.
Uma visita em que a convergência de opiniões e análises foi uma constante, nomeadamente quanto à evolução da situação internacional, da luta dos trabalhadores e dos povos e na radiografia ao actual estado do movimento comunista e revolucionário internacional.
Uma deslocação que nos permitiu conhecer mais de perto a realidade de um país que sendo intenso e apaixonante é simultaneamente chocante e marcado por enormes contradições sociais.

A Índia, o segundo país mais populoso do mundo, com cerca de 1 100 milhões de habitantes, é marcado por profundas chagas sociais resultantes de um imenso fosso de riqueza entre classes em que 200 milhões de ricos e muito ricos enriquecem a um ritmo furioso ditado pelas multinacionais enquanto que 900 milhões de seres humanos tentam sobreviver na pobreza. Infelizmente o pujante crescimento económico da Índia de 9% não está a significar uma vida melhor para a esmagadora maioria do seu povo, e esta não é uma questão qualquer. É que visitando-se a Índia tem-se a plena sensação de que do ponto de vista social este imenso país é uma gigantesca «panela de pressão» social, que tendo válvulas de escape que ainda estão nas mãos do Estado e que têm permitido controlar a situação, pode, a manter-se a tendência actual, rebentar numa explosão social com consequências imprevisíveis.
As grandes potências capitalistas mundiais vêem agora na Índia um renovado interesse económico e estratégico, um novo «El-Dorado», que possa fazer frente à potência emergente chinesa. Os EUA protagonizam esse processo e os acordos sucedem-se nas mais variadas áreas tentando descolar a Índia da sua histórica posição de importante país fundador do Movimento dos Não Alinhados.

É neste quadro de extrema complexidade que os nossos camaradas indianos desenvolvem a sua luta. Chamados a travar o perigo real de fascização da sociedade indiana que se desenvolvia até 2004 com a actuação do anterior governo de direita/extrema direita, desde essa altura que – num quadro de grande reforço eleitoral e sem participação no governo – os comunistas garantem a sobrevivência institucional de um executivo de maioria relativa do Partido do Congresso com base num programa mínimo acordado previamente. Uma luta difícil – tendo em conta a tendência de rendição da social democracia ao neoliberalismo que na Índia também se verifica – mas que tem conseguido travar o passo às medidas mais gravosas do governo graças a uma hábil conjugação da intervenção dos comunistas nas instituições com uma intensa ligação às massas trabalhadoras e populares e sua mobilização.


Mais artigos de: Opinião

A pose

O ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, Vieira da Silva, discursou esta semana na abertura da Conferência Mundial que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) está a realizar em Lisboa até à próxima terça-feira. A Conferência subordina-se ao ponderoso tema «Protecção Social e inclusão: convergência de...

Um lamentável <br>«reencontro com a história»

«A CIA, gigantesca e sinistra organização de espionagem, conspirações, golpes fascistas, operações de terrorismo de Estado, assassinatos de militantes progressistas, teve em Portugal, após o 25 de Abril, papel de relevo no processo contra-revolucionário.»(Álvaro Cunhal, A verdade e a mentira na Revolução de AbrilNão...

Os Loureiros e outros figurões

Esta semana aconteceram passos na resolução aparente de dois intermináveis folhetins do país futebolístico – o «caso Mateus» e a tomada de posse da nova Direcção da Liga - e que, goste-se ou não, constituem elementos de inevitável actualidade social e política e, em si mesmos, paradigma do estado a que chegou o processo...

Onde é que pára a direita?

Curvado perante a «verdadeira personalidade política de recorte inesperado e excepcional» de José Sócrates; extasiado pelas suas «performances cheias de humor e desenvoltura na Assembleia da República»; deslumbrado pelo facto de, não obstante tanta desgraça que vai por este País, as sondagens mostrarem que «o povo...

Exageros do costume

Sendo o desemprego e a precariedade credores de toda a atenção, as iniciativas que o BE realizou para lhe dar expressão não mereceriam comentário especial. O tema está aí, entre outros, e cada um trata do que entende dever tratar. O que suscita réplica são as ilações políticas que os seus responsáveis, a começar por...