A «pressão»
Se quisermos escolher um só título, uma só palavra, que possa designar o momento que é mais forte aposta da SIC actual, a tarefa é fácil: «Floribela». A TVI, toda a gente o sabe, é a estação dos «Morangos», e o resto é irrelevante. A RTP mantém-se à tona do interesse durante o «prime time» graças ao carisma de José Carlos Malato, o que é manifestamente frágil para uma estação de serviço público. A «2:» transmite por duas vezes, entre o fim da tarde e as 22 horas, um documentário acerca do velho Ramsés, e remete para as 3 da madrugada a repetição de um debate entre os deputados portugueses em Estrasburgo. Perante isto, que é apenas uma amostra colhida das programações do próprio dia em que escrevo, talvez não seja excessivo suspeitar de que alguma coisa está podre neste reino que não é o da Dinamarca shakespeariana, mas sim o da TV portuguesa que todos nós pagamos de uma forma ou de outra, isto é, ou com a taxa ressuscitada há uns tantos meses ou através da publicidade cujos custos vão caindo a conta-gotas nos diversos produtos que compramos. E sublinhe-se que, em saudável e lúcido critério, o pior não é que paguemos, é que sejamos levados a pagar uma televisão tão medíocre e que bem podia, bem devia, ser outra coisa.
Ora, segundo me constou através de um texto publicado na imprensa «de referência», aconteceu que um dia destes, ou mais exactamente, um dia já não muito recente, pois terá sido por altura do Mundial de Futebol, o ministro Augusto dos Santos Silva terá dito que os grandes acontecimentos desportivos deviam ter ampla cobertura da televisão, decerto por constituírem assuntos dignos do serviço público, naturalmente que em sua opinião. O ministro não deu ordem, não pediu, não afirmou a existência de um dever que impendesse sobre a TV pública. Nem ele me parece homem para isso. Limitou-se a ter opinião e a não fazer segredo dela. Pode alegar-se que é ele, ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares, que detém a tutela da Comunicação Social, mas para falar com franqueza eu até acho que ele já se esqueceu disso. Ainda assim, porém, ao que agora se leu na tal imprensa, gerou mal-estar. Porque teria estado a exercer pressão sobre a TV que, pelos vistos, se quer sentir inteiramente livre, sem o mais pequeno constrangimento. Para fazer o que, dia após dia, está bem à vista.
Tutela, para que (nos) serve?
A notícia do mal-estar, a acusação de exercer pressão formulada ao ministro por se ter atrevido a ter opinião e exprimi-la, essa outra pressão, se o quiserem, que eu não sou homem para regatear condescendências a pessoas incomodadas) que é a própria acusação, parece-me matéria bastante para pôr a pensar quem se interesse pela televisão que temos e ainda pense na televisão que devíamos ter. Não se trata de forma alguma de convergir com Augusto Santos Silva na opinião que terá tido (ou não, pois de facto parece que ele nunca clarificou inteiramente o ponto) sobre a desejável cobertura de jogos de futebol em torneios mundiais, pois facilmente se adivinha que tais transmissões poderiam custar mais que os olhos da cara de quem as visse. Trata-se, isso sim, de acreditar que Santos Silva é o ministro que tutela a Comunicação Social, e portanto a TV, pois essa informação foi divulgada na altura própria, veio publicada no Diário da República nos velhos tempos em que era em papel e portanto fácil de palpar, pelo que é capaz de ser verdade. Então, o que é isso de uma tutela se não dá sequer direito a que um pobre ministro tenha opinião sobre a realidade que tutela? Por mim, fico perturbado perante esta interrogação, e permito-me explicar porquê. Decerto por ingenuidade, nem poder ter sido por outro motivo, fixei que Augusto Santos Silva, quando um dia foi ministro da Cultura, disse que a televisão devia ser tutelada pelo então seu ministério. E eu, no meu cantinho de cidadão obscuro e medíocre, aplaudi, pois bem sabia então, como sei hoje, que a televisão está há muito sob a tutela do ministério invisível, imaterial mas terrivelmente eficaz, da Pauperização Cultural. Assim, quando soube da tutela que no actual gabinete caberia ao ministro Santos Silva, reacendeu-se algures a velha esperança desatinada dos incorrigíveis ingénuos: talvez agora, quem sabe…? Passou-se ano e meio, a esperançazinha já se apagou, já percebi que o ministro não quer, não pode, ou acha que não é preciso. Agora, porém, fiquei apesar de tudo surpreendido: o quê?, nem uma opiniãozinha de nada ? Então, o que será isso da tutela? Para que serve? E surgiu ainda, tontinha de todo, uma interrogação perplexa: e, se não serve para nada, ele fica-se?
Ora, segundo me constou através de um texto publicado na imprensa «de referência», aconteceu que um dia destes, ou mais exactamente, um dia já não muito recente, pois terá sido por altura do Mundial de Futebol, o ministro Augusto dos Santos Silva terá dito que os grandes acontecimentos desportivos deviam ter ampla cobertura da televisão, decerto por constituírem assuntos dignos do serviço público, naturalmente que em sua opinião. O ministro não deu ordem, não pediu, não afirmou a existência de um dever que impendesse sobre a TV pública. Nem ele me parece homem para isso. Limitou-se a ter opinião e a não fazer segredo dela. Pode alegar-se que é ele, ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares, que detém a tutela da Comunicação Social, mas para falar com franqueza eu até acho que ele já se esqueceu disso. Ainda assim, porém, ao que agora se leu na tal imprensa, gerou mal-estar. Porque teria estado a exercer pressão sobre a TV que, pelos vistos, se quer sentir inteiramente livre, sem o mais pequeno constrangimento. Para fazer o que, dia após dia, está bem à vista.
Tutela, para que (nos) serve?
A notícia do mal-estar, a acusação de exercer pressão formulada ao ministro por se ter atrevido a ter opinião e exprimi-la, essa outra pressão, se o quiserem, que eu não sou homem para regatear condescendências a pessoas incomodadas) que é a própria acusação, parece-me matéria bastante para pôr a pensar quem se interesse pela televisão que temos e ainda pense na televisão que devíamos ter. Não se trata de forma alguma de convergir com Augusto Santos Silva na opinião que terá tido (ou não, pois de facto parece que ele nunca clarificou inteiramente o ponto) sobre a desejável cobertura de jogos de futebol em torneios mundiais, pois facilmente se adivinha que tais transmissões poderiam custar mais que os olhos da cara de quem as visse. Trata-se, isso sim, de acreditar que Santos Silva é o ministro que tutela a Comunicação Social, e portanto a TV, pois essa informação foi divulgada na altura própria, veio publicada no Diário da República nos velhos tempos em que era em papel e portanto fácil de palpar, pelo que é capaz de ser verdade. Então, o que é isso de uma tutela se não dá sequer direito a que um pobre ministro tenha opinião sobre a realidade que tutela? Por mim, fico perturbado perante esta interrogação, e permito-me explicar porquê. Decerto por ingenuidade, nem poder ter sido por outro motivo, fixei que Augusto Santos Silva, quando um dia foi ministro da Cultura, disse que a televisão devia ser tutelada pelo então seu ministério. E eu, no meu cantinho de cidadão obscuro e medíocre, aplaudi, pois bem sabia então, como sei hoje, que a televisão está há muito sob a tutela do ministério invisível, imaterial mas terrivelmente eficaz, da Pauperização Cultural. Assim, quando soube da tutela que no actual gabinete caberia ao ministro Santos Silva, reacendeu-se algures a velha esperança desatinada dos incorrigíveis ingénuos: talvez agora, quem sabe…? Passou-se ano e meio, a esperançazinha já se apagou, já percebi que o ministro não quer, não pode, ou acha que não é preciso. Agora, porém, fiquei apesar de tudo surpreendido: o quê?, nem uma opiniãozinha de nada ? Então, o que será isso da tutela? Para que serve? E surgiu ainda, tontinha de todo, uma interrogação perplexa: e, se não serve para nada, ele fica-se?