Inevitabilidades
Anteontem a RTP1 foi para a rua ouvir transeuntes, presume-se que ao acaso, sobre a situação económica do País: está melhor, está pior?, o que é que acha?
O jornalista em estúdio, de sorriso maroto, preveniu antecipadamente que os portugueses estavam «pessimistas». Assim era: a maioria das respostas andou por um está pior, ou está muito pior, ou está a piorar. Apenas uma resposta dissonante: um jovem, sorridente e bem disposto (e, como de imediato se verificou, consumidor de artigos de opinião produzidos por analistas com poiso certo em jornais, rádios e têvês de referência) tri-opinou mais ou menos assim: a situação está a melhorar; irá melhorar ainda mais porque o Governo dispõe de uma maioria e tem possibilidades de aplicar medidas impopulares; e, é claro, as medidas impopulares são inevitáveis para resolver os problemas da nossa economia. E lá foi, muito provavelmente satisfeito com tanto saber o seu, julgando estar a dizer o que pensava, convencido de que o que pensava era pensado pela sua cabeça.
Sabe-se, por efeito de repetição exaustiva, que para salvar a economia, o desemprego é inevitável; e apertar o cinto, também; e da perda de direitos, nem se fala. Aliás, esta necessidade de os trabalhadores deixarem de ter direitos, é exemplo não apenas de uma corriqueira inevitabilidade mas também de uma lustrada modernidade. Como não se cansam de repetir os tais analistas com poiso certo nos média de referência, os direitos dos trabalhadores são trastes do passado, velharias de deitar fora, incompatíveis com a democracia moderna em que vivemos.
Voltando ao moço que respondeu o que a RTP1 queria ouvir: à noite, muito provavelmente, viu-se na televisão e gostou. E quando ouviu o locutor de serviço fechar a peça dizendo, e exemplificando os dizeres com gráficos e números irrefutáveis, que notícias acabadas de chegar da EUROPA informavam que as economias todas, incluindo a portuguesa, estavam a melhorar, o jovem inquirido há-de ter sorrido de satisfação. E se, mais tarde na noite, acaso ouviu um dos tais analistas dissertar sobre as melhorias da situação económica graças às inevitáveis medidas impopulares, há-de ter exclamado: olha!, este indivíduo pensa como eu!, está a dizer o que eu disse hoje à televisão!
O moço não sabe, certamente, mas ele é um produto (um entre milhões, sublinhe-se) daquilo que Chomski refere como «fabrico do consentimento» - tema a que aqui voltaremos um dia destes.
O jornalista em estúdio, de sorriso maroto, preveniu antecipadamente que os portugueses estavam «pessimistas». Assim era: a maioria das respostas andou por um está pior, ou está muito pior, ou está a piorar. Apenas uma resposta dissonante: um jovem, sorridente e bem disposto (e, como de imediato se verificou, consumidor de artigos de opinião produzidos por analistas com poiso certo em jornais, rádios e têvês de referência) tri-opinou mais ou menos assim: a situação está a melhorar; irá melhorar ainda mais porque o Governo dispõe de uma maioria e tem possibilidades de aplicar medidas impopulares; e, é claro, as medidas impopulares são inevitáveis para resolver os problemas da nossa economia. E lá foi, muito provavelmente satisfeito com tanto saber o seu, julgando estar a dizer o que pensava, convencido de que o que pensava era pensado pela sua cabeça.
Sabe-se, por efeito de repetição exaustiva, que para salvar a economia, o desemprego é inevitável; e apertar o cinto, também; e da perda de direitos, nem se fala. Aliás, esta necessidade de os trabalhadores deixarem de ter direitos, é exemplo não apenas de uma corriqueira inevitabilidade mas também de uma lustrada modernidade. Como não se cansam de repetir os tais analistas com poiso certo nos média de referência, os direitos dos trabalhadores são trastes do passado, velharias de deitar fora, incompatíveis com a democracia moderna em que vivemos.
Voltando ao moço que respondeu o que a RTP1 queria ouvir: à noite, muito provavelmente, viu-se na televisão e gostou. E quando ouviu o locutor de serviço fechar a peça dizendo, e exemplificando os dizeres com gráficos e números irrefutáveis, que notícias acabadas de chegar da EUROPA informavam que as economias todas, incluindo a portuguesa, estavam a melhorar, o jovem inquirido há-de ter sorrido de satisfação. E se, mais tarde na noite, acaso ouviu um dos tais analistas dissertar sobre as melhorias da situação económica graças às inevitáveis medidas impopulares, há-de ter exclamado: olha!, este indivíduo pensa como eu!, está a dizer o que eu disse hoje à televisão!
O moço não sabe, certamente, mas ele é um produto (um entre milhões, sublinhe-se) daquilo que Chomski refere como «fabrico do consentimento» - tema a que aqui voltaremos um dia destes.