Para que a Terra não esqueça

José Casanova
Bush e Blair foram propostos para o Prémio Nobel da Paz. A notícia teve lugar de destaque nos média - sem comentários, como se fosse coisa natural esta de pretender premiar como arautos da Paz dois cruéis fazedores de guerra, responsáveis pela morte de milhares de pessoas inocentes.
Entretanto, prossegue a mascarada das armas de destruição maciça (ADM) no Iraque: à clara afirmação de David Kay («É inútil continuar a procurar uma coisa que não existe»), responde o boçal Rumsfeld, exibindo uma ausência de vergonha que constitui um insulto à inteligência humana: «Saddam Hussein e os seus acólitos podem tê-las destruído quando entrámos no Iraque. Também podem ter sido escondidas. Ou, ainda, transportadas para outro país».
Enquanto isso, do cardume de propagandistas ao serviço dos interesses do Império vem a público Pacheco Pereira «cumprir a obrigação de dar explicações» sobre as razões que o levaram a apoiar e aplaudir o bárbaro morticínio. Razões simples: Pacheco, ingénuo e bom rapaz, acreditou piamente, ai dele!, no paleio dos Bush’s, Blair’s, Barroso’s e CIA’s, sobre a existência das ADM no Iraque. Por isso, apoiou a ordem para matar dada pelos EUA – que possuem mais ADM do que todos os restantes países... Todavia, revelando uma ingenuidade que bem pode fazer com que ainda acabe fumando, Pacheco debate-se, agora, com uma angustiante dúvida: os governos de Bush e de Blair «actuaram de boa-fé, com base em informações erradas dos seus serviços, ou enganaram deliberadamente os seus cidadãos, actuando de má-fé»?. Dilacerante dúvida, esta! E estranha: como é possível que uma pessoa tão bem informada como o laureado comentador Pacheco não tenha ainda visto o que qualquer cidadão minimamente informado viu antes mesmo de as tropas do Império terem posto as patas criminosas em solo iraquiano?
Noutras circunstâncias, tudo isto seria motivo de riso. Mas estamos a falar de milhares de vidas ceifadas, de um crime hediondo a que a proposta do Prémio Nobel da Paz para os dois criminosos de guerra, as boçalidades de Rumsfeld e as ingenuidades de Pacheco, acrescentam um toque de escabroso sadismo. De um crime com responsáveis e co-responsáveis concretos: os que deram as ordens para matar e os que apoiaram e aplaudiram o morticínio. De um crime que continua no Iraque ocupado. De um crime que importa continuar a denunciar – para que a Terra não esqueça.


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