Das habilitações dos empresários portugueses

Francisco Silva
Mais uma vez: que fazer?

As intuições, se não as queremos ver transformadas em dogmas, devem ser, sempre e outra vez sempre, testadas, enriquecidas, emendadas pelos factos da vida, factos novos ou antigos, que ainda não eram de nós conhecidos, e também pelas novas explicações ou pelo ajuste das explicações que já íamos tendo. A aplicação da nossa razão e do método científico, em apoio das nossas intuições, deve constituir uma constante (pre-)ocupação. Passando com êxito novas etapas, confirmando-se, as intuições tornam-se cada vez mais em instrumentos fiáveis e claros da nossa razão e, portanto, acabam por se constituírem como base das decisões para acção, incluindo a sua execução.
Isto a propósito de uma minha intuição - já de há tempo que a tenho - acerca da «falta de qualificação dos empresários portugueses», enquanto «obstáculo importante ao desenvolvimento da em Portugal». Por exemplo, «os novos empresários portugueses têm menos de 8 anos de escolaridade».
Pois uma das minhas prendas desta época de Festas foi um estudo do economista Eugénio Rosa, de 28 de Dezembro passado, sobre esta candente questão. Um estudo que ele houve por bem fazer chegar à minha mão via lista de e-mail. Logo chegou também o estudo a todos quantos o quiserem ver, via artigo publicado no Avante! de 8 de Janeiro de 2004. Chegou a mim e a muitos outros, portanto. Que o terão lido com atenção. Actuados em combinação os meios de comunicação, os escritos em papel e os possibilitados pelas tecnologias digitais da informação e da comunicação podem levar ainda mais longe. Adiante, que me estou a afastar do tema!
Aliás, este estudo, de onde extraí as frases acima citadas entre aspas, insere-se numa série de estudos realizados por Eugénio Rosa que estão a ajudar conhecer melhor e melhor muitos aspectos do tecido económico português e, em particular, as suas gritantes insuficiências. Infelizmente confirmam os piores receios e felizmente fornecem-nos melhores dados - a todos - com vista à resolução da crise estrutural em que o País está mergulhado. Claro, a outra crise também está a aí à porta. Desculpam-se com ela os responsáveis - Nada podemos fazer, ‘inda p’ra mais com a Administração Pública que temos! E entretêm-se todos a apostar todos os dias quando será o dia, ou o mês, ou o semestre em que a crise acabará…
A insistir ainda, para o tomar de boa nota: os dados utilizados neste estudo de Eugénio Rosa, para quem tivesse dúvidas, procedem de instituições credíveis - do «Centro de Investigações Regionais e Urbanas do ISEG, elaborados a pedido do Departamento de Estudos, Estatística e Planeamento do Ministério do Trabalho».
Desse estudo, para este meu texto, interessa-me sobretudo sequenciar aqui, em toda a sua crueza, três factos:
· Não obstante todos os progressos registados nas últimas três décadas pelo povo português quanto às suas habilitações académicas, verifica-se, neste «país de doutores», apresentarem os novos patrões, os surgidos na última década do século XX, «uma média de 7,7 anos de escolaridade».
· Quanto ao perfil psicológico revelado por esses mesmos novos patrões, verifica-se que «embora a maioria deles possuísse baixa escolaridade e baixas qualificações profissionais antes de serem patrões», quando passaram a patrões autoclassificaram-se como quadros superiores - por exemplo, estes eram antes 21,8% do total e depois passaram a 83,9% do total!
· Em contrapartida, os patrões (e não só os novos), reflectiram nos quadros de pessoal das suas empresas, para o mesmo período, um aumento do índice de qualificação dos seus trabalhadores - e portanto das suas tarefas e salários - da ordem dos 13,7%, enquanto, de facto o índice compósito de qualificação dos mesmos trabalhadores aumentava cerca de 37%.
Homessa, não só os novos patrões têm um índice de qualificação muito baixa - «se calhar», mesmo assim, bastante mais elevada que os patrões no seu conjunto -, como parecendo que reconhecem a necessidade de possuir uma mais elevada qualificação, aparecem, a confirmarem o tal «país de doutores», quase todos como quadro superiores quando passam a patrões - ou, na melhor das hipóteses, conseguem lá chegar num ápice, a quadros superiores, quando têm que ser nomeados patrões, não sei, não entendo bem -, como ainda os patrões não reconhecem a habilitação dos seus trabalhadores - Engenheiro é para tirar fotocópias (pois, ainda estão nesta dos montes de fotocópias!).
Que palavrinhas e incentivos podem ajudar a resolver uma situação destas?




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