Política económica e social em interpelação do PCP

Governo responsável pela crise

A política económica e social foi ontem sujeita a exame em interpelação ao Governo por iniciativa do PCP. Tão importante como reflectir sobre a crise e suas causas, para os comunistas, esta era também a oportunidade de evidenciar que há outros rumos para o País.

Governo está cego pela aplicação do critério do défice

O próprio lema da interpelação - «Para o Combate à Estagnação e à Recessão Económica e às Crescentes Dificuldades e Desigualdades Sociais» - diz bem do propósito que anima a bancada comunista e do seu empenho no sentido de contribuir, com as suas propostas, para a resolução dos problemas com que o País se confronta em resultado das opções políticas orçamentais do Governo.
Daí a oportunidade e alcance desta interpelação destinada não apenas a fazer o balanço crítico da actual situação económica e social e do País como também a apontar medidas de curto e de efeitos a médio e longo prazo. Trata-se, neste último plano, como salientou na véspera do debate o deputado Lino de Carvalho, em declarações ao Avante!, de trazer para a ordem do dia um conjunto de propostas que permitam no imediato contrariar e dar combate a este processo recessivo, visando, simultaneamente, a mais longo prazo criar uma economia mais sustentada e menos permeável às crises cíclicas que a economia capitalista atravessa.

Opções erradas

Por isso a aposta da bancada comunista em escalpelizar todos os factores explicativos que estão na base da crise que o País atravessa, como não se via há pelo menos dez anos. Um quadro de dificuldades e problemas, bem conhecido da generalidade dos portugueses, que o Governo atribui em larga medida à desaceleração da economia internacional e às condições que herdou do PS em matéria de desequilíbrio das contas públicas.
Ora, não negando estas variáveis, o PCP entende que não é aí que radica a questão substancial do problema, mas sim nas opções tomadas pelo Governo nos últimos 12 meses. Aliás, quando se afirma que isto resulta da situação económica internacional, é preciso sublinhar que Portugal, neste momento, é o País da União Europeia (incluindo já os dez novos Estados) que tem o pior desempenho tanto em matéria de diminuição do Produto como em matéria de aumento do desemprego que, como é sabido, disparou e continua a aumentar.

Visão fundamentalista

Para esta realidade era propósito do Grupo Parlamentar do PCP chamar a atenção no decurso do debate, como foi avançado ao nosso jornal, lembrando, por exemplo, o facto de vários especialistas e até entidades, como o próprio INE, terem vindo a público considerar que um elemento fundamental para a recessão que estamos a viver resultar das opções do Governo.
«Em vez de procurar desenvolver uma política anti-cíclica que aproveite a margem de manobra orçamental para contrariar este decrescimento da economia e aumentar o emprego, através, designadamente, para já, do abandono do controlo do défice e do aumento do investimento público, o que o Governo tem feito é promover a aplicação fundamentalista do critério do défice», sustenta Lino de Carvalho, antes de recordar que tal critério significa reduzir a despesa pública (designadamente a despesa de investimento, que caiu cerca de 15 por cento só nos dois últimos meses do ano passado) e de, por essa via, estar a contribuir de modo drástico para a diminuição da procura interna (o investimento e o consumo) e, por consequência, para a redução da actividade económica e empresarial, com isso diminuindo o Produto e aumentando o desemprego.
São estes elementos que se previa estivessem presentes no debate de ontem, integrando a reflexão crítica da bancada comunista e dando corpo substantivo às suas propostas.

A recessão

São vários os indicadores que testemunham a crise que o País está a viver. Para eles tratou de chamar a atenção a bancada comunista, ontem, no Parlamento, lembrando, por exemplo, a circunstância de termos sido o primeiro país a entrar em recessão: no terceiro trimestre o nosso Produto caiu 2,7 por cento em relação ao segundo trimestre de 2002; no quarto trimestre caiu 0,8 por cento em relação ao terceiro trimestre de 2002; faltando conhecer a situação do primeiro trimestre de 2003, tudo aponta que vá no sentido da queda, o que significa, por conseguinte, que estamos em clara recessão económica do ponto de vista técnico.

O drama do desemprego

No plano do mercado de emprego, entre Abril de 2002 e Abril de 2003 o desemprego aumentou em quase cem mil unidades, ou seja, mais 26 por cento. De sublinhar é o facto de o desemprego ter aumentado particularmente no segmento dos trabalhadores com licenciaturas e com especializações técnicas. O que, aliás, é contraditório com o facto de se afirmar permanentemente que o País tem um défice de recursos humanos qualificados.
Ora os recursos humanos qualificados acabam por ser aqueles que mais estão a contribuir para o aumento do desemprego: os desempregados com curso superior já hoje atingem 7,4 por cento do total de desempregados oficiais (inscritos nos centros de emprego), cujo número, por sua vez, anda na ordem dos 450 mil, o que representa qualquer coisa como oito por cento da população activa.


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