Luta justa enfrenta chantagem
O STAL acusa o Governo de chantagear e imiscuir-se na autonomia do Poder Local para impor as 40 horas de trabalho semanal. A luta pelas 35 horas prossegue e é uma das reivindicações centrais da manifestação da Administração Pública do próximo dia 13.
A contratação colectiva é um direito constitucional, defendem STAL e autarquias
Para o Sindicato dos Trabalhadores da Administração Local (STAL), tentar proibir a contratação de pessoal nos municípios que acordaram a manutenção do horário de trabalho semanal nas 35 horas é uma forma de coacção «totalmente ilegítima». Uma «clamorosa chantagem» por parte do Executivo PSD/CDS, qualifica ainda o STAL, decorrente de uma proposta dada a conhecer recentemente pela Secretaria de Estado da Administração Pública, a qual, para além de contradizer o disposto no Orçamento do Estado para 2015 em matéria de possibilidade de contratação de pessoal pelos municípios em «áreas que se encontram desprovidas dos recursos humanos mínimos para a prestação de um bom serviço público à população», acrescenta uma série de factores com o único objectivo de impedir a entrada em vigor dos acordos colectivos de entidade empregadora pública (ACEEP).
Entre as questões a considerar antes da aplicação das 35 horas, segundo pretende de forma totalmente arbitrária a tutela, estão a eventual situação de ruptura financeira e a consequente obrigatoriedade de despedimento de funcionários, bem como a demonstração de que a contratação de trabalhadores não irá aumentar os encargos da autarquia com o pessoal, incluindo com o trabalho suplementar.
Acrescem a obrigatoriedade de provar que a redução do período laboral se traduzirá numa melhoria da produtividade, bem como na adopção da adaptabilidade e do banco de horas, pressupostos que o STAL e os trabalhadores sempre rejeitaram colocar nos ACEEP, ao contrário do que foi feito pelo sindicato vinculado à UGT.
Neste contexto, o STAL sublinha em comunicado que «não reconhece legitimidade ao Governo para definir “regras” para a negociação de acordos colectivos (...) sob pena de reversão das condições acordadas em sede de contratação e uma inqualificável violação legal do direito à livre contratação colectiva entre as partes com legitimidade para tal».
O Sindicato, aliás, realça que «a contratação colectiva é um direito constitucional que não pode ser manipulado por interesses político-partidários de nenhum governo, e reitera a exigência da publicação imediata de mais de meio milhar de acordos colectivos celebrados livremente com autarquias e ilegalmente bloqueados pelo Governo», e recorda que a Associação Nacional de Municípios Portugueses já se pronunciou contra mais esta «ingerência» governamental na autonomia do Poder Local Democrático, posição que o STAL subscreve.
Mais razões para agir
No texto divulgado sexta-feira, 13, o STAL manifesta ainda a «determinação em prosseguir a luta pelo direito ao horário das 35 horas semanais em todas as autarquias». Luta que teve um momento afirmativo na última semana de Janeiro com uma vigília permanente frente ao Ministério das Finanças, em Lisboa, e que terminou com uma concentração que reuniu mais de dois mil trabalhadores, dirigentes e activistas sindicais e autarcas do distrito de Setúbal no mesmo local exigindo a publicação dos ACEEP (na foto). Esta jornada antecedeu uma manifestação de trabalhadores da administração pública, também em Lisboa, convocada pela Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública.
STAL e Frente Comum agendaram para o próximo dia 13 de Março uma greve na administração central e local em defesa das 35 horas, de aumentos salariais, do emprego com direitos e em defesa dos serviços públicos. Num documento conjunto, as estruturas sindicais também condenam «a manutenção dos cortes nos subsídios e salários, do congelamento das carreiras e das escandalosas reduções do pagamento do trabalho extraordinário, dos dias de férias e o roubo dos feriados, e exigem a reposição do poder de compra; denunciam o aumento dos impostos e repudiam a retórica eleitoralista do Governo».
A jornada do próximo dia 13 de Março é igualmente em defesa da «autonomia do Poder Local Democrático, com garantia dos recursos humanos e financeiros correspondentes às necessidades das populações; pela manutenção na esfera pública dos serviços de água e resíduos; pelo combate às desigualdades sociais e por uma distribuição da riqueza que favoreça os trabalhadores e as camadas sociais mais desfavorecidas; pela derrota das políticas de direita nas próximas eleições legislativas, e por uma verdadeira mudança na governação do País, assente nos valores de Abril e nas conquistas alcançadas com a Revolução».
Protestos no Porto e Chamusca
A luta pelas 35 horas dura há quase 600 dias, mas os trabalhadores e as suas estruturas representativas não desistem de reivindicar a sua reposição. Caso da manifestação realizada no passado dia 11, frente à Câmara Municipal do Porto (CMP), na Avenida dos Aliados (na foto).
Funcionários da CMP e STAL assinalaram um ano da assinatura com a autarquia de um ACEEP que mantém o horário de trabalho nas sete horas diárias, mas «o Governo não respondeu aos vários ofícios da CMP para regularizar esta situação, demonstrando falta de respeito pela autonomia local, por isso, a autarquia vai pedir um parecer aos serviços jurídicos», revelou o coordenador regional do STAL, citado pela Lusa.
João Avelino denunciou, ainda, que Rui Moreira recusa aplicar as 35 horas enquanto durar o braço-de-ferro com o Governo, mas os presentes na iniciativa reafirmaram «a urgência do cumprimento do acordo assinado e do regresso ao horário das 35 horas semanais», e apelam à tomada de uma decisão política do executivo municipal com vista à consagração efectiva do período normal de trabalho das 35 horas semanais e sete horas diárias».
Já na Câmara Municipal da Chamusca, os trabalhadores deslocaram-se, dia 10, à sessão pública do executivo para exigirem a aplicação das 35 horas aos trabalhadores do universo municipal.
Autarcas contestam Governo
Quer a insistência do Governo em não publicar os ACEEP, quer as novas imposições para a aplicação das 35 horas de trabalho semanal são contestadas por muitos autarcas. A Câmara Municipal do Seixal (CMS) aprovou, sexta-feira, 13, uma tomada de posição «pelo direito à contratação colectiva e pela publicação dos Acordos Colectivos de Entidade Empregadora Pública (ACEEP). Considera a Autarquia que este Governo tem desenvolvido sérios ataques aos trabalhadores da Administração Pública, fomentando a sua desvalorização, a perda de direitos adquiridos e da sua qualidade de vida», lê-se no texto aprovado no município de maioria CDU, para quem o aumento do horário de trabalho para 40 horas semanais significa «um retrocesso civilizacional, que perturbou a organização da vida familiar e pessoal dos trabalhadores, dele não resultando qualquer benefício para a produtividade ou para a eficiência na prestação dos serviços, ao invés, colocando sérios constrangimentos na organização e funcionamento dos mesmos».
A CMS lembra, por outro lado, que os trabalhadores continuam a ver degradar-se os salários e outras componentes remuneratórias fruto dos cortes e confisco fiscal determinados pelo Governo, e acusa o Executivo PSD/CDS de «boicotar o processo [de entrada em vigor de ACEEP contemplando as 35 horas], (…) a pretexto de uma interpretação restritiva e desconforme à Constituição da República Portuguesa, em clara afronta aos princípios da autonomia do Poder Local, da liberdade negocial e da negociação colectiva, princípios basilares do Estado de Direito Democrático».
Posição semelhante assumiu a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), que após reunião do seu secretariado nacional fez saber que rejeita os critérios que a tutela pretende impor para «aceitar» a redução do período normal de trabalho e salientou que tal representa mais uma ingerência na gestão autárquica.
«O conjunto de exigências propostas mais não são do que um pretexto para que, na prática, não seja possível reduzir o período normal de trabalho das 40 horas para as 35 horas semanais», frisa a ANMP, que no mesmo documento insta os municípios a rejeitar «qualquer critério que condicione a contratação colectiva» lembrando que «a Lei de Orçamento do Estado para 2015 já balizou suficientemente a gestão dos recursos humanos do ponto de vista financeiro para que se garanta o não aumento da despesa», e frisa que «não existe qualquer relação directa entre o aumento do período normal de trabalho e o aumento dos índices de produtividade».
ANMP considera que «a proposta do Governo «apresenta uma visão puramente economicista e consequentemente redutora da organização e duração do tempo de trabalho, associando a possibilidade de diminuição do período normal de trabalho à verificação de critérios puramente financeiros», e recorda que os municípios «têm vindo a ser confrontados com exigências “cegas” de redução de efectivos, independentemente das suas reais necessidades de organização e prestação de serviço público».