20 anos desde o Tratado de Maastricht

A definhar e regredir

«Severos prejuízos para Portugal, para a nossa soberania, para a nossa economia, para os direitos do nosso povo», eis, em síntese, o balanço de vinte anos de vigência do Tratado de Maastricht e do caminho que este veio consagrar, designadamente a união económica e monetária e o euro.

Últimas duas décadas foram de destruição da nossa economia

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A avaliação é do PCP e foi exposta há uma semana na AR pelo seu líder parlamentar, Bernardino Soares, num debate suscitado pelo PSD sobre matérias europeias, coincidente com o chamado «Dia da Europa».

Oportunidade aproveitada para recuar às afirmações então proferidas pelo PCP, alertas e previsões a que a vida veio dar inteira razão. Foi das consequências desse percurso de definhamento e declínio que Bernardino Soares falou trazendo à colação exemplos vários, desde a destruição de parte significativa do nosso aparelho produtivo e da nossa economia ao drama do desemprego, desde a dependência e subalternidade crescente do País a uma dívida cada vez maior e insustentável. E não esqueceu que foram o PS e o PSD os partidos que sempre recusaram os referendos sobre este e outros tratados, impedindo o povo português de se pronunciar, os mesmos que juntamente com o CDS-PP são os responsáveis pela grave situação em que o País se encontra.

Aludindo a uma referência da presidente da AR Assunção Esteves sobre uma «publicação com os direitos dos portugueses enquanto cidadão europeus», Bernardino Soares anotou com ironia que nas suas páginas o que muito provavelmente estará inscrito é «o direito a ficar sem salário e sem serviços públicos, o direito a ver a reforma cortada, o direito a trabalhar para pagar uma dívida que não é justa».

Falar da vida

Respondendo ao PSD – que dissera não ser aquele o debate apropriado para tratar dos problemas concretos do dia-a-dia –, o líder parlamentar comunista disse bem compreender tal posição. «Querem que passe mais uns dias e que não se fale aqui neste plenário das gravíssimas medidas anunciadas pelo primeiro-ministro», denunciou, recusando que a AR possa ser um «sucedâneo daquela famosa peça de teatro de António Feio e José Pedro Gomes», essa «espécie de “conversa da treta”» que foi como caracterizou boa parte das intervenções até aí proferidas.

«A AR tem de debater os problemas que os portugueses estão a sentir», insistiu, exemplificando com os gravíssimos números do desemprego (cerca de um milhão e meio), uma taxa de desemprego real que supera hoje os 26 %, apesar da redução de quase cem mil pessoas na população activa.

E acusou o Governo de não obstante a gravidade da situação querer prosseguir com os despedimentos na administração pública e com uma política económica e de recessão geradora de desemprego.

A este propósito, adiantou ainda ser inútil o Governo, o PSD e o CDS alegarem que não são despedimentos na administração pública, que são rescisões amigáveis. Claro que são despedimentos, vincou, porque «quando se diz a um trabalhador que caso não aceite a rescisão ficará sem salário, ao fim de seis meses ou de ano e meio, o que se está a dizer é que ele vai ser despedido e não tem outra solução».

O tira-nódoas do CDS

A motivar a cerrada crítica do PCP esteve ainda o recente pacote de medidas apresentado pelo primeiro-ministro. Para Bernardino Soares o seu conteúdo é da «maior gravidade» e, nessa medida, coloca a exigência da «mais forte e veemente resposta».

E esclareceu não valer a pena o ministro Paulo Portas tentar demarcar-se das malfeitorias pelas quais é co-responsável, «aparecer a procurar por-se do lado dos reformados, dos pensionistas».

Esse é um exercício votado ao fracasso na medida em que, recordou, foi com o CDS no Governo que se cortou as reformas nos últimos dois anos, se fez a lei dos despejos pela mão da ministra Assunção Cristas, subiu o IVA da restauração, se cortou o subsídio de desemprego deixando os desempregados sem apoio, «se cortou o abono de família e lá se foi a política do visto familiar e o apoio às crianças e suas famílias», do mesmo modo que é «com o CDS que está a ser preparado o programa de despedimentos da administração pública».

«Paulo Portas e o CDS têm plena responsabilidade na situação que está criada e nenhuma manobra de propaganda pode fazer esquecer essa responsabilidade», salientou o presidente do Grupo Parlamentar do PCP, antes de deixar um forte apelo aos portugueses, a «todos os que têm interesse em salvar o nosso País e garantir uma vida melhor para todos»: «não desistam de lutar contra esta política, de derrubar este Governo e exigir a política diferente de que todos precisamos».

Alternativa credível

Num quadro em que se «trabalha cada vez mais horas e se recebe cada vez menos salário, em que se paga cada vez mais impostos e se tem acesso a cada vez menos serviços públicos», é igualmente inaceitável para o PCP que se diga não haver alternativa nem outras soluções para tirar o País do atoleiro em que está.

«Há alternativa», garantiu Bernardino Soares, e a primeira condição para a concretizar é rejeitar esse pacto de agressão que é o memorando da troika e renegociar a dívida, fazendo com que «o aumento da produção nacional seja a prioridade da política económica», o que implica «a recuperação para o Estado do controlo de sectores fundamentais da economia». Tal como é imprescindível, prosseguiu, a valorização dos salários e pensões e a reposição daquilo que foi retirado. «Não basta dizer não a mais austeridade; é preciso dizer que a austeridade até agora seguida tem de ser revertida e temos de ter de volta os salários, as pensões, as prestações sociais a que as pessoas deixaram de ter direito», sublinhou.

O líder parlamentar do PCP defendeu, por outro lado, a adopção de uma política fiscal e orçamental justas, penalizando «mais quem mais tem», pondo os grupos económicos e o sector financeiro a pagar «efectivamente aquilo que têm de pagar».

Sustentou, de igual modo, a urgência de aliviar fiscalmente a actividade económica das PME e dos trabalhadores, lembrando que são estes quem paga hoje o fundamental dos impostos, o IVA da restauração, o aumento brutal do IRS, o IMI que «continua a ser uma penalização fortíssima sobre a vida de muitas famílias».

Como fundamental enquanto eixo estruturante de uma política alternativa é também, na perspectiva do PCP, a defesa dos serviços públicos e das funções sociais do Estado, a afirmação da soberania e do primado dos interesses nacionais. E é neste contexto, realçou, que importa também que o País se prepare para a saída do euro, «seja por decisão externa (como às vezes vai sendo ameaçado) seja por decisão própria e soberana do povo para defender os seus interesses e o desenvolvimento do País».

«E não nos venham perguntar onde é que está o dinheiro para isto tudo», afirmou Bernardino Soares, pela razão simples, asseverou, de que ele existe, «está nos contratos swap, está nas rendas da energia, está nas taxas de rendibilidade das PPP, está no BPN e nos 1100 milhões de euros a pagar ainda este ano, está nos juros da dívida que continuam a ser uma penalização dramática da nossa economia e da nossa capacidade de investir».



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