Oposição não acata plano de Annan<br>e ocidente culpa... regime de Damasco
Sobem de tom as ameaças de intervenção na Síria a pretexto do não cumprimento do plano do enviado especial da ONU, Kofi Annan, mas o facto é que a oposição, incluindo o Conselho Nacional Sírio, não aceitou essas propostas.
Grupos da oposição intensificaram acções armadas e terroristas
O regime de Bashar al-Assad continua sob forte pressão das potências ocidentais, que advogam abertamente a «intervenção humanitária com apoio de uma força militar». O «argumento» agora esgrimido é o alegado não cumprimento, pelas autoridades de Damasco, do plano acordado com Kofi Annan e ratificado pela ONU, e que ontem devia ter entrado em vigor.
A proposta de Annan prevê a retirada das tropas sírias das cidades, a libertação de prisioneiros, um cessar-fogo, o acesso dos órgãos de ajuda humanitária às zonas afectadas pelo conflito e a criação de um mecanismo efectivo de monotorização internacional.
Para além disso, o plano prevê o diálogo entre todas as partes em confronto e a rejeição de interferência externa nos assuntos internos da Síria, o que contempla a exigência de que cabe ao povo sírio decidir sobre o governo do país e a recusa de qualquer alusão à renúncia ou saída do poder do presidente Bashar Al Assad
Logo no início da semana, as autoridades sírias advertiram que a aceitação do plano de Annan pressupõe o respeito pela sua soberania e a garantia de desarmamento dos grupos que desencadearam a violência armada e terrorista no país. Sucede que não só essa garantia não foi dada, como a maioria dos grupos armados, incluindo o Conselho Nacional Sírio (CNS), não assumiu a aceitação das propostas do antigo secretário-geral da ONU. Da mesma forma, tão pouco o Qatar, a Arábia Saudita e a Turquia se comprometeram a pôr fim ao financiamento e fornecimento de armas à oposição. Numa palavra, o que as potências ocidentais e seus aliados clamam é que o regime de Bashar Al Assad deixe livre o campo de manobra aos grupos armados... para prosseguirem a sua acção.
Assim se explica que a França, por exemplo, considere «inaceitável» a exigência de Damasco para que cessem os ataques da oposição. Não menos significativo é o facto de, ao anúncio da aceitação do plano de Annan por Damasco, os grupos da oposição terem intensificado as suas acções armadas e terroristas, bem como as tentativas de infiltração no território sírio a partir das fronteiras com a Turquia e Líbano.
Como afirmou o porta-voz do governo sírio, Makdessi, as autoridades estão dispostas a prosseguir a cooperação com Annan para a implementação do seu plano, mas exigem garantias da outra parte, pois não estão disponíveis para permitir que se repita o que aconteceu durante a missão dos observadores árabes, quando Damasco se comprometeu a retirar as suas tropas das zonas de conflito, o que foi aproveitado pelos grupos armados para se reorganizarem e armarem, ocupando bairros inteiros.
Moscovo pode enviar observadores
A Rússia está a estudar a possibilidade de enviar os seus próprios observadores à Síria. A informação foi divulgada pelo canal Russia Today, no mesmo dia em que o ministro dos Negócios Estrangeiros sírio, Valid al Muallem, se encontrava em Moscovo com o seu homólogo russo, Serguei Lavrov, para analisar o andamento do plano Annan.
Segundo o diplomata russo, citado anteontem pela Lusa, o governo sírio propõe-se respeitar os compromissos assumidos e deu início ao «cumprimento dos pontos do plano que dizem respeito ao recurso às forças armadas e armamento pesado nas cidades», para além de ter libertado cerca de 30 pessoas envolvidas em acções contra o Estado.
O ministro russo fez ainda notar que Moscovo não ignora «o facto público de que as propostas de Kofi Annan não foram aceites por uma série, se não a maioria, dos grupos da oposição, incluindo o Conselho Nacional Sírio», e sublinhou que, na cena internacional, ainda antes do início da realização do plano de Kofi Annan, os parceiros ocidentais do CNS fizeram declarações que «condenam esse plano ao fracasso».
«Apelamos a todos os opositores e a todos os estados que têm influência na oposição política, e principalmente militar, para que seja efectivado o mais rápido possível o cessar-fogo por todas as partes, tal como está previsto no plano Kofi Annan», declarou o diplomata, lembrando que «um cessar-fogo completo e seguro só é possível numa base bilateral, quando todas as partes cooperarem com Annan nesse objetivo», pelo que deve ser criado um «eficaz mecanismo de observação».
Lavrov instou ainda os «Estados Unidos e outros países a procurarem alavancas para obrigar a oposição síria e as forças do governo a porem fim aos combates e a não atirarem as culpas para a Rússia e para a China», que têm vetado no Conselho de Segurança das Nações Unidas uma resolução susceptível de abrir as portas à intervenção militar na Síria.