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Iuri Gagarine
O primeiro cosmonauta
40 anos depois

• Francisco Silva


Hoje, dia 12 de Abril do primeiro ano dos novos século e milénio, faz quarenta anos que o soviético Iuri Alekseyevich Gagarine viajou no espaço extra-terrestre. Quase duas horas foi quanto durou a viagem do primeiro cosmonauta a bordo da Vostok I. Iuri Gagarine era um jovem - tinha completado há menos de um mês 27 anos - quando se tornou num dos maiores heróis de todos os tempos. Para que conste e continue, e sempre, a constar.

Três anos e meio antes, a 4 de Outubro de 1957, tinha sido a vez do primeiro satélite artificial da Terra a ser colocado em órbita pela União Soviétiva, o Sputnik I e mais o seu bip-bip. Dois anos mais tarde foi a vez do satélite soviético Lunik 3 e, em 20 de Setembro do mesmo ano, do satélite americano Tiros.

Escreveu Iuri Gagarine num artigo seu publicado num livro(1) em 1967, dedicado ao cinquentenário da Revolução de Outubro, cerca de um ano antes do acidente com o avião que pilotava e que o vitimaria fatalmente ainda na força da vida - ele que, suprema ironia, tinha sido o primeiro de nós todos a transitar através do espaço interplanetário -, escreveu, dizíamos:

«Poderei eu alguma vez esquecer o Sol, fonte da vida do nosso planeta, exuberante, de um branco azulado, completamente diferente da sua imagem observável desde a Terra? Os que o viram tal como ele é são ainda pouco numerosos. De todas as maneiras, estou certo que muitos o verão, dezenas, centenas de Terrestres, homens de todas as profissões e cidadãos de todos os países. Procurando decifrar os mistérios do Universo, eles sonharão com o bem dos homens.»

E mais adiante:

«Constantin Tsiolkovski, sábio dotado de um poder de previsão extraordinário, disse que os homens acabariam por conquistar todo o espaço à volta do Sol. Apercebo-me que esta obra exigirá o esforço de numerosas gerações, desenvolvendo-se em consonância com o ritmo do progresso científico e técnico.

Se os homens progressistas unirem os seus esforços, estou convencido que a Humanidade construirá os primeiros degraus que conduzirão ao Espaço, talvez a Marte. Esta domesticação do Cosmos, realizada num clima de amizade, trará vantagens infinitas também segundo o plano puramente terrestre, por exemplo, em matéria de controlo do clima.»

Mais do que refrescante ou estimulante, é verdadeiramente exaltante poder comemorar o quadragésimo aniversário da missão espacial de Iuri Gagarine relendo as suas palavras, apropriando-nos do espírito e da vontade com que embarcou na aventura espacial. É um grande exemplo nos dias que correm, dias assolados por um espírito de globalização nas antípodas do «sonhar com o bem dos homens» e da convicção de que a Humanidade aprenderá a estar no Cosmos como na sua própria casa - a domus da domesticação - apoiada num «clima de amizade». Interessante também a indicação do papel que a empresa espacial deveria ter «em matéria de controlo do clima»… Iuri a pensar mais nos avanços do conhecimento científico a favor da melhoria da Vida na Terra do que na «mania» dos satélites espiões…

Uma outra explicitação importante a ser feita é a de que o impulso para esta empresa maior da Humanidade, uma empresa que poderá vir a constituir-se como uma necessidade absoluta para a nossa sobrevivência, partiu de um país, a União Soviética, completamente arredado dos imponentes meios científicos, tecnológicos e financeiros do Capitalismo e, em primeiro lugar, das capacidades imensas dos EUA.

O efeito foi o sobressalto dos EUA perante o enorme desafio que lhe colocou o avanço da União Soviética nesta área, que estaria a alterar a correlação de forças entre os dois campos. Data desta época o início do período de recuperação dos EUA na Ciência e Tecnologia, como importantes fontes deste país referem. E não só nas áreas mais directamente conotadas com a empresa espacial, mas também noutras como as tecnologias da informação. A própria emergência da Internet também acabou por ser um seu resultado lateral, devida a uma reactivação do complexo militar-industrial daquele país, creio, a partir de então, menos exclusivamente focada sobre o nuclear.

Mas o que ficará gravado nas nossas consciências para sempre foi a audácia da demonstração da possibilidade de vivermos no espaço, em condições completamente diferentes das da Terra.

E o protagonista, esse, foi Iuri Gargarine. Para que as memórias, por vezes tão curtas, o registem. E para que a façanha de Iuri nunca se apague dos nossos corações.


(1)
GAGARINE, Iuri (1967)
"Gravir les marches" in L'an 2017, pgs 16-18. Moscovo: Novosti.

«Avante!» Nº 1428 - 12.Abril.2001