Quando as crianças e as famílias não estão entre as prioridades

Ao rejeitarem, na sexta-feira, 27, a proposta do PCP para a criação de uma rede pública de creches, PSD, CDS e PS inviabilizaram uma resposta necessária aos problemas de milhares de famílias e ao grave défice demográfico que o País enfrenta.

Na prática, está hoje a ser negado a milhares de crianças o direito à creche


PSD, CDS e PS, com o voto contra; e Chega e IL, que se abstiveram – para todos eles, é evidente, o desenvolvimento integral das crianças e o bem estar das famílias não estão entre as prioridades. É o que se pode concluir da rejeição da proposta do PCP de criação de uma rede pública de creches, gratuita e de âmbito nacional.

Para os comunistas, a questão é simples: «As crianças, as famílias e o País precisam de uma rede pública de creches, que assegure que todas as crianças têm acesso a equipamentos de qualidade, que as famílias têm vaga garantida e que seja parte das estratégias para a Educação e para o combate ao défice demográfico», como se lê no projecto de lei submetido a debate. E mais: o PCP considera que «só a criação de uma rede pública será capaz de suprir a carência de vagas que hoje se verifica em Portugal e que constitui, na prática, a negação do direito à creche e da sua gratuitidade para milhares de crianças e respectivas famílias».

Num momento em que o País enfrenta um grave défice demográfico, a medida proposta pelo PCP assume também «particular relevância nas possibilidades reais de inverter a situação pelo que constitui de estímulo à natalidade. Não é difícil compreender o impacto positivo que tem na vida de família a segurança de saber que, tomando a decisão de ter um filho, tem assegurada a resposta de creche e que a mesma é gratuita».

Avanços insuficientes
Foi por proposta do PCP, lembra-se, que em 2020 a gratuitidade das creches começou a ser aplicada às crianças das famílias mais carenciadas, abrangendo cerca de 30 mil crianças. No ano seguinte, outra proposta do Partido foi aprovada, ainda que com limitações, passando essa gratuitidade, em 2023, a abranger 85 mil crianças. A gratuitidade das creches não constava do programa do PS, e só a insistência do PCP a impôs. Além disso, acrescenta-se no texto da proposta, «esta necessidade das crianças e das famílias encontrou sempre por parte do governo e do PS adiamentos, protelamentos e pretextos para limitar o número de crianças abrangidas». As tentativas do PS, no debate, para puxar a si os louros pelo que foi alcançado esbarra, pois, na realidade.

Muito embora tenha constituído um avanço, a gratuitidade alcançada foi insuficiente, «ora porque não abrange todas as crianças, independentemente das suas circunstâncias e contextos familiares e sociais, mas também porque não há vagas suficientes para todas». Era precisamente estas insuficiências que o PCP pretendia colmatar com a sua proposta: ao nível das vagas, propunha garantir, até 2030, as correspondentes ao número de crianças até três anos.

Diferentes visões em confronto
Apresentando a proposta, dois dias antes, o deputado Alfredo Maia salientou a necessidade de alterar a Lei de Bases do Sistema Educativo, e legislação conexa, de modo a integrar no sistema educativo «as crianças com idades dos zero aos três anos». Para o deputado comunista, «ninguém tem dúvidas quanto às vantagens, também pedagógicas, de um avanço neste sentido», como também «parece clara a necessidade de tal resposta e de tal avanço terem como suporte essencial uma rede pública de creches e o reforço da rede pública de jardins de infância».

É neles, conclui, que «deve começar a Escola Pública democrática, garante de qualidade e de equidade».

Antecipando argumentos, que efectivamente vieram a debate, Alfredo Maia afirmou que «bem podem o PS, o PSD e a direita em geral argumentar que a responsabilidade da garantia de creche está bem entregue ao sector solidário e ao sector privado», quando a verdade é outra: «durante séculos, o ensino esteve essencialmente entregue à Igreja e, em boa parte da centúria passada, muito assente em colégios privados, até à generalização do ensino público e da Escola Pública com o 25 de Abril. É, pois, caso para concluir que tal argumento radica numa visão anacrónica da educação e do ensino e que, pelo contrário, é justa e moderna a iniciativa do PCP.»

Universal e gratuita
A proposta, na qual o PCP continuará a insistir, assenta na garantia de universalidade e gratuitidade da rede pública de creches, abrangendo todas as crianças a partir do fim da licença de parentalidade e até ao ingresso no 1.º ciclo do Ensino Básico. Esta universalidade, sublinha-se, «implica, para o Estado, o dever de garantir a existência de uma rede pública de educação em creche e educação pré-escolar que permita a inscrição de todas as crianças por ela abrangidas e o de assegurar que essa frequência se efectue em regime de gratuitidade de todas as suas componentes».

O projecto do PCP incluía também questões relacionadas com a formação e contratação de educadores, a identificação da necessidade de requalificação ou construção de equipamentos e a planificação do desenvolvimento da rede pública em zonas de baixa densidade populacional.

 

As crianças no centro do debate

No seu projecto de lei, o PCP identificava os objectivos da educação em creche, que não visa apenas «dar uma resposta social, mas também uma resposta educativa de qualidade, capaz de garantir a todas as crianças, independentemente das suas circunstâncias e contextos familiares e sociais, a melhor educação desde a mais tenra idade».

Promover a integração educativa, pessoal e social da criança no sentido do seu desenvolvimento integral, reconhecendo o seu direito de acesso a serviços públicos que de forma articulada respondam às suas necessidades específicas, independentemente da sua condição económica e social», e reconhecê-la como «agente activo no processo de desenvolvimento e aprendizagem» são dois desses objectivos.

O PCP enumera ainda, entre outros, a inserção da criança em grupos sociais diversos, no respeito pela pluralidade das culturas, favorecendo uma progressiva consciência do seu papel como membro da sociedade, e o desenvolvimento da sua curiosidade, necessidade de exploração e experimentação.

 



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