Primeiro debate confirma governo ao serviço dos grupos económicos

A ne­ces­si­dade do au­mento geral dos sa­lá­rios, o drama da ha­bi­tação, a pre­ca­ri­e­dade e a in­jus­tiça fiscal foram temas que es­ti­veram em foco, dia 15, pela mão do PCP, no pri­meiro de­bate desta le­gis­la­tura com o pri­meiro-mi­nistro.

Pro­grama do Go­verno está ta­lhado para servir grupos eco­nó­micos

Con­fron­tado por Paul Rai­mundo com ques­tões muito con­cretas, o pri­meiro-mi­nistro fez da res­posta um exer­cício de con­si­de­ra­ções vagas. Nada adi­antou sobre o au­mento dos sa­lá­rios, en­jeitou a ideia de pôr a banca a pagar juros da ha­bi­tação, não deu qual­quer sinal de querer re­duzir be­ne­fí­cios fi­cais às grandes em­presas ou de pôr fim aos mais de mil mi­lhões de euros de di­nheiro pú­blico gasto em par­ce­rias pú­blico-pri­vadas.

O Se­cre­tário-Geral do PCP não deixou por isso de re­gistar o facto, re­al­çando com ironia a «ca­pa­ci­dade e cri­a­ti­vi­dade do pri­meiro-mi­nistro, que andou e andou às voltas mas não res­pondeu às per­guntas».

Exac­ta­mente por «es­tarmos de acordo que não é só ao Es­tado [que in­cumbe], é que lhe per­guntei qual o con­tri­buto da banca e dos fundos imo­bi­liá­rios para re­solver o drama da ha­bi­tação», anotou o líder co­mu­nista, que na sua in­ter­venção ini­cial cri­ti­cara de forma acesa a total au­sência de me­didas por parte do Go­verno para travar o au­mento das rendas ou para chamar a banca - «dessa banca de novos re­cordes de lu­cros no pri­meiro tri­mestre deste ano», frisou - a dar um passo para ali­viar as fa­mí­lias do gar­rote das pres­ta­ções men­sais.

«Não há uma me­dida que ponha um cên­timo que seja desses lu­cros a su­portar o au­mento das taxas de juros», la­mentou, su­bli­nhando não aceitar que se con­tinue a «be­ne­fi­ciar o in­fractor, en­quanto mi­lhares de fa­mí­lias e de pe­quenos em­pre­sá­rios estão com a corda no pes­coço para aguentar as suas casas e os seus ne­gó­cios».

Luís Mon­te­negro, na res­posta, li­mi­tara-se a con­si­derar a «banca e os fundos imo­bi­liá­rios» como «in­ter­ve­ni­entes numa es­tra­tégia que possa dar mais ca­pa­ci­dade de haver oferta no mer­cado». Ao Es­tado, o chefe do Go­verno re­servou apenas a com­pe­tência de «con­di­ci­onar» ao nível «da lo­ca­li­zação, da cons­trução e do preço», ac­tu­ando do «lado da oferta e da pro­cura».

Dis­tri­buir me­lhor a ri­queza

In­tro­du­zida no de­bate por Paulo Rai­mundo foi também a de­ci­siva questão do au­mento dos sa­lá­rios. Per­guntou con­cre­ta­mente ao pri­meiro-mi­nistro, «olhando para a re­a­li­dade da vida de mi­lhões de por­tu­gueses, os que põem a eco­nomia e o País a fun­ci­onar, os que tra­ba­lham e criam a ri­queza todos os dias», se es­tava o Go­verno dis­po­nível para pro­ceder a esse au­mento, em par­ti­cular para os mais jo­vens.

«Au­mentar sa­lá­rios não pela via fiscal, não pela via da baixa das con­tri­bui­ções», in­sistiu, ar­gu­men­tando que «au­mentar sa­lá­rios é au­mentar sa­lá­rios, desde logo na­quilo que está sob res­pon­sa­bi­li­dade do Go­verno, o SMN e sector ad­mi­nis­tração pú­blica, cri­ando con­di­ções para dar um sinal im­por­tan­tís­simo para que se dis­tribua me­lhor a ri­queza que está criada».

A fa­lácia da pro­du­ti­vi­dade

Paulo Rai­mundo des­montou, por fim, o que chamou de «nar­ra­tivas», alu­dindo quer à re­cor­rente len­ga­lenga do «não há di­nheiro» quer à que visa as­so­ciar au­mentos sa­la­riais à pro­du­ti­vi­dade.

«A ver­dade é esta: a pro­du­ti­vi­dade au­menta, o cres­ci­mento eco­nó­mico au­menta, au­mentam os lu­cros, au­mentam os sa­cri­fí­cios das pes­soas, au­mentam os preços de bens es­sen­ciais, a única coisa que não au­menta como deve ser são os sa­lá­rios e as re­formas. Ora aqui está um grande de­safio, este sim, para cum­prir com os por­tu­gueses», su­bli­nhou o Se­cre­tário-Geral do PCP, de­pois de já ter re­al­çado que «há muito di­nheiro a ser dis­tri­buído em di­vi­dendos nestas úl­timas se­manas», mi­lhões que estão a ir para os bolsos dos ac­ci­o­nistas da SONAE, da EDP, da banca e de ou­tros grupos eco­nó­micos».

Paulo Rai­mundo instou ainda o pri­meiro-mi­nistro a es­cla­recer a dis­po­ni­bi­li­dade do Go­verno para «ini­ciar um pro­cesso que ponha fim aos mais de mil mi­lhões de euros que saem dos bolsos de todos nós para as PPP ro­do­viá­rias». O de­safio não ob­teve res­posta.

 

Ae­ro­porto é para avançar

Re­a­fir­mada por Paulo Rai­mundo, no dia se­guinte ao anúncio do Go­verno, foi a po­sição do Par­tido quanto à cons­trução fa­seada do novo Ae­ro­porto no Campo de Tiro de Al­co­chete: «é mesmo para avançar», tal como é para avançar a «Ter­ceira Tra­vessia sobre o Tejo e a Alta Ve­lo­ci­dade Fer­ro­viária».

Por en­tender que esse com­pro­misso – que o PCP as­sume e par­tilha com a po­pu­lação da Área Me­tro­po­li­tana de Lisboa e do País – não tinha fi­cado to­tal­mente ex­presso pelo Go­verno, o líder co­mu­nista, di­rigiu a Luís Mon­te­negro uma men­sagem clara sobre o que ele pró­prio anun­ciara na vés­pera: «não pode vir a tra­duzir-se em mais um anúncio para o País e mais uns mi­lhares de mi­lhões de euros de lu­cros para a Vinci».

 

Tro­peçar na men­tira

Na res­posta às per­guntas co­lo­cadas por Paulo Rai­mundo o chefe do Go­verno não se li­mitou a «chutar para canto». Pelo meio, ainda pro­curou dis­torcer po­si­ções, di­zendo que o PCP en­cara as en­ti­dades do sector pri­vado e so­cial como es­tando «apenas e só em­pe­nhadas em re­tri­buir o ca­pital aos seus as­so­ci­ados ou ac­ci­o­nistas». Uma «visão com­ple­xada», chamou-lhe.

Ora, com tal afir­mação, Luís Mon­te­negro tro­peçou na men­tira. É que o PCP – e o pri­meiro-mi­nistro sabe-o -, sendo como é um de­fensor in­tran­si­gente de que é ao Es­tado que cabe um papel nodal na ga­rantia de di­reitos fun­da­men­tais, como o di­reito à saúde, à edu­cação, à ha­bi­tação ou à pro­tecção so­cial, não deixa si­mul­ta­ne­a­mente de re­co­nhecer o re­le­vante papel com­ple­mentar e sub­si­diário, em qual­quer destas áreas, as­su­mido por ins­ti­tui­ções pri­vadas, de­sig­na­da­mente co­o­pe­ra­tivas e IPSS, como de resto con­sagra a nossa Cons­ti­tuição da Re­pú­blica.

 



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